Arte em SP: Leonilson, Stefania Bril e Rotas Brasileiras

As mostras sobre os artistas e a terceira edição da feira chegam ao Masp, IMS e a Arca.


Arte em SP: Obra de Agostinho, em exibição no Rotas Brasileiras
Obra de Agostinho, em exibição no Rotas Brasileiras, pela Antonio Luiz Bei Escritório de Arte Foto: Divulgação SP–Arte Rotas Brasileiras



Na esteira da SP-Arte Rotas Brasileiras, que chega à sua terceira edição com a ideia de dar espaço para as produções realizadas em diferentes estados do país, instituições como o Masp e o IMS-SP apresentam um novo olhar sobre as obras do artista cearense Leonilson e da fotógrafa Stefania Bril, de origem polonesa e radicada no Brasil. Confira a seguir:

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Slave (1990), obra de Leonilson (Coleção Eduardo Brandão e Jan Fjeld) Foto: © Edouard Fraipont / Projeto Leonilson

Leonilson: agora e as oportunidades, no Masp

Leonilson morreu aos 36 anos em decorrência de complicações da aids e deixou como legado uma obra extremamente pessoal e marcada por temas como o amor e a sexualidade. Agora, três décadas após sua morte, como foco de uma exposição que acontece justamente no ano em que o Museu de Arte de São Paulo se dedica às histórias LGBTQIA+, a tentativa da curadoria é fugir de uma interpretação definitiva e de viés biográfico.

Na expografia, a escolha do diretor artístico Adriano Pedrosa, curador da mostra, foi evitar agrupamentos em eixos temáticos e apostar em uma apresentação de forma cronológica com peças dos últimos cinco anos de produção do artista cearense. “Esse período constitui o ‘Leonilson tardio’, em que o artista desenvolve e depura cada vez mais seu trabalho, alcançando uma síntese verdadeiramente sublime”, escreve Pedrosa em sua apresentação.

Há ainda ênfase em uma atitude política do artista, já que o nome da exposição toma emprestado o título de uma obra de 1991 em que Leonilson desenhou seis copos para representar diferentes minorias, que são identificadas na tela como “os negros”, “os homossexuais”, “os judeus”, “as mulheres”, “os aleijados” e os “comunistas”. As ilustrações feitas para a coluna de Barbara Gancia no jornal Folha de S.Paulo entre 1991 e 1993 também ocupam todo o mezanino, localizado no primeiro subsolo do museu.

No primeiro andar, os cinco anos são divididos por salas e apresentam uma sorte de produções – trabalhos feitos sobre tela, papel, lona e tecidos como veludo, feltro, renda guipure e voile. A última delas é reservada à última obra, uma instalação feita originalmente para a Capela do Morumbi e apresentada no local poucas semanas antes da morte do artista. Remontada no museu, ela tem como protagonista Lázaro, que Jesus ressuscitou quatro dias após sua morte, e representa o cenário para a missa do próprio Leonilson.

Até 17/11, no Masp

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Em forma de família (1996), de Lenora de Barros Foto: Divulgação/Gomide&Co

SP-Arte Rotas Brasileiras, na Arca

Em sua terceira edição, a SP-Arte Rotas Brasileiras tem como principal destaque a direção artística de Rodrigo Moura, que já atuou em instituições como o Masp, Inhotim e atualmente ocupa o cargo de curador-chefe no Museo del Barrio, em Nova York. Sua estreia, para além da colaboração com as galerias, marca também a inauguração de um novo setor da feira, intitulado Mirante, que surge com a ideia de reunir obras em grande dimensões que, muito em razão de sua escala, acabam não sendo exibidas com frequência. 

Entre os exemplos, estão a escultura Machado duplo de Xangô (2021), de Emanoel Araujo (Galeria Simões de Assis), e da obra Êxtases (1987), realizada por Tunga a partir de agrupamentos de imãs quebrados em diferentes tamanhos. Além deles, o projeto também traz nomes como Rivane Neuenschwander e Adriana Varejão, além de representantes de uma nova geração, como Rebeca Carapiá e Jota Mombaça. 

O objetivo da feira de olhar com atenção para a arte produzida em diferentes regiões brasileiras é traduzido nesta edição pela participação de 15 estados, entre Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso e Minas Gerais. Galerias importantes do Nordeste também marcam presença, como Lima (São Luís do Maranhão), Marco Zero (Recife), Paulo Darzé, Acervo, RV Cultura e Arte (Salvador) e Leonardo Leal (Fortaleza). “Rotas oferece a possibilidade de criar diálogos em torno de conceitos e noções de identidade e pertencimento, propondo perguntas, revisões e afirmações”, afirma o diretor artístico. 

Dentre os mais de 60 expositores que apresentam o trabalho de cerca de 250 artistas, vale especial atenção para alguns projetos, como o concebido por Lenora de Barros para a Gomide&Co. No estande da galeria, a artista buscou um diálogo visual e afetivo entre as obras produzidas por ela e pelo pai, o artista Geraldo de Barros. A seleção se concentra entre as décadas de 1940 a 1960, quando Barros se interessa pela Teoria da Gestalt, a escola de Bauhaus e nomes da vanguarda russa, como o poeta Vladímir Maiakóvski (1893-1930) e os artistas El Lissitzky (1890-1941) e Aleksandr Rodchenko (1891-1956), um período que coincide com a infância de Lenora e aparece mais tarde ressignificado na sua produção.

De 28/8 a 1/9, na Arca

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Via Dutra, abril de 1972, foto de Stefania Bril. Foto: Acervo IMS/ Arquivo Stefania Bril

Stefania Bril: desobediência pelo afeto, no IMS-São Paulo

Cidades como São Paulo, Nova York, Paris, Amsterdã e Jerusalém aparecem nas cerca de 160 fotografias de Stefania Bril que fazem parte da primeira individual dedicada à obra da artista nos últimos 30 anos. O que se vê nessas imagens, no entanto, são sobretudo pessoas, já que a fotógrafa de origem polonesa, que se mudou para o Brasil após a Segunda Guerra Mundial, dizia gostar de gente e não de carros. 

Assim, diferentemente de uma fotografia urbana centrada nas transformações da metrópole, um traço evidenciado por vários dos artistas europeus que se radicaram no país, nas imagens de Bril nem sempre identificamos o local onde determinada cena foi registrada sem recorrer às legendas. “Em suas imagens, não encontramos traços singulares das cidades retratadas, e tampouco vemos um fascínio pelas edificações modernistas ou por paisagens urbanas arrojadas; se há algum encantamento, ao contrário, é pela quebra de ordem”, escreve Miguel Del Castilho em texto curatorial da mostra.

Nascida na Polônia em 1922, em uma família judaica, Bril sobreviveu ao Holocausto e emigrou para o Brasil em 1950, trabalhando nas áreas de bioquímica e química nuclear antes de se consolidar como fotógrafa na década de 1970. Tendo escolhido a rua como local de sua prática, ela deixou um legado de mais de 11 mil imagens, muitas delas organizadas por meio da criação de categorias. Desde 1969, por exemplo, a polonesa produziu registros de pessoas para a série que denominou depois como Gente. Em Descanso, reuniu flagrantes de homens cochilando próximo a seus locais de trabalhos e Poetas de estrada consiste em uma seleção de escritos encontrados no espaço público. As fotografias que estão agora no IMS mostram, de acordo com Del Castilho e Ileana Pradilla Ceron, cocuradora da exibição, a desobediência de Bril como traço essencial de sua obra, em um posicionamento que foge dos assuntos considerados de relevância pública para se centrar em um “tema sem importância” como o cotidiano.

De 27/8 a 26/1/2025, no IMS-SP

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