Por que marcas dão nomes para roupas?

Entenda a estratégia por trás do uso de nomes para roupas.


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Arte: Gustavo Balducci



Você já deve ter reparado em nomes para roupas, acessórios e perfumes. Tem vestido Carmem, bolsa Cecília, cinto Jackie. Alguns são consagrados até, como bolsa Kelly e calça capri. Não se sabe ao certo quem inaugurou a pia batismal da moda, mas apelidar peças é uma influência das artes. “Assim como os artistas assinam quadros, estilistas legitimam os seus produtos com homenagens a pessoas e lugares”, diz João Braga, professor de História da Moda da FAAP.

Segundo João, o vestido Delphos, da casa veneziana Fortuny, é um dos primeiros itens conhecidos a ganhar uma alcunha. Foi no início dos anos 1900, quando Mariano Fortuny y Madrazo, fundador da grife, patenteou o longo de seda plissado com base na escultura “Cocheiro de Delphos”, da Grécia Antiga.

Com o passar do tempo, outros exemplos ganharam notoriedade. Em 1911, o estilista Paul Poiret batizou o perfume La Rose de Rosine em homenagem à sua filha. A bolsa Kelly, da Hermès, criada em 1930, recebeu tal apelido só décadas depois, “quando a atriz Grace Kelly surgiu com ela em mãos, tapando a barriga para esconder a gravidez”, lembra João.

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A plataforma Lívia, da Vicenza. Foto: Divulgação

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E, hoje, por que minha blusa se chama Marília?

Dar nomes para roupas é também uma estratégia para criar narrativas e fortalecer uma identidade de marca. “As redes sociais estimulam experiências percebidas como individuais. Itens com nomes criam a sensação de co-autoria, são um simulacro de colaboração”, explica a coordenadora do curso de Negócios de Moda da Belas Artes, Jô Souza. “Imagine comprar um produto com o seu nome? Guarda-se o pedaço de uma experiência que parece única.” 

Rafaela Furlanetto, co-fundadora e diretora criativa da Vicenza, etiqueta de calçados e acessórios, diz que costuma receber mensagens de clientes felizes por comprarem um par de sapatos xará. “Conexões emocionais são essenciais e nomear itens é uma maneira de torná-los mais próximos das pessoas.”

Nome para roupas: Normando

O top e a saia Látex Amazônico, da Normando. Foto: Divulgação

Como branding, o cliente também passa a ter um vocabulário em comum com a etiqueta. “Nós trabalhamos internamente com SKU (a sigla para Stock Keeping Unit, ou Unidade de Manutenção de Estoque, é um código varejista de descrição), mas o consumidor precisa de nomes mais acessíveis”, diz Emídio Contente, que comanda a Normando, ao lado de Marco Normando. 

Para batizar as peças, a empresa do casal paraense segue diferentes direções. Há títulos poéticos, como bermuda, camisa e calça Pesquisadora. “Elas são de uma coleção em que a gente se inspirou na arqueologia amazônica”, diz Marco. Há também referências à matéria-prima, como o top Látex Amazônico, chamado assim pela dupla para reforçar a proveniência do tecido de Rondônia. 

Como nasce o nome de uma peça?

A designer Nathalie Edenburg normalmente se inspira em formas femininas em suas joias e, por isso, as batiza pensando em mulheres que admira. Quando estava grávida, criou o anel Sophie, em formato de seio, com o mesmo nome da filha. A choker Diana, de pérolas e prata, homenageia Lady Di, e o colar Gabriela, de camurça e pérola, é um presente simbólico a uma amiga.

Nome para roupas: nathalie edemburg

O anel Sophie, de Nathalie Edenburg. Foto: Divulgação

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Para assinar a certidão de nascimento dos looks, algumas etiquetas reúnem times de criação, analisam moodboards, pesquisas com consumidores e recorrem até à inteligência artificial. A primeira coleção de Costanza Pascolato como diretora criativa da Anima Eyewear, realizada antes da pandemia, tinha vinte peças no total. Com a série pronta, ela pensou que seu trabalho criativo estava finalizado, mas, um dia, um e-mail chegou.

“Nele dizia que eu precisava criar alcunhas para os óculos”, conta. Costanza se sentou e olhou para as características dos objetos. “De repente, pensei: ‘Eles vão falar por si!’.” Daí vieram nomes como “Sou leve”, para uma armação fininha,  e “Sou glamurosa”, para um modelo gatinho de sol, para citar alguns. “As pessoas acham divertido e sigo respeitando a filosofia que inventei.” Ainda hoje, chega aos nomes quando tem os acessórios prontos em mãos – e no rosto.

Nome para roupas: mixed

O casaco Courchevel, da Mixed. Foto: Divulgação

Para outras grifes, o título surge já no processo criativo e não é consequência, mas parte do design. É o caso de Riccy Souza Aranha, fundadora da Mixed. “Tudo tem que ter significado. Cada coleção conta uma história”, explica. O tom de rosa da marca que é chamado de Maricy homenageia sua mãe e está em looks doces e suaves. “Já outros itens são inspirados em locais”, diz. Por isso, o casaco de poliéster Courchevel. 

O sonho das etiquetas é que um item seja reconhecido facilmente, às vezes, pelo nome. “A nomeação é um endosso, uma forma de categorizar as linhas e os produtos”, explica Marcos Bedendo, professor de branding e marketing da ESPM. Mas, para além do nome, o cliente se relaciona com a marca. “No fim das contas, o que dá lastro ao modelo X ou Y é a label que a criou. O que sustenta o seu valor é aquilo que está por trás”, finaliza. 

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