Baterista do Bikini Kill fala à ELLE sobre a volta do grupo

Longe dos palcos há mais de 20 anos, a banda expoente do movimento riot grrrl visita o Brasil pela primeira vez e faz seu segundo show em São Paulo.


O Bikini Kill em show
A vocalista do Bikini Kill, Kathleen Hannah Foto: Debi Del Grande/Divulgação



Os ingressos para a apresentação do Bikini Kill, um dos grupos fundamentais do punk feminista, se esgotaram em poucas horas após seu anúncio, em novembro passado. E um segundo show, que acontece nesta quinta-feira (14/3), foi logo confirmado.

Em sua volta ao Brasil, o trio formado por Kathleen Hanna, Kathi Wilcox e Tobi Vail, subiu ao palco pontualmente às 22h, no Audio Club (São Paulo), acompanhado da guitarrista Sara Landeau. Logo no início, o público entoou o lema “girls to the front” (meninas à frente), e a banda convidou os homens hétero e cisgênero a cederem seus lugares próximos ao palco para as mulheres. Os rapazes não eram os protagonistas daquela noite. “Todo mundo é bem-vindo ao show do Bikini Kill. Se você é um cara branco, pense em quanto espaço você ocupa nos lugares. O nosso feminismo é interseccional”, escreveu Tobi, 54 anos, em publicação no Instagram depois da apresentação.

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A banda, em sua primeira apresentação no Brasil Foto: Mila Maluhy

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O grupo se mantém relevante 30 anos após sua estreia na cidade de Olympia, capital de Washington (EUA). “Quando a gente começou a ir em shows punks, o cenário era completamente dominado por homens”, disse a baterista sobre a plateia feminina no primeiro show da banda em São Paulo. “É lindo ver vocês aqui hoje”, completou. Ao longo de 1h30 de apresentação, o grupo passeou pela discografia composta por dois discos, dois EPs, uma demo tape e uma porção de singles. Tocaram músicas como “Feels blind”, “Jigsaw youth”, “Double dare ya” e “Rebel girl”, enquanto se revezavam entre os instrumentos.

Bikini Kill e o movimento feminista riot grrrl

Expoente do movimento feminista que eclodiu na década de 1990, a banda se separou em 1997, mas voltou a fazer shows em 2019, encabeçando festivais como o Primavera Sound, em Barcelona. O alcance atual seria impensável há três décadas, quando despontaram no cenário alternativo e ajudaram a popularizar o movimento riot grrrl, ao lado de outras bandas estadunidenses formadas por mulheres, como Babes in Toyland, Bratmobile e Sleater Kinney.

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A baterista Tobi Vail Foto: Mila Maluhy

Inspiradas pela atuação de feministas, como a escritora Kathy Acker, o Bikini Kill usou o palco para levar os ensinamentos do meio acadêmico às ruas, ecoando, anos depois, um grupo restrito de mulheres que fazia parte da cena de rock dos anos 70, como as estadunidenses Patti Smith, Debbie Harry, Joan Jett, Suzi Quatro, e as britânicas Poly Styrene e Siouxsie Sioux.

A mistura de ativismo com a cultura punk do Bikini Kill marcou uma geração: para elas, era urgente discutir a liberdade sexual feminina, os direitos reprodutivos e o body positivity. A primeira demo tape do trio, Revolution girl style now (1991), trata da revolução proposta por garotas que desejavam repensar o papel das mulheres na sociedade patriarcal. Uma das estratégias adotadas foi a comunicação por zines. “Você pode escrever qualquer coisa em um pedaço de papel e enviar por correio. Ainda acho importante ter espaços que não são controlados por grandes corporações”, disse Tobi à ELLE antes da primeira apresentação do grupo em São Paulo.

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A vocalista Kathleen Hannah Foto: Mila Maluhy

No período longe da banda, elas mantiveram outros projetos musicais. Kathleen, no trio de punk dançante e eletrônico Le Tigre, que esteve em atividade entre 1998 e 2005, alcançando sucesso por canções como “Deceptation”, e posteriormente no projeto solo Julie Ruin. Tobi, no The Real Distractions, Morgan and the Organ Donors e gSp (Girl Sperm); e Kathi, no The Frumpies e The Casual Dots. Em maio, Kathleen lançará nos Estados Unidos a autobiografia Rebel girl: My life as a feminist.

Retorno

A reaproximação aconteceu em 2012, quando decidiram fundar a própria gravadora, a Bikini Kill Records, para retirar seus dois discos da antiga gravadora, Kill Rock Stars, e incluir a discografia completa nas plataformas de streaming. Já em 2017, dividiram o palco pela primeira vez em quase duas décadas a convite do The Raincoats e The Slits, ambas bandas de punk fundadas por mulheres em Londres, na década de 1970, e que influenciaram o trio. “Foi ali que tivemos a ideia de que poderíamos fazer mais shows e nos encontrar mais vezes”, lembra Tobi.

Trecho sobre o documentário de Kathleen Hannah :

“Como havíamos feito nosso último show em 1997, tivemos que reaprender todas as músicas dos dois discos, todos os singles e da demo tape. Foi bom estar na mesma sala com elas”, completou. “Nesses 20 anos, vi Kathleen em dois funerais, mantivemos contato por e-mail, mas tocar juntas é diferente, algo emocionante. ”

Foi na década passada que um novo grupo de artistas revisitou o que o Bikini Kill pregava, porém, desta vez, partindo de uma ótica interseccional, levando em consideração os cruzamentos entre gênero, raça e classe. Uma das críticas ao riot grrrl se deve ao fato do movimento ter sido difundido principalmente por mulheres brancas e cisgênero. Dessa nova leva, a baterista destaca a Linda Lindas, quarteto de Los Angeles, formado por adolescentes entre 13 e 19 anos. “Elas são o exemplo perfeito da nova geração inspirada pelo Bikini Kill.”

Bikini Kill: quinta-feira, 14 de março, às 22h (início do show), na Audio (Av. Francisco Matarazzo, 694, São Paulo, SP). Ingressos: de R$ 265 (meia-entrada solidária) a R$ 530.

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