4 desfiles, 3 tendências e uma pergunta sobre as coleções masculinas de verão 2024 de Paris

Selecionamos as principais apresentações, debates e trends que influenciarão o guarda-roupa masculino na próxima estação.


Loewe, verão 2024. Um dos principais desfiles, com uma das tendências mais relevantes, da semana de moda masculina de Paris.
Loewe, verão 2024. Foto: Getty Images



Os desfiles de verão 2024 masculino de Paris começaram grandiosos. Provavelmente, como nunca antes. Era de se esperar: o grupo LVMH não faria uma apresentação convencional e low-profile para a estreia do rapper e artista Pharrell Williams na direção criativa da Louis Vuitton.

Teve quem amou, teve quem esperava mais. Pelo menos alguma provocaçãozinha para quebrar a inércia. Em 2018, quando Virgil chegou ao cargo hoje ocupado pelo amigo músico, deu um chacoalhão em todo o mercado.

Ainda assim, o début de Pharrell deu novo fôlego ao debate recuperado por Demna em outubro passado, no retorno da Balenciaga à semana de moda de Paris. Era o primeiro desfile depois dos escândalos das campanhas, lembra? No release, o diretor criativo escreveu: “A moda, para mim, não pode mais ser vista como entretenimento, e sim como a arte de fazer roupas”.

 

Mas e aí, moda é ou não é entretenimento?

Desculpa aí, Demna, mas moda e entretenimento são indissociáveis. Nem toda moda e nem toda roupa são puramente funcionais. Principalmente as de luxo. O consumo delas gera satisfação, prazer, identificação, pertencimento, orgulho, bem-estar e um tanto de outras sensações – nenhuma delas essencial à vida humana no século 21. E tudo certo. Seria uma chatice se não fosse.

Grande ou pequeno, para milhares ou para poucos, um desfile também é sempre uma forma de entretenimento. Se ele entretém ou entendia, é outra conversa. O que não se discute é que tamanho, formato e locação são fatores importantes para conseguir o resultado certo de uma equação complexa.

Louis Vuitton, verão 2024.

Louis Vuitton, verão 2024. Foto: Getty Images

A Louis Vuitton é a casa mais forte do grupo LVMH e a grife de luxo que mais vende no mundo. Interditar uma das principais pontes – e mais antiga – de Paris, importar um coral inteiro dos EUA, sentar as maiores celebridades do momento na primeira fila e encerrar o evento com um show de Jay-Z não foi uma homenagem ao recém-chegado diretor de criação, Pharrell Williams. Foi, sim, uma demonstração de força, imagem, marca, influência e poderio financeiro.

Sempre foi assim. Demarcação de terreno mesmo, sabe? E plataforma de comunicação, ferramenta de posicionamento. Acontece que a competição ficou tão acirrada que qualquer atitude exige medidas e proporções homéricas, para mais ou para menos. E, em tese, nada de errado. Desde que o entorno não ofusque nem tome o lugar do centro. No caso, das roupas, da moda.

 

Dior Men

Um exemplo de espetáculo com bom conteúdo é o verão 2024 da Dior Men. Para o desfile que marcou o 5º aniversário do diretor criativo Kim Jones na marca, foi construído uma grande caixa de alumínio na École Militaire, em Paris. No interior, os modelos surgiram do chão, por aberturas na passarela quadriculada. A cena foi impressionante. Diz que Bernard Arnault em si, fundador e CEO da LVMH, sacou o telefone para registar o momento.

Dior Men, verão 2024.

Dior Men, verão 2024. Foto: Getty Images

Só que as roupas também eram excepcionais. As melhores que Kim já mostrou na maison. O estilista britânico é um dos principais responsáveis pelo recente cruzamento de elementos de alta-costura com a moda masculina. Tem um tempo que ele está empenhado nisso. 

Começou discreto, deu uma desequilibrada e agora floresceu intenso. Os ternos leves e fluidos, pelo qual o designer é conhecido, ganham bordados de cabochão e são combinados com tricôs em tons neon. O bouclé de tweed ganha mais espaço, em versão completamente fresca, muitas vezes junto a reedições do padrão cannage (o mesmo do matelassê das bolsas Lady Dior).

 

Tweed neles!

Dior Men, verão 2024.

Dior Men, verão 2024. Foto: Getty Images

Dior Men, verão 2024.

Dior Men, verão 2024. Foto: Getty Images

Falando em tweed, o tecido ganhou um destaque improvável nos desfiles de verão 2024. O material queridinho de Coco Chanel apareceu primeiro na Louis Vuitton, em jaquetas de proporções reduzidas usadas com jeans secos ou bermudas combinandinho. Foi na Dior Men, contudo, que seu apelo ganhou corpo – em modelagens menos rígidas e mais afastadas do corpo –, fazendo todo mundo prestar atenção no restante da fashion week.

Louis Vuitton, verão 204.

Louis Vuitton, verão 2024. Foto: Getty Images

Louis Vuitton, verão 2024.

Louis Vuitton, verão 2024. Foto: Getty Images

Twinset, quem lembra?

Dior Men, verão 2024.

Dior, Men verão 2024. Foto: Getty Images

Twinset é a palavra em inglês usada para categorizar a combinação de cardigan e blusa da mesma cor e tecido. Quem acompanha o vaivém das modas deve ter percebido que os conjuntinhos marcaram presença nas três últimas estações (pelo menos). Mas era sempre aquela coisa: parte de cima com a debaixo. Isso continua no verão 2024, porém menos interessante do que o match só acima da cintura.

Dries Van Noten, verão 2024.

Dries Van Noten, verão 2024. Foto: Getty Images

Exemplos? Em duas coleções extremamente elegantes: a de Dries Van Noten e a da Hermès. Ambas foram além da definição tradicional do twinset e experimentaram com uma boa variedade de peças. Parkas esvoaçantes com camisetas transparentes, blazers com regadas superfinas e até camisa de tecido em tela sobre camiseta.

Hermès, verão 2024.

Hermès, verão 2024. Foto: Getty Images

Outro ponto comum às etiquetas é a leveza dos tecidos. Em entrevistas após os respectivos desfiles, os diretores criativos Dries Van Noten e Véronique Nichanian (Hermès) mencionaram as mudanças climáticas e a necessidade de roupas cada vez mais frescas.

 

Rick Owens

Quem usa o TikTok já sabe. No Instagram, se o algoritmo estiver a seu favor, também dá para notar. E aquelas que acompanham as semanas de moda de maneira 360º com certeza perceberam o crescimento da popularidade de Rick Owens. Desde a pandemia, quando seus desfiles foram gravados nas proximidades de casa que mantém em Veneza, o interesse pelo trabalho do estilista estadunidense só aumenta. E a excelência de suas coleções idem.

Rick Owens, verão 2024.

Rick Owens, verão 2024. Foto: Getty Images

O verão 2024 não foge à regra. É, ao mesmo tempo, um retorno às origens e continuação do processo evolutivo das estações anteriores. A silhueta é delicada e constritiva, retrô e futurista, pessoal e referencial. As calças têm cintura altíssima e pernas alongadas ao extremo, numa versão gótica raver de alguns looks de David Bowie. As partes de cima variam de jaquetas e camisas com ombros pontudos, como se fossem asas, ou blusas mais leves, envoltas no corpo com drapeados e pedaços de pele à mostra. Pense no estilo dos anos 1930, mas com uma cara sofisticadamente pós-apocalíptica.

Rick Owens, verão 2024.

Rick Owens, verão 2024. Foto: Getty Images

Pois é, babado. E nem falamos das sandálias brutalistas que mais parecem versões de concreto de botas ortopédicas. Tudo desfilado durante uma queima de fogos que cobriu a passarela e os convidados com fumaça branca e colorida. Com construção impecável, a coleção é uma das mais direcionais de toda a temporada. E também uma das mais autorais.

 

Cintura nas alturas

Loewe, verão 2024.

Loewe, verão 2024. Foto: Getty Images

Em Milão, o cós de quase toda bermuda e calça subiu consideráveis centímetros. Em Paris, a escalada continuou – junto com a representação limitada e excludente de corpos. O que se torna ainda mais grave dado que a cintura alta e bem marcada é uma das principais tendências do verão 2024 masculino. Em maior ou menor grau (de altura e aperto na cintura), a silhueta pautou a maioria das coleções. As mais emblemáticas foram a de Rick Owens e Loewe.

Loewe

Com três fontes da escultura estadunidense Lynda Benglis na passarela, o verão 2024 da Loewe fala sobre distorções da realidade. É um assunto recorrente no trabalho do diretor criativo Jonathan Anderson. Em temporadas anteriores recentes, o tema foi explorado a partir de peças familiares ou facilmente reconhecíveis. O desfile da marca própria do estilista, a JW Anderson, em Milão, foi todo pautado na reprodução de elementos domésticos de sua memória afetiva.

Loewe, verão 2024.

Loewe, verão 2024. Foto: Getty Images

Para a grife espanhola, também do grupo LVMH, o pensamento é similar. As bases da coleção são itens comuns a muitos guarda-roupas: a calça jeans, a camisa, a camiseta, o suéter, o blazer. Porém os tecidos são brilhantes, mas discretamente, como se fossem o reflexo fosse dos respingos da água expelida pelas esculturas. As proporções são distorcidas, como se vistas de uma lente angular, tipo olho de peixe. 

Loewe, verão 2024.

Loewe, verão 2024. Foto: Getty Images

Com o cós poucos centímetros abaixo do torso, as barras costuradas nas solas dos sapatos, as camisas e suéteres ajustados ao corpo e presos por dentro das calças, a imagem é a versão mais interessante da silhueta alongada com cintura marcada que dominou a temporada masculina de verão 2024. E isso porque Jonathan conseguiu equilibrar com maestria experimentos criativos em construção e modelagem com roupas comuns e relacionáveis para muita gente.

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