Paris Fashion Week: Alexander McQueen Inverno 2024
Seán McGirr estreia na direção criativa da Alexander McQueen cheio de experimentações, sob a justificativa de que tudo pode a juventude.
O sexto dia da semana de moda de Paris, neste sábado (02.03), teve um dos desfiles mais aguardados da temporada: a marca Alexander McQueen abriu um novo capítulo na sua história, agora com Seán McGirr na direção criativa. O estilista estreou com a coleção de inverno 2024, em uma apresentação na antiga estação ferroviária, localizada no 13 arrondissement de Paris.
Nomeado para o cargo em outubro do ano passado, o irlandês de 35 anos assumiu a cadeira até então ocupada por Sarah Burton. A fiel escudeira de Lee McQueen foi quem tocou a etiqueta britânica desde a morte do fundador, em 2010, criando um legado marcado por respeito aos códigos e acabamento impecável do seu mentor – não à toa, desenhou o vestido de noiva da Princesa de Gales, Kate Middleton.
Alexander McQueen, inverno 2024. Divulgação
Leia mais: A última coleção de Sarah Burton para a Alexander McQueen.
Filho de uma enfermeira e um mecânico, Sean McGirr se mudou de Dublin para Londres aos 17 anos de idade, para estudar na famosa Central Saint Martins, por meio de uma bolsa. Ele trabalhou na linha Uniqlo U, da japonesa Uniqlo, onde foi pupilo do estilista Christophe Lemaire. Depois, teve uma passagem pelo ateliê de Dries Van Noten e, mais tarde, assumiu a linha feminina de prêt-a-porter da JW Anderson.
O currículo é invejável, porém não o suficiente para amenizar as críticas. Desde o anúncio de sua contratação pelo grupo Kering, a sua aceitação não é das melhores. A contratação do designer foi problematizada logo de cara: McGirr chegou completando o hall de apenas homens brancos no cargo máximo de criação nas marcas do conglomerado – são elas Alexander McQueen, Balenciaga, Brioni, Gucci, Saint Laurent e Bottega Veneta.
Alexander McQueen, inverno 2024. Divulgação
Depois, a primeira campanha assinada pelo recém-chegado também não convenceu. Mesmo estrelada por uma das maiores musas de Lee McQueen, a modelo Debra Shaw, e com a recuperação do logo original da grife – com um C dentro do Q –, as fotos foram comparadas a produções baratas de fast fashion nas redes sociais.
De acordo com o CEO da Alexander McQueen, Gianfilippo Testa, a ideia da contratação foi justamente trazer uma nova energia, deixar que o olhar jovem de McGirr resgate a característica provocativa da marca, algo que faz parte do DNA da casa.
Por isso, o moodboard de referências do estilista foca na cultura jovem inglesa, assim como no trabalho de artistas estadunidenses de viés contemporâneo, como David Hammons e John Chamberlain. Do passado, mesmo, conta o designer, ele prestou atenção na coleção “Pássaros” (verão 1995), assinada pelo próprio McQueen, e principalmente na capacidade do fundador de subverter clássicos.
Alexander McQueen, inverno 2024. Divulgação
Nas notas de apresentação, a coleção foi descrita como “uma opulência áspera, que revela o animal interior”. E, nas roupas, surge uma gama de experimentações, a começar por um vestido preto de jérsei laminado que leva as mãos para a altura do busto e cria uma imagem de tensão e aprisionamento.
A sequência não dá trégua. Vestidos mídi de malha canelada têm texturas na frente e transparência atrás, casacos de couro são usados com camisas de náilon por dentro. Em outro momento, um tubinho de renda é sobreposto a outro tubinho de tule e as silhuetas são alteradas por meio de blazers com ombros arredondados ou por um top que se expande na parte de cima do corpo, engole os braços e esconde a cabeça.
Volumes exagerados aparecem no vestido e no colete de shearling (o pêlo da ovelha tosquiado), nos tricôs oversized feitos à mão e também nos acessórios, como os coturnos inflados. Tem ainda uma calça jeans com amarração no tornozelo, uma modelo arrastando uma bolsa de tachas no chão sem muita explicação e três vestidos modelados em 3D encerrando a apresentação.
Alexander McQueen, inverno 2024. Divulgação
Tamanha diversidade pode ser lida de diversas formas. Há ousadia, por exemplo, ainda mais quando enxergamos esse desfile em comparação à temporada internacional, que tem sido tão comercial a ponto dos desfiles de diferentes marcas parecerem o mesmo. E existe também esse tal de espírito jovem, que é libertário, de fato, e não deixa de ser justamente o que esperam os chefes do estilista. É do olhar jovem a coragem, o risco, não encarar as escolhas mais fáceis. E isso é também bem McQueen.
Em contraponto, essa mesma ousadia plástica parece pouco fundamentada em um argumento sólido, é difícil não notar vícios de imagem que parecem vir de marcas como Balenciaga e Loewe, e ainda não confundir essa profusão toda mais com ansiedade do que com um universo rico e desejável. Por fim, a alfaiataria deixa a desejar, principalmente depois de anos de corte rigoroso.
O desafio não é dos mais simples, verdade, mas na balança da expectativa e da realidade vale equilibrar um fator presente em todo e qualquer trabalho de Lee McQueen: emoção. E, em meio a tanta coisa, justo isso faltou.
Leia mais: Alexander McQueen bane o uso de pele de animais.
Para ler conteúdos exclusivos e multimídia, assine a ELLE View, nossa revista digital mensal para assinantes