Shoptime 2.0: de volta aos tempos de compras ao vivo

No lugar da televisão, entram os recursos das redes sociais acompanhados de influenciadores como "vendedores". Renner, Americanas, Facebook e TikTok são alguns dos que estão tentando abocanhar um mercado que já é bilionário na China: o live shopping.


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Por volta das 18h desta quarta-feira (8.7), a atriz e apresentadora Fernanda Paes Leme estava no meu celular me dando dicas de looks e de tendências. Ela fazia parte do primeiro live shopping no aplicativo das lojas Renner. Enquanto a artista falava, os mesmos produtos apareciam abaixo da tela do vídeo, disponíveis para a compra online. Eu poderia adquirir o visual dela com apenas um clique no meu celular.

Enquanto isso, às quintas-feiras, influenciadoras como Nah Cardoso e Bianca Andrade, a Boca Rosa, fazem reviews e demonstrações ao vivo de produtos do catálogo da Americanas no aplicativo da rede varejista. Gostou do iluminador que uma delas experimentou? Ele está, simultaneamente, disponível em um card logo abaixo do vídeo junto com os favoritos dos espectadores: promoções de frete grátis e cupons de desconto.

Americanas e Renner são apenas algumas das empresas a aderir ao live shopping. Muito semelhante às compras pela televisão, no estilo Shoptime ou Polishop, o recurso é apontado como próximo passo do e-commerce. A diferença é que em vez de ligar em um 0800 para adquirir uma poltrona vibratória ou uma panela de vidro, os consumidores podem fechar a compra pela internet.

Live + e-commerce = live shopping

Desde que a quarentena começou, você corre o risco de abrir o armário da cozinha e se deparar com uma live. “Elas vêm se destacando como um fenômeno que vai ao encontro do momento que estamos vivendo”, diz Maria Cristina Merçon, diretora de Marketing Corporativo da Lojas Renner. É realmente inegável o crescimento dos vídeos sendo transmitidos ao vivo neste período. O uso do recurso no Instagram cresceu 70% em março deste ano, quando parte do mundo aderiu ao isolamento social, em comparação ao mês anterior.

As pessoas estão entediadas em casa e com um cartão de crédito na mão, um bom momento para o e-commerce em geral. Ao juntar esses dois elementos, temos o live shopping. Em maio, o Facebook, que não é bobo nem nada, aproveitou para lançar um recurso chamado Lojas. Dentro das ferramentas, haverá a de compras ao vivo, que permitirá que comerciantes criem um catálogo cujos produtos serão, durante lives, mostrados na parte inferior do vídeo para que as pessoas possam clicar e efetuar a compra. O recurso ainda está sendo testado por algumas marcas parceiras.

Na China, o mercado de live shopping já vale por volta de 4,4 bilhões de dólares, e conta com mais de 450 milhões de espectadores

Na China, este tipo de ferramenta não é novidade, tanto que já representa uma fatia valiosa do mercado. Um relatório da consultoria Deloitte estimou que ele já vale por volta de 4,4 bilhões de dólares, com mais de 450 milhões de espectadores. O marketplace Taobao, do grupo Alibaba, tem um canal de livestream dedicado a esse tipo de transação, onde marcas e comerciantes podem fazer vendas ao vivo ou trabalhar com influenciadores para divulgar — e incentivar a compra — de seus produtos. O TikTok, aplicativo da startup DataByte que virou febre nessa quarentena, também tem um recurso semelhante na China — e que, de acordo com a assessoria de imprensa da plataforma, não há previsão de chegada ao Brasil.

Moda e beleza, o paraíso do live shopping

Enquanto a ferramenta do Facebook não está disponível para todo mundo, a Americanas, junto com a influenciadora Camila Coutinho, curadora de conteúdo da empresa, foi quem saiu na frente ao lançar, há duas semanas, as sessões de Live Review. “O objetivo é oferecer a nossos clientes uma nova e exclusiva forma de demonstração e experimentação de produtos, sob a curadoria de influenciadores que dominam aquele assunto”, diz Leonardo Rocha, head de marketing da plataforma digital da Americanas.

“Hoje é uma ferramenta nova, que está na mão de pouca gente e de poucas marcas, mas a tendência é que ela chegue na base, e que todas as pessoas possam também fazer essa influência na compra”, analisa Camila. “Será mais uma extensão de compra de pessoa para pessoa, como já se vê no mundo dos influenciadores, e de forma direta, porque você mostra na live como se usa o produto. É muito bom para o comprador, que está assistindo à live com uma pessoa que ele confia, aprendendo como usar o produto antes de comprar, e na facilidade de compra. [O live shopping] já é uma tendência muito forte fora do Brasil, principalmente na China e até me espanta a demora em chegar aqui”.

Especialistas dizem que uma das principais vantagens do live shopping é exatamente a possibilidade do público interagir com os “vendedores”. Fazer perguntas e obter respostas imediatas têm um efeito positivo nos possíveis consumidores. “Acompanhando os movimentos do mercado no exterior, visualizamos uma proposta que usa novas ferramentas digitais com curadoria de influenciadores, aumentando ainda mais o vínculo entre a marca e clientes. Consequentemente, também é um novo canal de vendas no ambiente digital com potencial de crescimento pela relevância de conteúdo”, afirma Merçon. “Ele traz proximidade com o público e engajamento, estimulado pelas sugestões e informações sobre os produtos compartilhados ao longo da apresentação, além das dicas e informações de moda, tendências e lifestyle.”

Essa forma de comprar pode ter bastante apelo com aficionados por produtos de beleza e moda, já que um levantamento da Hootsuite estima que, nos EUA, sejam gastos anualmente por volta de 400 bilhões de dólares em produtos de moda e beleza em lojas virtuais. É a categoria de e-commerce que mais vende, seguida por eletrônicos (360 bilhões de dólares ao ano) e comida e cuidados pessoais (140 bilhões ao ano).

Esse é um público que já está acostumado a comprar online, e influenciadores costumam ter um papel importante na decisão de compra dessas pessoas. Seria a fórmula do sucesso? Afinal, quem nunca viu um tutorial em vídeo, amou o efeito de uma sombra e foi logo buscar onde comprá-la? A dinâmica é parecida, mas sem a necessidade de abrir abas de navegador a mais.

No caso da Renner, o recurso ainda é um pouco confuso. A lista de produtos que seriam mostrada na live de Fernanda Paes Leme estava disponível na parte de baixo do vídeo, mas não atualizava ao longo da transmissão. Assim, caso eu me interessasse por um cardigã, teria que caçá-lo no catálogo. Apesar do modelo ainda não estar redondo, o apelo desse tipo de venda é muito claro. Se eu estivesse mais disposta (leia-se com limite no cartão de crédito), levaria o macaquinho de animal print que ela mostrou. Mas será que os brasileiros se tornarão adeptos ao Shoptime 2.0 tão facilmente assim como os chineses?

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