Cachaça para presente: opções bonitas por fora e por dentro

Para presentear com cachaça ou receber com charme, indicamos algumas bebidas de finíssima procedência que também alegram a vista.


pindorama branca ouro
Foto: Divulgação



A historinha é clássica e cheia de clichês. Chega um amigo estrangeiro ao Brasil, visita as praias, pega sol, dança samba e se apaixona pela caipirinha – a verdadeira, feita com cachaça, isso nem se discute. Aí chega sua vez de visitar o amigo, que vive numa cidadezinha da Bavária, a alguns quilômetros de Munique. O que levar? Nada mais clássico e clichê: cachaça para presente.

Vamos combinar que ninguém quer se abalar daqui até a Alemanha levando uma cachaça comum, do tipo que se encontra em qualquer boteco ou supermercado. Precisa ser especial por dentro e, nesse quesito, existem inúmeras boas opções de rótulos, produzidas em diversos estados, armazenadas ou envelhecidas em diferentes tipos de madeira, com variadíssimos perfis sensoriais. Mas você também quer que ela seja linda por fora. Aí talvez a busca não seja tão simples assim…

Usemos de sinceridade: tem muita coisa tosca no mercado, feia mesmo. Mas vamos mandar mais um lugar-comum – “não julgue um livro pela capa” – e fazer a Poliana Moça, ver o lado bom das coisas. Há uma nova geração de cachaças que, além de verter qualidade e diversidade nas taças, dão um show de beleza e brasilidade do lado de fora do vidro. Para dar um pequeno panorama de como são feitas e pensadas, conversamos com produtores de duas delas, com um bartender que lançou sua marca e um artista gráfico que busca inspiração na ilustração brasileira do passado para “renovar” a imagem da cachaça. 

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Mostramos apenas alguns exemplos, tá? Vale explorar o mundo da cachaça, conversar com especialistas, conhecer outros estilos, buscar mais líquidos bons em embalagens bonitas, menos interessantes e até bem feiosas, por que não? Nesse texto privilegiamos o que está por fora, com a régua estética de uma pessoa só: a que escreveu a matéria. Acontece que o que tem dentro é sempre mais importante. E também tem muita garrafa metida a chique por aí que guarda líquidos de amargar – é bom ficar de olhos e de sentidos sempre alertas.

As roupas bonitas de Alzira

“Que garrafa mais linda!” – é comum alguém soltar a exclamação, ao ver uma Alzira por aí. Os três rótulos diferentes para o mesmo blend mostram que, com uma roupa bonita, é possível amolecer o preconceito contra o destilado de cana. Sim, ele persiste. “Queremos tirar a cachaça do lugar de bebida de alcoólatra, como ela ainda é vista por muita gente, infelizmente”, diz Celia Mattos, sócia do marido, Gustavo Della Colletta, na destilaria que produz as cachaças Alzira e Cê.

Alzira é inspirada na avó de Gustavo, que chegou aos 100 anos, botou pra quebrar e derrubou barreiras com coragem e alegria. Dirigia automóvel no interior de São Paulo, quando nenhuma moça fazia isso, dançava um tango cheio de compasso, abriu seu próprio negócio – um salão de beleza, com o qual sustentava a casa – e não costumava dar bola para a opinião alheia. Viveu 65 anos ao lado de seu amado, Octaviano. 

“Aí tem muita verdade, não queríamos contar uma historinha fake. Dona Alzira foi à frente de seu tempo em muitos sentidos e o fato de termos três rótulos para a mesma cachaça representa a diversidade da mulher brasileira”, explica Celia, que deixou a identidade visual da marca a cargo da agência Colletivo Design, a mesma que desenhou os rótulos minimalistas – cool & clean – da Cê.  O esmero ganhou apoio da importadora La Pastina, que hoje se encarrega da distribuição do produto.

A empresária tem certeza de que não haveria hype em cima de Alzira sem essa identidade – e que isso pode servir de bússola para outros produtores. “Muitos não tratam a cachaça como um produto verdadeiramente nobre. Enxergam gasto em tudo, não veem a preocupação com o visual como investimento”, diz Celia, chef formada pela Le Cordon Bleu, na França, junto com o marido. Usa a analogia gastronômica para reiterar seu pensamento: “Comemos com os olhos. Se o prato é feio, não nos interessamos por ele, mesmo que seja delicioso. Há cachaças excelentes que, pelo visual, não nos convidam ao primeiro gole”.

cachaça para presente

Foto: Divulgação

CACHAÇA ALZIRA (Torrinha – SP)
O que tem dentro: blend de cachaças com passagem por jequitibá e amburana, elaborado pela especialista e cientista da cachaça Aline Bortoletto. Tem aromas de baunilha, frutas secas, canela. Levemente adocicada, é suave e aveludada no paladar. Ótima para drinks cítricos.
Quanto e onde: R$ 142, na World Wine.

cachaça para presente

Foto: Divulgação

CACHAÇA CÊ (Torrinha – SP)
O que tem dentro: Cê Blanc de Blancs é uma cachaça branca, sem passagem por madeira, com frescor de frutas e aroma de cana. Cê Triple Wood blenda cachaças com passagem por castanheira, carvalho americano e carvalho francês.
Quanto e onde: R$ 243 (Cê Blanc de Blancs) e R$ 367 (Cê Triple Wood), na World Wine.

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Lendas e signos de Pindorama

Pindorama é outra cachaça que chega chegando ao bar. Difícil desperceber o visual luxuriante de seus rótulos, na versão prata e ouro. As garrafas lindas e bojudas, com ilustrações em estilo clássico, trazem signos de cosmogonias brasileiras, histórias dos povos indígenas, aves, peixes, animais, constelações, boto, sereia. Oveja & Remi, designers argentinos especializados em bebidas, traduziram a extensa pesquisa feita por Rafael Daló, publicitário, artista plástico e sócio do negócio familiar criado na Fazenda das Palmas, interior do Rio de Janeiro. 

O conceito da cachaça foi pensado por Rafael, sua esposa e sua sogra, cada um colocando na roda o que acreditava ser Pindorama – “terra das palmeiras” em tupi (ou “terra livre dos males” em outra etimologia). Leituras dos modernistas Oswald e Mário de Andrade e outras tantas referências literárias, filosóficas e visuais fizeram parte do processo. Rafael resume: “A cachaça é a essência do DNA brasileiro. A cana-de-açúcar foi importada e depois domesticada com ajuda da sabedoria indígena, que conhecia bem o território. Foi cultivada e processada pela mão-de-obra escravizada. Ela é o centro de muitas culturas”.

Há certo contrassenso, acredita o produtor, em vestir a cachaça com rótulos que lembrem os de vodca ou uísque, buscar uma linguagem de fora quando podemos encontrá-la aqui mesmo. A identidade visual de Cobra Coral, terceiro produto da Pindorama, é a prova de que se pode ser simples, brasileiro e bastante chique – tudo junto. De novo Oveja & Rami traduziram o espírito guardião da floresta em imagens, com tipologia que lembra os cartazes estilo lambe-lambe. Com essa proposta visual e com qualidade dentro da garrafa, os produtos da Fazenda das Palmas conquistam Inglaterra, Portugal e outros países da Europa.

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Foto: Divulgação

PINDORAMA (Engenheiro Paulo de Frontin – RJ)
O que tem dentro: a Pindorama Prata não tem passagem por madeira, é leve, com sutis aromas frutados. Boa para ser bebida pura ou em coquetéis. A Ouro passa por tonéis de amburana, tem toque aveludado, notas de especiarias, castanhas e mel.
Quanto e onde: R$ 130 e R$ 150, no site do produtor.

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COBRA CORAL (Engenheiro Paulo de Frontin – RJ)
O que tem dentro: Cobra Coral é um blend de cachaças de diferentes produtores. O corte procura criar uma bebida elegante e equilibrada, bastante indicada para a coquetelaria tropical. Um dos best buys da nossa seleção. Vem com rótulo preto ou colorido.
Quanto e onde: R$ 60, no site do produtor.

Herança caipira na cultura gráfica brasileira

Para o artista gráfico Luis Matuto, sócio do estúdio de design Arado, a identidade da cachaça já está dada há um bom tempo. Basta voltar ao passado e reconectar-se a alguns elos não tão perdidos assim. “Se hoje você entra numa loja de cachaça, talvez se pergunte: ‘Cadê o Brasil aqui?’ Vai encontrá-lo nos rótulos antigos. Acontece que fomos nos distanciando da cultura gráfica brasileira, que é grandiosa. Para alguns produtores, ficou feio parecer brasileiro”, diz Matuto.

A marca Princesa Isabel, do Espírito Santo, não tem medo de ser brasileira. Já contava com uma coleção bem colorida de rótulos com aves e paisagens nossas quando contatou a Arado para a criar a identidade de mais dois produtos, a Bom de Bico e a Casório Perfeito. Fiéis ao espírito de pesquisa da cultura rural do Brasil, os designers reviveram o estilo old school de rótulo de cachaça, impresso em offset e colado em garrafas escuras de 600 ml, as mesmas que envasam cerveja.

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A paixão de Luis e seus sócios Bruno Brito pela caninha vai além. A Arado lançou a própria cachaça, Terra Arada, nas versões jequitibá e amburana, dentro de um portfólio de produtos próprios que incluem cartazes, bandeiras, camisetas, sabonetes, camisetas, álbuns e outros badulaques com alma caipira retrô. A volta ao passado gráfico brejeiro do Brasil coloca a agência numa paradoxal posição de vanguarda, com trabalhos para outras destilarias, queijarias, restaurantes, museus, instituições culturais, editoras. “Outros grupos de design começam a se interessar por esse resgate e há mais alambiques e pensadores de cultura querendo falar sobre Brasil”, diz Matuto. No que diz respeito ao fluxo de caixa, também não há o que reclamar: “Não tem faltado trabalho”.

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BOM DE BICO E CASÓRIO PERFEITO (Linhares – ES)
O que tem dentro: Bom de Bico não tem passagem por madeira, traz dulçor de cana e aromas vegetais. Casório Perfeito foi um corte criado para o casamento de um dos filhos do dono da Princesa Isabel, com cachaças que passaram por jequitibá, bálsamo e amburana. Fez tanto sucesso que entrou na linha da casa.
Quanto e onde: R$ 49 e R$ 59, respectivamente, na BR-ME.

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TERRA ARADA (São Luís do Paraitinga – SP)
O que tem dentro: cachaças sem madeira ou com passagem por jequitibá-rosa, de ação sutil, que empresta leves nuances de caramelo e frutas secas à bebida. A arte do rótulo também é vendida como um cartaz, para quem quer dar uma bossa roceira à decoração da casa.
Quanto e onde: R$ 79 (prata), R$ 89 (jequitibá) e R$ 89 (cartaz), na Loja do Arado.

A história de um menino baiano impressa no rótulo

Quando o mixologista Laércio Zulu pensou em lançar sua cachaça, a Zuluzêra, preocupou-se primeiro com o líquido, naturalmente. Queria um destilado com um pouco mais de corpo e de punch alcoólico, para uso na coquetelaria – especialmente na execução do Banzeiro, seu coquetel sour de assinatura com cachaça, limão, açúcar, vinho tinto e espuma de gengibre.

Acertada a fórmula, faltava encontrar uma roupagem que fizesse jus à sua própria imagem, estilosa e elegante. O artista gráfico João Lucas Leme traduziu na ilustração do rótulo um pouco da história pessoal de Zulu. “Joguei para o João várias informações, referências pessoais e culturais da minha história, alguns elementos da minha cidade natal. Sou de Amargosa, berço das festas juninas do interior baiano. Apesar de ter sido criado em Tapirama, vivia minhas férias de junho em Amargosa, com a Praça do Bosque toda fechada de bandeirolas. É o marco do São João na Bahia”, conta Zulu.

A imagem das bandeirinhas mistura-se ao chão da estrada de terra batida, que se confunde com a ideia de um rio sinuoso, o Rio de Contas, que ladeia Tapirama. Ao centro, o desenho circular pode representar a madeira cortada, que abrigará e dará aromas à cachaça, ou o sol do sertão baiano, “que é o mesmo sol de todos os lugares, mas canta mais bonito por lá”. O céu estreladíssimo das noites e dos amanheceres do interior fecha o panorama. “É o grande barato de viver na roça, longe de tantas luzes.” E assim se conta mais uma história brasileira num rótulo de cachaça.

 

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ZULUZÊRA (Caravelas – BA)
O que tem dentro: uma cachaça com trabalho sutil em madeira de amburana, que revela notas de amêndoas e de especiarias. Tem teor alcoólico mais robusto, de 42%, e foi especialmente pensada para a coquetelaria. Produzida pela Fazenda Cio da Terra, mãe da famosa Cachaça Matriarca.
Quanto e onde: R$ 119, na Vitrus Glassware.

Outros rótulos bonitos de cachaça para presente

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Foto: Divulgação

MARIA IZABEL (Paraty – RJ)
A cachaça Maria Izabel foi uma das primeiras a imprimir, no rótulo, o conceito de cachaça premium sem querer parecer vodca polonesa. A tipologia é propositadamente desengonçada, porém elegante, de forma a sugerir que alguém a traçou “ingenuamente”. Esse charme também evidencia o caráter artesanal da produção do Sítio Santo Antônio, dirigida por Maria Izabel Costa, a mulher que parece brotar da terra ao nascer do sol na ilustração do topo do rótulo. Criação do ilustrador australiano Jeffrey Fisher.
O que tem dentro: uma fina coleção de cachaças, com cana cultivada organicamente e processada com fermento artesanal. Há cachaça sem madeira, envelhecida em jequitibá e uma série de líquidos com passagem por carvalho, de um a sete anos de maturação.
Quanto e onde: de R$ 140 a R$ 480, no site da destilaria.

cachaça para presente

Foto: Divulgação

MÃE SANTA (Linhares – ES)
A arte do rótulo da Mãe Santa ecoa modernistas brasileiros como Lasar Segall e Candido Portinari em seus momentos mais sintéticos. A fertilidade da mãe terra é representada pela mão de onde brota a cana-de-açúcar, num arranjo de cores em que predominam o preto, o verde e o ocre. O rótulo “rasgado” sugere o traçado de montanhas e faz com que a cor acobreada da cachaça integre elegantemente a composição.
O que tem dentro: uma cachaça ousada, envelhecida por 12 meses em barris de grápia, madeira que traz notas de especiarias, dulçor de banana, uma certa adstringência, amargor e um toque salgado, de acordo com o site especializado Mapa da Cachaça. Bebida bem complexa, feita pelos mesmos criadores da Cachaça Princesa Isabel.
Quanto e onde: R$ 147,79, na Dose 7.

cachaça para presente

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ITUANA (Itu – SP)
A arte da coleção de cachaças da Ituana é assinada pela artista plástica Aline Fraga Seelig, com um jeitão bem pop que também remete a modernistas – Tarsila do Amaral e Vicente do Rego Monteiro. A cana-de-açúcar, o homem do campo, aves, animais e a própria garrafa de cachaça aparecem nas composições multicoloridas.
O que tem dentro: a coleção de Ituana conta com cachaças armazenadas em jequitibá, amburana e carvalho. E mais duas bebidas mistas, uma composta com mel e outra com rapadura.
Quanto e onde: os preços vão de R$ 105 (jequitibá) a R$ 175 (carvalho), no site da destilaria.

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