Grupo Corpo comemora 50 anos com Piracema

Inspirado em fluxo dos peixes, espetáculo estreia em São Paulo com ingressos esgotados e segue para BH e Rio de Janeiro.


Piracema, novo espetáculo do Grupo Corpo
Cena de Piracema Foto: Jose Luis Pederneiras



O Grupo Corpo chega aos 50 anos com Piracema, espetáculo que estreia nesta quarta-feira (13.08), em São Paulo, com ingressos já esgotados. Mas, para conceber a coreografia, os irmãos Rodrigo e Paulo Pederneiras, coreógrafo e diretor artístico, respectivamente, pouco se ativeram para a importância da data. “Essa é uma demanda que vem de fora, mas, da nossa parte, em cada novo espetáculo é como se a nossa vida estivesse em jogo porque a angústia e os riscos são iguais”, diz Paulo à ELLE. 

Na primeira participação de Cassi Abranches como coreógrafa residente do grupo, a provocação de Paulo foi para que ela e Rodrigo desenvolvessem coreografias separadamente e sem que um pudesse sequer espiar o processo do outro. Com os bailarinos da companhia divididos em dois, cada um ficou responsável por um grupo e, somente ao fim, após um assistir à peça do outro, é que os coreógrafos começaram a desenvolver um trabalho conjunto. “Foi um modelo completamente inédito. Embora existam muitas parcerias coreográficas, a gente não tem conhecimento de ninguém que tenha realizado uma maluquice como essa”, diz Cassi.

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Em sua proposição, Paulo até lançou um “se não der, não deu”. E, durante quase todo o processo, Rodrigo e Cassi realmente acharam que não iria funcionar, chegando, inclusive, a cogitar uma apresentação que preservasse as duas criações. “Ia dar menos dor de cabeça, seria mais fácil, mais tranquilo”, pondera Rodrigo.

A proposta de trabalho só não foi tão inusitada porque Cassi foi bailarina do Grupo Corpo por mais de uma década e já assinou, inclusive, a coreografia de Suíte Branca, peça de 2015 com trilha sonora de Samuel Rosa. Mas, mesmo que ela tivesse a impressão de conhecer o percurso de Rodrigo, a surpresa no momento em que um viu a criação do outro foi enorme. Enquanto os gestos dele eram mais fechados, “para dentro”, os movimentos dela foram pensados de forma mais ampla – uma diferença que, segundo eles, acabou sendo complementar.

O mote da piracema, com a imagem dos peixes nadando contra a correnteza e que, segundo a dupla, representa também a história do grupo mineiro, acabou surgindo no decorrer do processo. “Nós dois tomamos os nossos caminhos de ideias particulares, mas, quando começamos a entender o volume de coreografia, de movimento, de cena, entendemos que a piracema é essa quantidade de peixes nadando contra a correnteza para chegar em algum lugar”, resume Rodrigo.

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O coreógrafo, que vem anunciando seu processo de afastamento da companhia, também vê no fenômeno natural dos cardumes o futuro do próprio Corpo, reafirmando a entrada de Cassi como o recomeço dessa história, alguém que “chega junto” enquanto ele “devagarzinho” sai. A estreia em São Paulo, ao que tudo indica, seria sua última viagem para acompanhar o grupo. “Já queria abrir espaço para essa moça há muito tempo. Tenho 70 anos e não dou muito mais caldo”, diz.

Em Piracema, no entanto, Rodrigo topou não só um modelo de criação pouco ortodoxo, como se viu desafiado pela trilha sonora da compositora Clarice Assad, que foi pensada a partir de três rupturas, sobrepondo momentos tribais, clássicos e eletrônicos. “De início, foi um susto, e tivemos que encontrar uma nova forma de criar, algo que não seguisse uma linha única pela música. Brinco que são três balés com dois coreográfos”, lembra. 

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Cena de Piracema Foto: Jose Luis Pederneiras

O cenário, por sua vez, aprofunda ainda mais o conceito do espetáculo, envolvendo todo o palco com mais de 82 mil tampas de latas de sardinha que remetem à textura de escamas. Uma ideia que, pela complexidade, por pouco não foi descartada por Paulo. Foi somente após muitos estudos, com cálculos sobre o peso de cada uma das tampas, que o projeto se mostrou viável. Envolveu, ao todo, três turnos de produção com equipes de cerca de 25 a 30 pessoas ao longo de dez dias. 

Piracema será apresentado ao lado de Parabelo, espetáculo de 1997 com trilha de Tom Zé e Zé Miguel Wisnik. É uma escolha, desta vez, totalmente conectada com a comemoração dos 50 anos da companhia. “Essa é uma obra que nos representa”, diz Paulo. “Em Parabelo, havia uma busca minha de achar uma dança que fosse brasileira e acho que isso fez a marca no Grupo Corpo”, completa Rodrigo. Para o coreógrafo, a pesquisa por uma coreografia que fosse identificável regionalmente foi uma constante durante muito tempo. Algo que mudou em Piracema. “Nesse espetáculo, não há esse lado do Brasil, mas uma abertura muito maior”, explica. “Não sei dizer se existiu aqui uma busca, a única coisa que eu pensava era: será que vamos encarar essa?”

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Piracema: de 13 a 24.08, no Teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo. Ingressos esgotados.
                 de 27 a 31.08, no Palácio das Artes, em Belo Horizonte
                 de 18 a 21.09, no Rio de Janeiro
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