NYFW verão 2024: a estreia de Peter do na Helmut Lang
Ao assumir a direção criativa da Helmut Lang, o estilista Peter Do pretende traduzir os códigos essenciais da marca a preços menos elevados e para um público mais amplo. Saiba mais sobre um dos desfiles mais aguardados da NYFW verão 2024.
Dando início ao calendário oficial da NYFW verão 2024, o estilista Peter Do fez sua estreia como diretor de criação da Helmut Lang. Mas antes de continuarmos, vale uma voltinha no tempo.
Vamos lá: o designer austríaco Helmut Lang foi um dos criadores mais influentes da moda nos anos 1990. Num momento de redução de tudo, de menos é mais, ele foi um dos poucos que soube traduzir o minimalismo para além das roupas clássicas e básicas em preto e branco. Suas roupas de aparência simples e às vezes crua carregavam qualidades como sensualidade, sofisticação e beleza de maneira única. Não à toa, algumas de suas ideias e propostas seguem influentes até hoje, 30 anos depois.
Olhar para o trabalho de Helmut Lang é importante para entender a estreia de Peter Do. Na foto, desfile de 2000 quando o fundador ainda estava à frente da marca. Foto: Getty Images
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De volta à NYFW verão 2024, o vietnamita Peter Do é o mais novo encarregado por tentar dar vida nova (e relevância) à marca. Para isso, recorre a alguns pontos em comuns entre ele e o austríaco. Começando pelo fato dos dois serem estrangeiros em Nova York, cidade que exerceu e exerce forte influência em seus trabalhos.
Helmut Lang deu um chacoalhão no mercado de luxo quando decidiu usar os letreiros dos táxis amarelos como mídia para suas campanhas. Hoje, Peter Do transformou esses outdoors sobre rodas em estampas. Na trilha sonora, os avisos de cuidado e atenção do metrô nova iorquino reforçam o link com a metrópole, bem como o vaivém desorganizado das modelos, como se estivessem atravessando uma avenida.
Desse amor pela cidade vem também a colaboração com o poeta Ocean Vuong, que teve partes de seu livro Time is a Mother escritas na passarela, declamadas na trilha e estampadas nas peças da nova coleção. Lang também tinha uma relação especial com a palavra escrita, bem como com a arte – vide as parcerias com as artistas Jenny Holzer e Louise Bourgeois.
Quem conhece bem a história do designer austríaco deve ter reconhecido as interpretações e homenagens de Peter. Tem o tule rosa transparente da coleção de verão 2000, a regata branca com faixa preta transformada em cintão de couro do verão 1998, as faixas diagonais que lembram cintos de segurança, o balonê de saias que inflam os quadris, os blocos de cores, a alfaiataria afiada com proporções alteradas na exata medida, os básicos, a praticidade, a ideia de roupa de trabalho… Ixi, várias coisas.
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É que Peter Do é fã declarado de Helmut Lang. Em entrevistas, ele sempre cita o designer como uma de suas maiores inspirações. O que não quer dizer que o novo diretor criativo tenha se anulado nessa estreia. Afinal, tem muito da sua própria história costurada lá no meio.
A relação com os carros, por exemplo, não tem a ver apenas com locomoção urbana. Segundo o estilista, é uma referência a um dos lugares seguros e de proteção para pessoas queer na rua. Daí, a frase “ your car was my first room”, com suas mil interpretações.
Para além do viés criativo, umas missões do vietinamita é introduzir os códigos de Helmut Lang a um público maior e a preços competitivos (bem mais baixos do que os cobrados nos tempos áureos da grife). Em outras palavras, é fazer roupa para quem gosta de roupa, sem precisar custar os olhos da cara. Ah, e cativar uma clientela com opções saindo pelo ladrão.
A ideia tem apelo, engaja, porém não é nova. Desde 2006, a Helmut Lang pertence ao grupo de varejo estadunidense Fast Retailing (originalmente chamava Link Theory Holding, mas rolou uma fusão de empresas e o nome mudou). E antes de Do, a lista de criativos teve alta rotatividade – rolou até um esquema de designer convidado. A cada anúncio de novo profissional, vinha a mesma história escrita de maneira diferente: baixar os valores e ampliar o acesso à etiqueta. Nunca decolou.
Desta vez, porém, o match parece perfeito. Tem ainda a obsessão nostálgica das novas gerações e das redes sociais pelos anos 1990 e seus ícones. Rola uma certa sintonia com as propostas práticas e funcionais de luxo de Lang com o que (dizem) vende mais. Sem contar no hype em torno de um nome fresco e com muito potencial. Acontece que estamos em 2023, a quem dá as cartas não tá muito interessado em nada disso, muito menos em criatividade e valor histórico. Por isso, goste você ou não da versão pop e destilada da Helmut Lang, o que importa é saber se os cupidos que orquestraram essa união não mudarão de ideia e pedirão o desquite.
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