Documentário mostra várias facetas de Fernanda Young

Filme dirigido por Susanna Lira mostra a frustração da roteirista por não ser reconhecida como escritora e sua busca pela perfeição.


Fernanda Young, que ganha documentário
Foto: Acervo pessoal Fernanda Young



Muito antes de dirigir o documentário Fernanda Young: Foge-me ao controle, que estreia nesta quinta-feira (29.08) nos cinemas, Susanna Lira acompanhava a escritora, roteirista e apresentadora à distância. Mais precisamente, desde o colégio – as duas fizeram o mesmo curso técnico no ensino médio, mas não chegaram a ser amigas. Alguns anos depois, Fernanda Young (1970-2019) lançou seu primeiro livro, Vergonha dos pés (1996). “Ela estava falando a língua da nossa geração”, disse a diretora em entrevista à ELLE. 

As duas se conheceram de verdade quando Susanna participou de um projeto do canal GNT sobre maternidade, com Fernanda dando um depoimento honesto sobre esse acontecimento tantas vezes romantizado na vida das mulheres. “Virei fã dela acompanhando seu trabalho”, disse a diretora.

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Em 2021, dois anos após a morte de Fernanda, surgiu a ideia do documentário. “O começo foi muito difícil para todo o mundo, porque a família estava bastante sensibilizada, a ausência dela era muito forte.” Susanna agradece a Alexandre Machado, viúvo de Fernanda. “O filme aconteceu graças a ele, que foi segurando a minha mão e me conduzindo para eu conseguir realizá-lo e chegar ao formato que usamos. No fim, Alexandre me disse: ‘Esse filme teria sido dirigido por ela’, o que foi o maior elogio possível.”

Em vez de fazer várias entrevistas, como era a ideia original, Susanna acabou usando a voz da própria Fernanda em entrevistas, além de imagens de arquivo e pessoais, mescladas a fragmentos de filmes antigos de cineastas incompreendidos em seu tempo, como o polonês Dziga Vertov (1896-1954), reproduzindo a personalidade complexa e o pensamento de sua retratada. A seguir, conheça mais das facetas de Fernanda retratadas pelo documentário:

CREDITO Gigi Kassis 1

Foto: Acervo pessoal Fernanda Young

A escritora

O documentário é perpassado por uma certa frustração de Fernanda com a falta de reconhecimento por aquela atividade que considerava essencial ao seu ser, desde antes mesmo de saber escrever. A escritora chegou a dizer que superou a dislexia para se tornar escritora. “Sou mulher. Não pareço uma intelectual. Não reverencio os coronéis da cultura. Comecei a fazer sucesso em todas as outras coisas que fiz, e isso magoa muito as pessoas da literatura.”

“Antes de ser alfabetizada, eu sabia que era escritora.” Fernanda Young

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A corajosa

Em seus livros, roteiros, entrevistas e no programa Saia justa, que participou entre 2002-04, Fernanda despiu-se para o público, falando de maneira honesta sobre maternidade, amor, feminismo e violência sexual. Essa coragem de dizer o que pensava, algo mais incomum anos atrás, gerou antipatias.

“Muita gente me disse que não ia assistir ao filme porque não gostava dela”, disse Susanna. “Ela deixou esse legado de provocar o pensamento. Era independente, falava o que queria, e essa liberdade era assustadora para a maioria dos homens”, completou a diretora.

“Coragem não exclui o medo. Você só é destemido se estiver medicado ou for louco de pedra.” FY 

CREDITO Gigi Kassis 1

Foto: Gigi Kassis

A noiva

O filme também mostra como o visual da escritora e apresentadora refletia suas transformações e humores, mas também uma preocupação com a opinião dos outros. Frequentemente, ela era filmada ou fotografada vestida de noiva, que representa justamente essa ideia de perfeição.

Os cabelos são o maior exemplo de suas metamorfoses e foi usado raspado, longuíssimo, curto, loiro, preto, ruivo. “Raspei a cabeça por 11 anos por pura punição. Não admitia o feminino, não queria parecer delicada diante do mundo porque achava que ele ia me machucar”, disse Fernanda. 

Para Susanna, ela controlava sua imagem. “Isso também era uma busca por reconhecimento e pela perfeição.” O último texto no filme fala da morte como alívio para essa busca. “É uma reflexão para todas nós, mulheres. Fernanda não foi diferente da gente. Era uma grande artista e intelectual, mas também caía nessa armadilha. A morte não pode ser o único momento de paz das mulheres. Temos de encontrar na nossa existência um momento em que sejamos nós mesmas, nos aceitemos mesmo sem estar nos padrões. Tem uma frase dela que gosto muito: ‘Eu aceito não ser querida’. Porque nós crescemos para sermos agradáveis, bonitas, magras, bem-produzidas.”

“A noiva é a forma como a gente se constrói para o olhar do outro. A noiva é o símbolo máximo da ideia de perfeição.” FY

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