Péricles: do pagode ao TikTok

Cantor vai além do samba, abraça parcerias com nomes do sertanejo ao rap, e domina as redes sociais, viralizando com memes e dancinhas.


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Se você já se apaixonou pela pessoa errada, é provável que tenha ouvido a voz de Péricles. Ele era um dos cantores do Exaltalsamba, grupo de pagode que ajudou a fundar em 1986 e que marcou os anos 90 com o hit que leva esse refrão. A banda terminou em 2012, e ninguém sabe o quanto sofremos, é verdade. Mas fato é que o carismático Péricles Aparecido Fonseca de Faria, 52 anos, não deixou de fazer sucesso quando seguiu em carreira solo. E vai além do samba, em parcerias com artistas do funk ao sertanejo, passando pela MBP.

Em 35 anos de carreira e 28 projetos musicais, entre álbuns e EPs, ele vendeu mais de 15 milhões de discos. Atualmente, conta com 3 milhões de ouvintes mensais no Spotify e mais de 12 milhões de seguidores somados no Instagram, Twitter, Facebook e TikTok. Usuário ativo de todas essas redes sociais, o cantor afirma que não tem uma preferida. Para ele, o que importa é interagir com a galera, o que inclui os memes. Até cria sua própria versão de alguns, como o famoso ”mo paz”.

A música, diz Péricles, não tem barreiras. É por isso que ele vai do samba ao sertanejo, do pagode ao funk. No último ano, lançou a faixa “O melhor do mundo”, com a cantora LinikerDrik Barbosa. Também fez parte do YouTube Black Voices, projeto da plataforma que reúne influências negras do mundo todo.

Em agosto de 2020, lançou Tô achando que é amor, álbum que mistura músicas inéditas, regravações e parcerias com o rapper Projota, a dupla AnaVitória e o grupo de axé Ara Ketu. Um ano depois, lançou na última sexta-feira, (17.09), o EP Te dei meu mundo, que é parte do futuro disco Céu lilás. A seguir, Péricles conversa com a ELLE sobre samba, TikTok e até pagode coreano.

O que você tem buscado na música?
As parcerias vêm para fazer com que a gente quebre barreiras. Tem gente que não se permite essa interação, mas acredito que se não nos deixarmos passar por essas experiências, não saberemos até aonde podemos ir, até aonde poderemos ter aliados. Quero estar com todas os parceiros e deixo a porta aberta para isso. Gosto de trocar essas experiências. A música cresce com isso e todo mundo sai ganhando. Gravei há uns cinco anos um disco chamado Deserto da ilusão, que reuniu diversos artistas, como Marília Mendonça, MC Livinho, Djavan e Wesley Safadão.

Como você vê a influência da internet e das redes sociais nesse processo musical? Como você as utiliza?
É uma grande força. Quando (elas são) usadas devidamente, fazem diferença. Uma vez que não tenho barreiras para a música, não posso ter bloqueios nas redes sociais e plataformas digitais. Cada porta como essa que se abre, é uma chance que temos para nos aproximar de quem gosta da gente, do nosso som, de quem quer saber como é nosso dia a dia. Gosto de todas as redes sociais, porque em cada uma a relação é diferente. Minha primeira foi o Twitter, depois Facebook, aí cresci para as outras. O propósito maior é a interação, falar com todo mundo. Vou usando as ferramentas que posso para estar mais perto de todo esse povo, até as dancinhas do TikTok, que são muito boas.

Como você tem passado por esse momento pandêmico?
Ninguém esperava por tudo isso, mas temos que nos reinventar. Aproveitamos para fazer lives e pudemos ajudar muita gente. Lógico que não é a mesma lógica dos shows, não tem aquele calor do ao vivo, mas estamos procurando fazer as coisas da melhor maneira. Tive tempo de ser pai novamente de uma menina linda chamada Maria Helena.

Imagino como os shows ao vivo fazem falta…
Sinto uma falta tremenda. A energia do show é algo imbatível. Quero aproveitar e fazer um agradecimento a todo mundo da área da saúde, que está na linha de frente sem parar, vacinando todo mundo que precisa. Eu já tomei as duas doses da vacina. Preferia estar em casa de outra forma, mas não posso reclamar. Espero que depois desse período a gente passe a dar mais valor para essas coisas.

”O pagode é o jornal brasileiro.”

O que o pagode representa na sua vida hoje?
É tudo o que sou e o que sei. O pagode e todos os rótulos que usam para falar do samba me proporcionaram a oportunidade de sonhar, de dar uma condição melhor para minha família, de ser reconhecido. Muita coisa acontece e às vezes não paramos para analisar, mas é uma dádiva divina fazer parte disso. Sou grato por tudo aquilo que Deus me deu. Acho que se não fosse pelo samba, não conheceria as pessoas que conheci.

E o que representa para o povo brasileiro?
O pagode é uma expressão do povo brasileiro, das alegrias, das tristezas… Todas são refletidas por meio das letras e da melodia. Isso se imprime na maneira de falar. De fato, o pagode é o jornal brasileiro.

O gênero é algo muito brasileiro mesmo, né? Não tem nada igual no mundo…
O samba deles (outros países) é diferente do nosso. O jazz americano, a música caribenha, do restante da América Latina são as formas de samba deles, como eles expressam sua cultura, desejos, alegrias e tristezas também. O nosso samba conquistou o mundo. Até sigo um grupo coreano de pagode, é a coisa mais legal. A gente às vezes nem imagina, mas a música e a mensagem chegam lá.

Você marcou história no pagode anos 90. Quais mudanças aconteceram de lá para cá?
Eu já via isso há bastante tempo, mas de dez anos para cá, acho que o pagode e o artista de samba imprimiram uma marca mais profissional no seu trabalho. O sambista se apresenta melhor, seja na vestimenta, seja no som e com os instrumentos. As rodas de samba foram levadas para o palco e viraram um grande espetáculo. Isso é muito bom. Vejo muita gente nova fazendo bastante coisas boas. Hoje, por meio das redes sociais e das plataformas digitais, isso se torna mais constante. A cada dia, você vê um artista novo, acho isso ótimo.

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As mulheres vêm ocupando cada vez mais espaço. Como você vê a presença delas no pagode?
É um reflexo das boas mudanças que vêm acontecendo. Acho importantíssimo que todos que tenham condições possam abrir espaço para os novos talentos, principalmente os femininos, pois existe muita gente boa. Cantei recentemente com a Marina Iris, mas temos Gabby Moura, Marvvila, Karinah, Ana Clara… É muita gente boa que vejo crescer e o cenário (feminino) precisa fazer sucesso. É necessário.

Você acha que o pagode ainda sofre preconceito?
A cada momento que surge uma novidade e um novo ritmo, existem pessoas que torcem o nariz. Foi assim com o samba, com o funk, com o sertanejo, com o piseiro. Mas os números mostram o contrário. Essas músicas estão cada vez mais no coração de quem para pra ouvir. Se o povo disse sim, não tem quem possa dizer não.

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