Como montar um sex room?

Nem tudo se resume a espelho no teto ou cama redonda. Confira algumas dicas para criar um ambiente que estimule os sentidos e convide ao prazer.


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Dois lançamentos recentes, a ELLE Decoration e o novo TV show da Netflix, chamado How to build a sex room, me fizeram querer falar mais sobre os pontos de encontro que vejo em dois temas aparentemente distantes: sexualidade e decoração. Quando falo que nossa libido é multifatorial, que não é algo desgrudada das nossas banalidades cotidianas, também estou falando que todo o nosso contexto, seja ele interno ou externo, acaba influenciando no modo em que vivemos a nossa sexualidade. Ou seja, um ambiente acolhedor é, sim, capaz de amparar e até despertar nossos desejos.

A chamada “decoração sensorial” tem muito mais a ver com a adição de elementos que nos convidam a despertar os sentidos do que transformar o ambiente numa masmorra de BDSM. Não acredito que seja sobre trazer uma cama redonda, espelho no teto ou qualquer coisa na intenção de transformar a casa num motel. Não, mesmo. O que quero pontuar aqui é que tudo é sobre a sutileza dos pequenos detalhes. Nesse caso, não existe uma fórmula mágica à la feng shui do sexo, são nas necessidades e gostos pessoais que é possível descobrir como criar um universo que converse melhor com o íntimo de cada pessoa. Se você assistiu a série, traduzida para Como criar um quarto do sexo, viu que existe de tudo, casais que já até esqueceram o que é intimidade, outros muito empolgados na jornada de explorar juntos as novas experiências, pessoas buscando transformar a casa num lugar mais convidativo para casualidades e até família poliamorista cheia de fetiches específicos. E todos esses arranjos podem ser contemplados com um ambiente mais reservado aos prazeres.

Pessoalmente, não sou muito fã dessa estética norte-americana exagerada, principalmente quando se trata de reality show. Então, faria algumas modificações tanto na abordagem, quanto na criação desses espaços chamados de sex room. Cada objeto que escolhemos reflete como queremos expressar nossa individualidade. É como se a casa fosse uma extensão de nós mesmos. O equilíbrio entre relaxamento e diversão fica num espectro delicioso e amplo e vai aparecer de maneiras bem diversas em cada caso. Pensando de uma maneira mais prática e acessível, diria que podemos nos guiar por 4 sentidos humanos, que são fundamentais e merecem receber a devida atenção na hora de pensar no tal “quarto do sexo”. São eles: visão, olfato, tato e audição.

Visão

Você consegue se imaginar à vontade e relaxada num lugar com aquela luz branca forte, que mais lembra a iluminação de uma farmácia? Eu não, e imagino que você também. Na hora de buscar sensações de acolhimento, que logo podem virar um impulso extra na hora de querer explorar o toque e o autoamor, a luz ao redor conta bastante. É importante que a sutileza da iluminação nos convide a olhar o próprio corpo de maneira mais gentil, quase como um abraço pelas curvas. Isso pode ser feito através de uma luz indireta, que pode vir por meio de uma pequena luminária ou até mesmo velas (importante nesse caso sempre verificar se elas vão estar num local apropriado e seguro). Fugir da iluminação artificial de telas como computador e televisão também é importante, não é só pelo incômodo e cansaço que ela pode causar aos olhos, mas também pela distração que esses aparelhos digitais causam. Pensar na sexualidade como uma parte do bem estar humano também significa buscar alternativas de redução de danos em relação a certos vícios modernos, como a vontade de estar sempre online. Imagine um ambiente que te traga para o presente, que faça a vida real e íntima ser mais interessante do que as projeções e comparações das redes sociais. Um lugar aonde você chegue e saiba que está segura para ser quem é. Busque características da sua identidade erótica para compor a decoração, mesmo que apenas você consiga identificá-las dessa forma. De novo, não é sobre trazer uma luz vermelha ou quadros de nudez para a decoração (mas se esse for o seu desejo, por favor, vá em frente, que tá tudo certo) na intenção de performar o que o lugar comum tende a dizer que é sexy. É sobre encontrar tons e intensidades de luz que conversem com o seu jeito de se sentir sexy, assim como os demais elementos.

Canto da sala com velas, folhas de eucalipto, poltrona verde e quadros

Busque características da sua identidade erótica para compor a decoração, mesmo que apenas você consiga identificá-las.Foto: Arquivo pessoal

Olfato

Acho que damos pouco crédito a esse sentido, mas a verdade é que nosso cérebro responde de uma maneira muito significativa a ele. Claro, é superpossível sentir tesão mesmo quando o ambiente não está perfumado ou qualquer coisa do tipo, mas certos aromas não só ajudam a relaxar, concentrar ou despertar, como também carregam uma memória afetiva com a capacidade de nos levar ao encontro de um momento ou alguém especial. Existe também o “cheiro de ar puro”, que nos desperta por dentro quando saímos das grandes cidades, e que é capaz de trazer uma atenção mais plena à nossa respiração. E, nossa, como a respiração é uma peça importante pro nosso prazer! Uma dica que sempre dou quando me perguntam qual a solução para desbloquear os orgasmos, é respirar fundo e notar todos os movimentos corporais envolvidos nessa atividade durante a estimulação sexual. Esse é um exercício extremamente simples, porém com um poder imenso. Então, se você, como grande parte da população, não possui tanto acesso a esse ar mais limpo e gostoso de sentir, pode ser que na aromaterapia seja encontrada uma forma mais eficiente de trabalhar esse sentido. Se a necessidade é de relaxamento, o campeão é o óleo essencial de lavanda. Para trazer mais energia: óleos essenciais cítricos, alecrim e peppermint. Já a essência de ylang-ylang vai direto ao ponto e promete ser afrodisíaca. Flores e plantas frescas, como eucalipto, são bem-vindas e ainda somam ao estímulo visual que, como vimos acima, também é importante.

Tato

Será que existe um sentido mais erótico do que o tato? Se estamos falando justamente sobre criar ambientes para se tocar ou tocar o outro, como seria diferente? Considero que a pele seja o maior órgão de prazer e o cérebro, o mais importante. Então, aqui o foco é nas texturas do ambiente e também desse nosso lar chamado corpo. A textura diz sobre tudo que encosta na nossa pele, roupas de cama, tecidos de lingerie, sofás, almofadas, sex toys e tudo que de certa forma nos abraça. Às vezes, tocar num tecido agradável pode despertar muito mais desejo do que algo explicitamente relacionado ao sexo. Pense comigo: é muito comum ouvir relatos de que em viagens os casais costumam fazer mais sexo ou, pelo menos, ter uma qualidade melhor nas interações sexuais. E qual o diferencial que um hotel ou um airbnb possui, que acaba provocando esses momentos? Além da novidade, claro, há uma preocupação intencional do conforto aliado ao toque. Quem nunca quis ter um lençol ou uma toalha de hotel em casa? Pensar nesses detalhes também é pensar no bem-estar cotidiano, o que nos leva à construção de uma intimidade mais sólida e à sensação de que estamos sendo cuidados de verdade. Indo na direção de um lado ainda mais divertido do bem-estar sexual, saiba que tecidos e texturas também podem ser usados como acessórios criativos entre quatro paredes. Deixe com fácil acesso elementos que possam virar algemas, chicotes, vendas e o que mais sua imaginação permitir, mesmo que só você entenda a mensagem erótica por trás de cada um deles. Use o tato como ferramenta criativa de exploração sensorial e perceba a delícia que é viver esse processo.

Audição

Uma parte muito preciosa capaz de ligar ou desligar completamente o clima é o barulho ao redor ou envolvido durante os momentos íntimos. Por exemplo, um vibrador barulhento ou a obra do vizinho podem cortar o tesão de muita gente, mas, em contrapartida, gemidos e outros ruídos gostosos são ótimos aliados. Criar um espaço íntimo que assegure que estamos com privacidade e tranquilidade suficientes, ou seja, sem o risco de ser escutada ou acabar escutando demais, é fundamental para impulsionar mais espontaneidade nos desejos. Dica para quem mora em lugares com paredes finas e/ou com mais gente: sempre tenha sua playlist/músicas preferidas à mão quando precisar que ninguém ouça você ou seus sex toys. As distrações externas também podem ser abafadas com sons ambientes e outras ajudas tecnológicas. Se nossa libido flui melhor quando estamos num lugar onde podemos exercer a presença genuína, seja dançando na sala sozinha, fazendo isso com mais alguém, botando para fora os diferentes sons que os diferentes tipos de orgasmos causam, ou simplesmente ficando em silêncio nos pequenos rituais de autocuidado, então, vale muito a pena investir no que estiver ao alcance para possibilitar essa fluidez.

O prazer acontece na sinestesia, e nossa casa pode ser uma extensão das sensações e percepções individuais. É uma ilusão acreditar que a libido floresce no acaso – ela precisa ser cuidada por toda vida e diariamente, como um jardim. A boa notícia é que as ferramentas de cuidado são simples e acessíveis. Quem sabe se a gente trocar o termo “quarto do sexo” por “ambientes de conexão” e buscar a construção desses espaços não apenas físicos, mas também emocionais, esse trabalho de cuidado não chegue carregado de tanta pressão ou barreiras? Se ainda restou alguma dúvida sobre por onde começar a refletir sua sexualidade na sua casa, se pergunte: “Como eu desejo celebrar e potencializar meus sentidos?” Acredito que aí esteja guardada a sua resposta.

Clariana Leal é educadora sexual e carrega como propósito a abertura honesta e inclusiva do diálogo sobre sexo, desejo e corpo. Na sua coluna Prazer sem dúvidas, ela responde mensalmente as dúvidas do público da ELLE.

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