Cinco projetos de moda nas periferias do Brasil

Conheça alguns dos grupos que estão movimentando iniciativas de educação e capacitação profissional em diferentes comunidades do país.


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É difícil pensar em uma moda mais plural, sustentável e diversa sem considerar a educação como principal ferramenta de transformação para uma indústria que ainda sofre com a falta de acesso e representatividade. Se a entrada no mercado é difícil para quem tem o privilégio de pagar por uma faculdade, a realidade de jovens periféricos que não possuem o mesmo acesso é ainda mais complexa.

“A moda tradicional nunca reconheceu, de fato, os corpos periféricos nas suas produções, mas sempre os usou como um mercado de consumo, deixando que as demandas, criatividades e potências ficassem em segundo plano, ignorada, apagada, estereotipada ou até mesmo apropriada”, diz Danielle dos Santos Vieira, uma das fundadoras do Coletivo Chita, que atua no Grajaú, em São Paulo, realizando diferentes oficinas e cursos de moda para gerar novas oportunidades de trabalho na comunidade.

Como Danielle, outros profissionais de diferentes regiões do país estão descobrindo novos talentos e transformando realidades por meio de projetos educacionais e de capacitação profissional com foco em moda e beleza. Conheça cinco deles:

Periferia Inventando Moda – São Paulo

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Fundado pelo estilista paulistano Alex Santos, em 2014, o projeto capacita profissionalmente jovens periféricos (LGBTQIA+, negras, indígenas e pessoas com deficiência) para atuarem ativamente nos mercados de moda e criação, propondo uma postura mais autônoma na construção da identidade e cultura nas periferias. Ao todo, foram realizadas nove edições, com eventos na comunidade e na região central da capital paulista. “Queremos divulgar a moda da periferia como manifestação genuína da cultura nacional, além de proporcionar aos alunos oportunidades de exercitar seus conhecimentos e promover seu trabalho”, explica Alex.

Baseado em Paraisópolis, o projeto oferece atividades como workshops para aspirantes a modelos, cursos de maquiagem com capacitação e qualificação para jovens e adultos da comunidade e outras regiões da periferia, assim como oficinas de fotografia para amadores e profissionais iniciantes. Toda a programação é coordenada por Alex, que possui formação em Design de Moda pela Universidade Anhanguera e já teve seus trabalhos expostos em eventos como Osasco Fashion Week, Congresso Internacional de Negócios da Moda e, atualmente, faz parte do line-up da Casa de Criadores.

Em 2022, o PIM promove uma agenda de cursos e oficinas voltados para a empregabilidade, empreendedorismo e geração de renda na área da economia criativa com foco em moda. Também será lançado o Modo OM, um programa voltado para estratégias e ferramentas de comunicação através de oficinas de influência digital, etiqueta e ética profissional. “E estamos fazendo um crowdfunding para realizar a décima edição do nosso evento PIM, que servirá de vitrine para marcas periféricas e divulgará o resultado das aulas que nossos alunos receberam no projeto”, conta Alex.

Projeto Fio – Rio de Janeiro

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Projeto FIo.Foto: Divulgação

Iniciado em 2017 pelas sócias Olivia Silveira, Ana Luiza Nigri, Marina Bittencourt e Letícia Ozorio, o projeto visa a capacitação em comunidades do Rio de Janeiro, com foco em mulheres em estado de vulnerabilidade social e econômica. O quarteto começou a ensinar bordado na Associação de Moradores do Horto (na comunidade de mesmo nome, junto ao Jardim Botânico, na Zona Sul carioca), onde frequentadoras já tinham aulas de costura, modelagem e tricô, ajudando a criar pequenas coleções de roupas e acessórios com lucros revertidos para as mulheres apoiadas.

Desde então, já foram realizados diferentes projetos em parceria com outras comunidades, como a Tijuquinha, no Itanhangá, na Zona Oeste do Rio, e o Complexo da Maré, na Zona Norte. O número de colaboradoras gira em torno de 25 mulheres, com idades entre 35 e 60 anos – no site do projeto, é possível conhecê-las. Os valores pagos são definidos em conjunto e variam de acordo com a complexidade e o tempo do bordado. As colaboradoras são pagas antecipadamente e recebem um kit com linha, agulha, tecido, botão e o que mais for necessário para produzir as peças de casa.

Com um ateliê em Botafogo, o Projeto Fio passou por dificuldades durante a pandemia, mas conseguiu se manter graças a um financiamento coletivo e ações de vendas, estabelecendo também uma logística de trabalho remoto com o time de bordadeiras. As oficinas também têm acontecido online e as inscrições podem ser feitas através do site. www.projetofio.com

Coletivo Chita – São Paulo

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Formado por José Ricardo Paiva Santos, Jessica Santos Paixão e Danielle dos Santos Vieira, o coletivo foi fundado em 2019 a partir do projeto Periferia Criando Moda, que ofereceu um ciclo de oficinas teóricas e práticas sobre moda para jovens entre 15 e 25 anos. “Um dia nos encontramos para planejar o programa e formamos o Chita, com o intuito de realizar outros projetos de educação, mas sempre com a linguagem da moda e na periferia, ou, mais especificamente, no Grajaú”, explica Danielle.

Desde a criação, já foram realizadas oficinas com um público variado, misturando aulas técnicas – como corte, costura e modelagem – com a parte teórica, em aulas de história da moda, teoria das cores, fotografia e educação ambiental. O grupo também promove debates sobre identidade, periferia, cultura e diversidade. “A ideia é dialogar com as pessoas do nosso entorno, aquelas que todos os dias acordam mais cedo para colocar a cidade de pé”, diz Danielle. “Além disso, conseguimos construir oportunidades de trabalho e renda, além de ajudá-las a enxergar novas possibilidades de vida”, completa.

Há ainda o projeto Modos Periféricos, que discute a diversidade de culturas periféricas urbanas em São Paulo e como elas se relacionam com a moda. “Buscamos conversar com os mais diversos grupos que compõem nosso cotidiano, como o funk, o skate, as trancistas, as marcas locais, outros coletivos de moda e costureiras, e fizemos algumas oficinas em torno dessa pluralidade criativa”, conta Danielle. O projeto virou tema de um documentário de três episódios, lançado em maio na Casa Emancipa, no Grajaú. Agora o grupo se prepara para retomar as oficinas e cursos, que devem ser anunciados no perfil do Instagram ao longo dos próximos meses.

Oyá Criativa – Salvador

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Oyá Criativa.Foto: Lucas Assis

Braço de moda e design do Instituto Oyá, a Oyá Criativa começou a funcionar em 2015 e é coordenado por Ialorixá Nivia Luz, neta de Anísia da Rocha Pitta, a Mãe Santinha, fundadora do projeto sediado no terreiro Ilê Axé Oyá, em Pirajá, Salvador. “Nosso objetivo é transformar vidas a partir da educação plural e antirracista”, afirma Nivia. “Quando falamos de moda em comunidades periféricas como Pirajá, estamos falando de oportunidade e criatividade, mas sobretudo de melhoria de vida através da inclusão, qualificação e geração de empregos”, completa.

Além dos cursos de corte e costura, modelagem e maquiagem – todos com um olhar para gestão –, há oficinas com profissionais renomados, como o stylist Felipe Veloso. “Realizamos um editorial pensando a moda a partir de um olhar artístico e educativo, mas também empreendedor”, explica Nivia. O Oyá Criativa ainda realiza um desfile de moda anual, uma espécie de formatura para os alunos. “A ideia é dar visibilidade e contribuir para que essas pessoas ingressem no mercado ou fundem suas próprias marcas”. A terceira edição, apresentada em fevereiro, teve curadoria do diretor criativo Giovanni Bianco.

Os cursos e oficinas são gratuitos, qualquer pessoa a partir dos 17 anos pode participar e as aulas acontecem na sede do instituto, com duração de seis meses a um ano, dependendo da temática. As vagas são anunciadas nas redes sociais e não há um pré-requisito para participar. “Apenas o desejo de realização, porque esse talento com certeza será lapidado dentro do Oyá”, finaliza Nivia.

House of Híbrida – Belém do Pará

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Gigi Híbrida.Foto: Hugo Coreia

Estabelecida pelo figurinista e carnavalesco Jean Negrão, também conhecido como Gigi Híbrida, a casa acolhe jovens interessados pela cultura drag em Belém do Pará. “Sou filho e neto de costureiras, então a moda sempre esteve presente na minha vida”, diz Negrão, uma das principais vozes do coletivo Thêmonias, formado por diferentes artistas drag da região. “Tento repassar de uma maneira didática e dinâmica tudo o que eu aprendi nesses anos. Sou arte-educador, então trabalho essa vivência em todos eles”.

Além de desenvolver figurinos para escolas de samba locais, Jean também promove desfiles para apresentar suas próprias criações. “São apresentações conceituais, mas com algumas mensagens”, explica. “Já lancei coleções inspiradas nos casarões antigos da cidade que corriam risco de desabamento e eram repletos de ladrilho hidráulico e também a Comigo Ninguém Pode, que foi um mergulho no mundo místico das benzedeiras.”

Os projetos são realizados em um pequeno ateliê que mantém em casa, onde produz e ensina o ofício de produção roupas, como também a arte da maquiagem drag. Sua próxima empreitada é o desenvolvimento de uma coleção sensorial para crianças com deficiência visual e auditiva. “Quero que elas entrem em contato com essas peças, sentindo suas texturas, aromas e entendendo formas”, conta a artista, que está em busca de ONGs locais para colaborar no projeto. “Busco uma instituição que preste serviços a crianças carentes e em vulnerabilidade social, que convivem com o vírus do HIV”, antecipa.

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