Bloc Party volta ao Brasil para tocar Silent alarm
Banda inglesa revisita disco que marcou a cena de rock do início dos anos 2000.
O início deste século foi bastante fértil para o rock. Porque se no final dos anos 1990 os artistas que estimulavam as conversas e ditavam tendências estavam principalmente no hip hop, na eletrônica e no pop, a partir de 2000 as guitarras voltaram a soar relevantes.
Entre 2000 e 2005, o mundo viu nascer uma série de bandas que rejuvenesceram e redefiniram esteticamente e o rock: seja por meio de um tom retrô e barulhento, como nos casos de Strokes, White Stripes, Arctic Monkeys, Yeah Yeah Yeahs e The Hives, seja atualizando a energia dançante do pós-punk, como o feito por LCD Soundsystem, Interpol, Franz Ferdinand e The Rapture.
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Bloc Party em show no ano passado Foto: Matt Jelonek/Getty Images
Ao lembrarmos daquela época, uma banda que não pode escapar da memória é o quarteto londrino Bloc Party. Liderada pelo carismático vocalista (e principal compositor do grupo) Kele Okereke, a banda ajudou a revitalizar o rock com o lançamento do disco Silent alarm (2005), que trazia faixas que viraram hits nas pistas de dança, como “Banquet” e “Helicopter”.
A banda volta ao Brasil neste domingo (02.11), como uma das atrações de um evento que reúne ainda as bandas Weezer, Mogwai, Otoboke Beaver e a cantora espanhola Judeline, no parque Ibirapuera, em São Paulo.
E o show no Brasil será especial: o Bloc Party vai comemorar os 20 anos de Silent alarm, disco de estreia da banda, tocando todas as 13 faixas do disco. Kele Okereke conversou com a ELLE:
Como é revisitar esse álbum, duas décadas depois?
É interessante, tenho percebido, nos shows deste ano, que há muita gente da nossa idade, mas também muitos jovens, pessoas na casa dos 20 anos que provavelmente eram bebês quando o Silent alarm saiu. É meio mágico ver que a música ressoou por duas décadas e continua trazendo novos ouvintes. Durante boa parte da carreira, sentimos que estávamos sempre lutando, tentando alcançar algo. Agora há essa sensação de que o que fizemos tem vida própria, as pessoas descobrem nossa música, se conectam com ela, e isso me dá uma sensação ótima, de que toda aquela luta valeu a pena.
Quais momentos da gravação ou da turnê do álbum foram mais marcantes para a banda?
Lembro de uma grande discussão que tivemos com (o produtor do disco) Paul Epworth, por causa de “Helicopter”. Ele queria simplificar a música para que ela tivesse mais chance de tocar bastante nas rádios. Mas nós recusamos. Estávamos orgulhosos do arranjo. Foi um momento decisivo, porque tínhamos de escolher entre fazer o que alguém achava melhor para a banda ou seguir o nosso instinto. Escolhemos o nosso caminho, e no fim fomos recompensados. “Helicopter” se tornou um dos nossos maiores sucessos. Isso nos deu clareza sobre quem éramos e o que queríamos fazer como banda.
Como você acha que os ouvintes mais jovens vão encarar as músicas de Silent alarm?
Sinceramente, não sei. Nunca saberei o que as pessoas sentem ao ouvir a nossa música, porque só posso escutá-la com os ouvidos de quem a escreveu. Mas acho que há uma energia, uma urgência ali. Queríamos tocar com intensidade, com paixão, e acho que isso transparece nas músicas. Quando fizemos o disco, o objetivo era não ser entediante ou parecer que éramos pessoas muito seguras de nós mesmas. Colocamos a vida naquele disco. Talvez as pessoas sintam isso ao ouvi-lo.
Sua relação com músicas como “Banquet” e “Helicopter” mudou ao longo do tempo? Você já se cansou delas?
Não, nunca. Ainda toco essas músicas em todos os shows e continuo sentindo algo quando canto. Isso mostra que são boas canções, mesmo depois de 20 anos, elas ainda me comovem. As faixas de Silent alarm têm essa urgência, essa intensidade, e tocar com essa energia é algo empolgante. Neste ano, fazendo esses shows, percebi o quanto esse disco ainda transporta as pessoas para um lugar especial. E é por causa da energia que colocamos nele: na voz, na bateria, nas guitarras. É um prazer tocar essas músicas, e também revisitar faixas que não tocávamos há anos, como “The pioneers”, “Blue light” e “Positive tension”.
Na época do Silent alarm, havia muitas bandas surgindo na cena indie, como LCD Soundsystem, Franz Ferdinand, Yeah Yeah Yeahs. Como você vê aquele período? Havia mais coisas boas ou ruins?
Acho que não sou a melhor pessoa para responder (risos). Embora fôssemos vistos como parte de uma cena, não parecia assim na época. A imprensa falava da “cena pós-punk de Londres”, mas nós não conhecíamos as outras bandas – e nem queríamos. Sempre estivemos focados em construir o nosso próprio caminho. Então, mesmo que a história nos coloque ao lado de outras bandas daquele período, na prática nunca nos sentimos parte de um grupo.
“Colocamos a vida naquele disco” Kele Okereke
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Muitas das suas músicas abordam temas como política, identidade e vida urbana. Quais assuntos você sente que, hoje, são mais urgentes para tratar na música?
Acabamos de finalizar o novo disco, que será lançado no ano que vem, e ele é muito pessoal, fala sobre um relacionamento que tive, do começo ao fim. É totalmente autobiográfico, o que nunca tinha feito antes. No passado, escrevia sobre outras coisas, mas percebi que precisava colocar tudo o que estava sentindo em algo concreto. Foi estranho, porque é um tipo de escrita que jamais teria feito, mas justamente por isso senti que era necessário agora. Acho que as músicas sempre nascem de uma necessidade de expressar algo. Neste momento, precisava falar sobre essa relação.
O seu jeito de compor mudou muito com os anos?
Acho que sim. Cada disco é diferente do anterior. Além do Bloc Party, tenho feito músicas solo, então minha forma de compor evoluiu. Antes tínhamos regras muito rígidas sobre o que a banda podia ou não fazer, mas isso foi mudando com o tempo. Crescer é isso: evoluir e se transformar.
O mais recente lançamento de vocês, o EP High life traz “Blue”, música que lembra Talking Heads, algo que não se esperaria do Bloc Party. Quais são as inspirações para criar música?
Engraçado você perguntar, porque esse EP foi feito há cerca de um ano, então já sinto um certo distanciamento, porque desde então estivemos focados em um novo disco. O High life foi feito enquanto estávamos em turnê com o Paramore, no Reino Unido e nos EUA, e “Blue” era uma das nossas preferidas na época. É sobre se apaixonar por alguém, e ela acabou virando o ponto de partida para o nosso próximo álbum. Agora ela faz parte de uma história maior, de um disco inteiro. Então é curioso: o EP ficou no passado, mas “Blue” continua viva de outra forma.
Pode compartilhar algum detalhe sobre o próximo disco?
Acabamos de finalizá-lo, e trabalhamos com o produtor Trevor Horn, que é uma lenda aqui no Reino Unido (ele já trabalhou com nomes como Grace Jones e Pet Shop Boys). Foi um prazer enorme. O disco conta uma história, aquela que começa com a música “Blue”, do EP High life. Há dois anos, me apaixonei por alguém e escrevi essa canção, como disse anteriormente. Depois descobri que essa pessoa não estava sendo honesta, e o relacionamento acabou. Para continuar cantando “Blue” nos shows, percebi que precisava dar contexto àquela história. Então escrevi todo o disco como uma narrativa, do início ao fim, desse relacionamento. Tudo é real, tudo aconteceu. É a primeira vez que escrevo algo totalmente autobiográfico, e é um trabalho bastante explícito, o que vai surpreender algumas pessoas.
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