NYFW: o underground quer ser sofisticado, a volta do corset e mais
Tudo o que você precisa saber sobre a estreia da marca própria de Shayne Oliver, da Hood By Air, os desfiles de Elena Velez, Proenza Schouler, Area e PatBo e as primeiras tendências da nova estação.
Não é exatamente um movimento novo, mas algo que andava apagado em detrimento de uma moda mais polida, de uma ideia de luxo aos moldes europeus. Parte do sucesso inicial da semana de moda de Nova York veio de um grupo de estilistas menos preocupados com os padrões franceses ou italianos do que com uma expressão criativa crua e autêntica daquilo que acontecia nas ruas, festas e na cultura local em geral. Eram nomes como Miguel Adrover, Helmut Lang, Anna Sui, Marc Jacobs e, mais recentemente, Telfar, Pyer Moss, Eckhaus Latta e Shayne Oliver.
Vocês devem lembrar de Shayne Oliver da Hood By Air, marca que cofundou e transformou o que se entendia por streetwear com uma explosão de referências e influências que passam longe das convenções e tradições do mercado. Em 2017, ele decidiu dar um tempo, mas agora voltou com uma marca própria. Homônima no caso. A HBA continua existindo, mas num formato um pouco diferente, totalmente digital.
A estreia da Shanye Oliver aconteceu nos primeiros dias da NYFW, não como um desfile tradicional, mas como um festival de música e arte dividido em três dias. Tinham performances, shows, exposições e uma espécie de desfile/festa. São poucas as imagens na internet, mas pelo que deu para apurar, as modelos caminhavam entre os convidados (todos de pé), ao som da cantora Eartheater (aka Alexandra Drewchin), ao vivo.
Diz que no dia da apresentação das roupas, o segundo do evento, teve um mega atraso, mais de uma hora. Mesmo assim, ninguém arredou o pé. O impacto de Shayne na moda nova-iorquina foi tamanho que ninguém queria arriscar perder algo potencialmente incrível. Se foi ou não incrível, é difícil dizer. Até quem estava lá não consegue precisar. Tava escuro demais, e o esquema da passarela entre os convidados dificultou a visualização das roupas.
Ainda assim, dá para sentir uma pegada um pouco mais sofisticada do que o que se via na HBA. Os desenhos e construções são mais ambiciosos e complexos, os tecidos, de melhor qualidade. Sempre com a atitude firme, quase crua de trabalhos passados. Em entrevista à jornalista Cathy Horyn, Shayne disse que estava tendo alguns desentendimentos com o pessoal da HBA, que não queria uma moda tão distante das origens street da etiqueta. Por isso, o voo solo.
Quem estava lá, comentou que o auê todo lembrou algumas festas de Nova York que foram fonte de inspiração e estímulo para toda uma geração de criativos. Outros viram similaridades nas apresentações de Helmut Lang e Miguel Adrover nos anos 1990, meio desfile de moda meio performance artística. E antes que alguém venha falar alguma coisa, isso não tem nada a ver com cópia. Tem, sim, a ver com conhecer seu passado, entender o que veio antes e usar isso da forma que melhor lhe convém ou que mais faça sentido para seu contexto. Tem a ver com respeito, reconhecimento e, em algum nível, colaboração. Aliás, sobre isso vale uma menção honrosa ao top feito com uma bolsa da Telfar.
Elena Velez, inverno 2022.Foto: Divulgação
Se antes a cena de moda nova-iorquina era extremamente bairrista, agora há espaço para criadores e marcas de outras partes dos EUA. Um bom exemplo é Elena Velez, estilista de origem porto-riquenha, nascida em Milwaukee, no estado de Wisconsin. A principal característica de sua moda é a representação das mulheres, porém há também uma forte influência da sociedade do meio-oeste estadunidense e o que ela veste. A jornalista Giuliana Mesquita fala mais sobre isso nessa matéria.
Em comum a essas marcas, estão a estética crua, a conexão com suas comunidades e origens e uma vontade de ressignificar o que se entende por moda estadunidense, as formas de apresentação e os conceitos de luxo, sofisticação e elegância. A dupla de estilista Mike Eckhaus e Zoe Latta, da Eckhaus Latta, está nessa missão há 10 anos e, nesta temporada, apresentaram uma das coleções mais convincentes e bem resolvidas nesse sentido.
Eckhaus Latta, inverno 2022.Foto: Divulgação
Na passarela, entre transparências brilhantes e tricôs confortáveis, há uma maior quantidade de peças artesanais, feitas 100% internamente, nos ateliês da etiqueta. São modelos com recortes assimétricos e sobreposições de pedaços de tecidos quadrados ou retangulares, com transparência variada. Ao mesmo tempo, a dupla não esquece dos básicos que lhe renderam fama e sucesso comercial (nem do casting bem vida real). Os jeans, blusas e camisetas chegam levemente mais intrincados, com recortes de tricô de pontos largos e tingimentos manuais.
Tricô, vale dizer, já se mostra como um dos principais tecidos do inverno 2022. Pode parecer óbvio, mas não é qualquer tricô. O mais interessante é um maquinado de pontos bem fechados, para dar mais estrutura à peça. O melhor exemplo aparece na Proenza Schouler: os vestidos de saias abaloadas têm a parte de cima feita desse material, daí as formas meio peplum que definem uma nova silhueta ampulheta.
Proenza Schouler, inverno 2022.Foto: Divulgação
Ainda sobre a etiqueta dos designers Lazaro Hernandez e Jack McCollough, é interessante notar como eles recuperaram alguns elementos do próprio passado a partir de novas tecnologias. As estruturas de corset, que marcaram as coleções de estreia da Proenza Schouler, voltam agora em tricô, porém sem costura alguma, graças a uma máquina capaz de tramar o tecido de forma circular e numa única peça.
Proenza Schouler, inverno 2022.Foto: Divulgação
Elena Velez, inverno 2022.Foto: Divulgação
O corset é outra possível tendência da temporada. E uma bastante simbólica. É um item que carrega conotações sexuais, underground, históricas e também de um momento de representação nada saudável da figura feminina – temas e assuntos recorrentes nas marcas citadas até aqui. Elena Velez fala disso ao desconstruir e reconstruir a peça. Lazaro e Jack também. Tem a ver com estrutura e maleabilidade, constrição e liberdade.
Essas dualidades aparecem também no moodboard de Piotr Panszczyk, da Area. Quem acompanha o trabalho do estilista e de sua sócia Beckett Fogg sabe que a dupla é chegada a extravagâncias. Eles foram um dos principais responsáveis pelo boom das joias corporais cobertas por cristais e, agora, fazem isso de olho nas showgirls dos anos 1920, como Zizi Jeanmaire e Josephine Baker.
Vem daí as peças em forma de borboletas (já um hit da onda nostálgica da moda dos anos 2000) e também as plumas. Quer dizer, as interpretações dos acessórios de pena usados nos palcos de cabarés, óperas e também nos blocos, avenidas e bailes de Carnaval. A ideia é reconstruir looks de espetáculo com bordados e metais, num mix de leveza e estrutura, com técnicas de alta-costura.
PatBo, inverno 2022.Foto: Christy Barley
Quem também se rendeu aos brilhos dos cristais foi a brasileira Patricia Bonaldi. No segundo desfile da PatBo em Nova York, o foco é no trabalho manual que consagrou a estilista e, agora, ajuda na expansão internacional da marca. Porém, pode esquecer os bordados e rendas comum e limitantemente associados à moda mineira. As propostas desta estação chegam em sintonia total com as principais tendências internacionais, com modelos mais próximos ao corpo, mais casual e repletos de recortes ousados.
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