Business As Usual?

A semana de moda de Paris e grandes marcas de luxo ensaiam uma retomada dos desfiles ainda neste ano.


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Na última quarta-feira (24.06), a Fédération de la Haute Couture et de la Mode anunciou que, apesar da pandemia do novo coronavírus, os desfiles da semana de moda de Paris devem acontecer normalmente em setembro deste ano. O evento está marcado entre os dias 28 de setembro e 6 de outubro e promete seguir todos os protocolos de segurança das autoridades de saúde locais.

O anúncio vem apenas dias depois dos comunicados de marcas como Dior, Burberry e Fendi a respeito de seus próximos desfiles. É um forte indicativo de que, mesmo com o risco de uma segunda onda de contágio e apesar dos recentes esforços por alternativas digitais para as fashion weeks, os desfiles seguem como a principal e mais eficaz plataforma de comunicação e lançamento para grandes grifes de luxo.


“Vamos seguir o ritmos das semanas de moda. É um negócio muito importante, com uma série de ramificações e conexões, sem contar na tradição”, disse o CEO da Dior Pietro Beccari, durante coletiva de imprensa virtual realizada na manhã de segunda-feira (22.06). Na ocasião, Beccari e a diretora de criação Maria Grazia Chiuri confirmaram que o desfile cruise 2021 acontecerá no dia 22 de julho, em Puglia, na Itália, sem convidados. Porém, para a apresentação de verão 2022, em setembro, já há a expectativa de uma pequena plateia de convidados.

Na semana passada, a Burberry anunciou que realizará em 27 de setembro um desfile a céu aberto em Londres, apenas com modelos e staff na locação. E a Fendi confirmou que pretende apresentar uma coleção na sua sede, em Roma, no dia 22 de setembro, com a presença de alguns convidados.

Quem e quantos serão estes convidados são respostas ainda incertas. Com as atuais restrições de viagem e proibição de entrada de passageiros americanos, asiáticos e brasileiros na União Europeia, é provável que apenas imprensa, celebridades e compradores locais possam assistir aos desfiles presencialmente.

A estrutura dos eventos também deve sofrer consideráveis mudanças. Os mega desfiles, por exemplo, são impensáveis. Tudo indica que as apresentações terão formato, tamanho e plateia extremamente reduzidos. Sem contar no line-up mais enxuto e dominado por grandes marcas, quase todas pertencentes a conglomerados de luxo.

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Desfile de inverno 2020, BurberryFoto Agência Fotosite

Além das questões de segurança e saúde, há o fator econômico. Com a baixa nas vendas devido aos meses de quarentena e lockdown, muita marca está financeiramente prejudicada. Somar aos custos básicos de produção de uma coleção os gastos de um desfile é inviável para muita label, ainda mais aquelas independentes e sem grandes investidores.

E O DIGITAL, HEIN?

Desde que a pandemia forçou boa parte da indústria e mercado de moda a interromper suas atividades, desfiles e semanas de moda foram canceladas, adiadas ou transformadas em eventos digitais. Há alguns dias, aconteceu a primeira edição de London Fashion Week inteiramente online, sem temporada específica e misturando coleções masculinas e femininas.

Contudo, foram poucas as marcas que optaram por um desfile virtual. A maioria preferiu explorar novas formas de comunicação e apresentação, de workshops online à conversas imersivos no processo criativo via Zoom.

O baixo número de desfiles virtuais, neste caso, tem duas explicações: a primeira diz respeito ao pouco tempo de produção em meio a uma série de restrições e escassez devido às interrupções causadas pelos lockdowns em boa parte da Europa. A segunda, como escreveu Erika Palomino em sua coluna aqui na ELLE, é que “ainda não inventaram nenhum modelo melhor do que um desfile para se apresentar uma coleção para mídia, compradores, público, sobretudo depois do advento do Instagram – e do stories”.

Se moda é linguagem, os desfiles são sua narrativa. São eles que reproduzem em imagens e roupas o tal zeitgeist e tudo mais que acontecem à nossa volta. “O desfile cria também oportunidades para networks, movimenta toda a cadeia e pode produzir conhecimento crítico sobre a moda e seus processos, essencial para o funcionamento da engrenagem, situando-a como manifestação cultural”, escreve Palomino.

Boa parte disso é 100% influenciada pela experiência física de ouvir e sentir uma trilha sonora, perceber detalhes de iluminação e cenografia, pelo caminhar das modelos e movimento de cada peça. A reprodução digital de todo esse conjunto nem sempre dá conta de comunicar a mensagem em sua completude.

Desfiles e semanas de moda também movimentam milhões. Além dos impactos direto no mercado e indústria de moda e seus trabalhadores, geram considerável fluxo de dinheiro em hotelaria, gastronomia e serviços de transporte. Não é à toa que executivos e CEOs estão ansiosos para que pelo menos parte disso volte a funcionar. Resta saber a que custo.

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