Gloriosa Glória Maria

Nossa repórter Ísis Vergilio relembra o dia em que entrevistou o nome mais icônico do telejornalismo na bancada do Roda Viva. 


glória maria com vestido azul e botas e a repórter isis vergilio, de vestido branco
Glória Maria e Ísis no Roda Viva, em março de 2022. Foto: Arquivo pessoal



Quando recebi o convite para compor a bancada do tradicional programa de entrevistas da TV Cultura, Roda Viva, e a entrevistada em questão era Glória Maria, não acreditei. Aceitei imediatamente, mas com a certeza de que estaria ao lado de uma pessoa a qual eu nem precisaria perguntar nada, só ouvir mesmo. Não pela falta de vontade de questioná-la sobre os mais de 160 países que conheceu ou sobre as celebridades e artistas que sonho em saber mais a respeito fora das câmeras – Madonna, Michael Jackson, Freddie Mercury, Mick Jagger e tantos outros. Mas por reconhecer que, frente a uma lenda, um ícone, alguém que viu todas as transformações do telejornalismo brasileiro, só nos cabe ouvir e admirar. 

Difícil escrever esse texto sobre Glória Maria. Na verdade, é desafiador escrever/falar sobre ela e sobre sua importância na comunicação, e o que ela representa para todos nós, neste momento, sem se emocionar. Glória ousou ser ela mesma em um país estruturalmente racista e machista, que fixa pessoas negras, especialmente mulheres, em lugares de subalternidade. Um país que se recusa a valorizar essas intelectualidades, onde, para se ter o mínimo de reconhecimento, é necessário ser excelente, excepcional e genial. E ela foi. Ela sabia o tamanho de sua grandeza e ousou ser. Glória Maria, para mim, é sinônimo de coragem e insubmissão.

Ela, que começou por baixo, na apuração, no corre, tornou-se imprescindível na televisão brasileira. Carioquíssima, com um sorriso envolvente e imenso, corajosa e humana. É inimaginável pensar na Glória Maria nos anos 70 sendo a única repórter negra da TV Brasileira. A primeira mulher brasileira a entrar ao vivo na televisão – não a primeira mulher negra, a primeira mulher. Ela reinventou a forma de se comunicar e transmitir a informação para o povo, humanizou o jornalismo. Ao contar e narrar as histórias, Glória nos proporcionava uma experiência que fazia com que nos sentíssemos parte dela, e isso era incrível. Choramos e rimos muito acompanhando sua jornada pelo mundo. Com o advento da internet e a popularização dos memes, nos divertimos também com os que surgiram anos após suas viagens inesquecíveis. 

Naquela noite no Roda Viva, há menos de um ano, falamos nos bastidores sobre como ela parecia fazer parte da nossa família. Esperávamos ansiosos para ver onde ela estaria e sobre qual lugar do mundo ela nos contaria uma história. Nas minhas memórias mais íntimas, ficam as brincadeiras que ela fez sobre nosso signo em comum (Leão) e os inúmeros comentários carinhosos para nós, que estávamos ali para sabatiná-la. Me recordo de ir ao banheiro da TV Cultura com a jornalista Claudia Lima e, lá, seguramos nossas mãos, nervosas e ansiosas para entrar “ao vivo” – experiência que nossa entrevistada tinha há décadas e, com certeza, tiraria de letra. Mas, humildemente, Glória disse: “Estou nervosíssima”. Na minha memória, ficam as histórias que ela contou e as tantas viagens que ela nos proporcionou, enquanto estávamos em família, assistindo suas reportagens sentados no sofá. 

Obrigada, Glória Maria, por tanto, mas, acima de tudo, por nos ensinar sobre coragem e humanidade com tanta ternura. Neste dia, Orum está em festa! 

Ísis Vergilio é repórter da ELLE.

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