Fiz 50 anos. E daí?

Meio século é muita coisa. Mas também é só mais um ano de vida, afinal, a idade não nos define. Ou define?


Ilustração com balões com os números 5 e 0, bolo, ampulheta e folhinha de calendário



Cinquenta anos. Meio século. Cinco décadas. Seiscentos meses. 18.250 dias. 

Este ano, as SHE_Ts estão cinquentando. Seria fácil se idade se resumisse a números, mas envelhecer não é matemática. É filosofia. 

Agora em janeiro, a Fê completa 50 anos e, em 4 meses, é a vez da Camis. Estamos bem, mas, como já disse Caetano na sabedoria de um de seus milhares de versos, “alguma coisa está fora da ordem”.  

C-I-N-Q-U-E-N-T-A anos é muita coisa. Já contabilizamos 11 relacionamentos sérios, 4 casamentos, 3 divórcios, 3 filhos, 2 abortos, mais de 20 países visitados, 4 línguas aprendidas, 7 familiares enterrados, 2 faculdades concluídas (e 1 sem terminar), inúmeras desilusões e infinitos sonhos. Sim, ter 50 anos é incrível e, ao mesmo tempo, estranho, porque o sentimento é “caramba, eu não me sinto com 50 anos!”. Mas, afinal, por que nós não nos sentimos com 50 anos? Simples. Porque a ideia que habita nosso imaginário ainda hoje sobre como seria uma mulher de 50 anos foi construída no século passado, num momento em que morríamos muito mais cedo, não tínhamos uma vida ativa e saudável, não podíamos contar com a medicina para tratar da saúde e menos ainda da menopausa (aliás, não podíamos nem falar sobre o assunto), não éramos financeiramente independentes e não tínhamos voz ativa. Então, aos 50 anos, só nos restava o papel de vovozinha para poder sobreviver com alguma “função” na sociedade. Claro que, hoje, nós mulheres de 50, 60, 70 e por aí vai, estamos ressignificando o envelhecer, mas a verdade é que nosso inconsciente coletivo ainda está no passado e, sentimos muito em dizer, ainda vai levar um bom tempo para mudar.

Há alguns anos, fomos à palestra de um geneticista que falou uma coisa muito interessante. Segundo ele, os hábitos e pensamentos em relação a algum assunto levam pelo menos três gerações para mudar. Nós, aqui do SHE_T, estamos tentando fazer a nossa parte, falando sobre o valor da mulher também depois que ela passa dos 40, em vez de colocá-la num pedestal somente enquanto ela tem óvulos e é capaz de gerar uma vida. Estamos tentando mudar esse padrão de não pertencimento e inadequação para que, talvez, as nossas netas possam viver em paz e, quando chegar a vez delas de fazer 25, 50 ou 100 anos, isso represente apenas uma mesma coisa: mais um ano de vida.   

Claro que o corpo já não está em plena sintonia com a cabeça e, enquanto um quer correr a maratona, o outro quer ficar no sofá maratonando uma série. Essa luta entre o que um quer e o que o outro faz é exaustiva, e também é verdade que algumas questões e conflitos, como “será que daqui para frente só vai piorar?” ou “sacode esse corpo”, começam a pipocar na nossa cabeça. Mas como disse a psicanalista Vera Iaconelli numa entrevista para o SHE_T “…você vai aprendendo que é assim, é o que temos para hoje”.

E não dá para esquecer que nesse vai e não vai, ainda tem a perimenopausa que é meio que uma amostra grátis da menopausa, mas não é ela em si. A gente explica. A menopausa é um único dia nas nossas vidas e ela só é constatada de fato depois de 12 meses consecutivos sem menstruar. Até lá, você está na perimenopausa e, até esse dia chegar, muita coisa pode acontecer (aliás, muita mesmo), pois é um período que pode durar até 10 anos na vida de uma mulher. Por aqui, já faz uns 3 anos que estamos convivendo com ela. A Cami, de sangramentos duas vezes por mês, agora não sangra mais. Menopausou?! Não. Quer dizer, não a menopausa “pura do livro”, mas depois de 4 meses sem menstruar, desceu, e foi mais ou menos assim: “Ufa, ainda bem que eu não entrei na menopausa”. E, no segundo seguinte, um “ahhhh, não… desceu! Que M*&ˆ%, vai começar tudo de novo!”. Já a Fê não chegou a entrar nesse sangra-não-sangra, porque a testosterona dela baixou e ela teve que começar a fazer reposição hormonal, o que bloqueou a menstruação dela. Sim, alguma coisa está muito fora da ordem.

A gente costuma ouvir (e até já falamos) que nossa idade não nos define. Mas, pensando bem, de muitas formas ela nos define, sim. Mas de uma maneira grandiosa. Por tudo o que passamos nesses 50 anos, somos mulheres com história, bagagem, acertos, erros, e isso precisa ser honrado, celebrado! O que a idade não pode definir é como devemos ser, o que podemos fazer, falar ou vestir, como devemos nos comportar, com quem temos que nos relacionar, quais sonhos nos são permitidos ter. Isso tem que ser escolha de cada uma, e não imposição de uma sociedade.  

E, como diria a filosofia de botequim da “Fedecamilá”, na total aceitação de nossa ignorância, “quanto será que a humanidade ainda tem que envelhecer para aprender a apenas ser?”.   

Camila Faus e Fernanda Guerreiro são criadoras do @she____t. Uma plataforma de conteúdo feita para mulheres que acreditam que a idade dos “enta” rima com experimenta.

 

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