Por que o ano de 1997 foi importante para a moda?

Morte de Gianni Versace, estreias de Galliano na Dior, de Gaultier na alta-costura e de Stella McCartney na Chloé estão entre os 38 motivos exibidos em exposição no Palais Galliera, em Paris.


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© Michael Thompson/Courtesy of Jean Paul Gaultier



Quem gosta de moda, geralmente tem na cabeça pelo menos duas ou três datas (ainda que aproximadas) que considera icônicas na história do métier. Digamos, 1947 e o lançamento do New Look da Dior; os anos 20 e a simplificação elegante do guarda-roupa feminino por Coco Chanel; e 1966, quando Yves Saint Laurent criou sua versão do smoking para mulheres.

No início de março, o museu parisiense de moda Palais Galliera inaugurou uma exposição inteira dedicada a um único ano que, segundo a mostra aponta, se revela decisivo para chegarmos onde estamos hoje, mas que não vem imediatamente à memória quando se pensa em momentos históricos da moda. Intitulada 1997 Fashion Big Bang, a exposição, como o nome indica, dá um caráter revolucionário à data, considerada de um lado a consagração do estilo da década de 1990, e do outro, uma prévia do que viria a ser a moda no século 21. Como prova do seu argumento, o curador da exposição, Alexandre Samson, escolheu 38 dos 50 eventos marcantes para a moda naquele ano.

Entram nesse pacote o renascimento do prestígio da alta-costura, que vivia até então uma fase de decadência, a estreia de jovens estilistas que se tornariam futuras estrelas fashion internacionais em grandes maisons, as mortes de dois grandes ícones mundiais de estilo, e o nascimento do conceito de it-bag.

A seguir, a seleção de ELLE de oito dos acontecimentos fashionistas mais marcantes de 1997 presentes na exposição, em cartaz em Paris até 16 de julho. Para entrar no clima da década, uma playlist composta especialmente para a mostra por Michel Gaubert, responsável há décadas pela trilha sonora de alguns dos principais desfiles da fashion week de Paris, está disponível no Spotify e Deezer.

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Looks de Galliano para a Dior, em seu desfile de estreia © Courtesy of Peter Lindbergh Foundation

Estreia de John Galliano na Dior
A fase de criatividade excêntrica barroca responsável por muitos dos melhores momentos da história da Dior teve seu início em janeiro de 1997, quando Galliano fez sua estreia na maison francesa no desfile de alta-costura da grife. O estilista britânico, que desde 1984 tinha sua marca própria, assinaria a direção criativa da Dior pelos 14 anos seguintes com desfiles memoráveis, cheios de referências etnográficas e históricas, até ser afastado da maison em 2011, após ser filmado num bar em Paris numa briga em que ofende uma mulher com insultos antissemitas. Para assumir a Dior, no fim dos anos 90, Galliano deixou a direção criativa da Givenchy, onde foi substituído por um então novato, Alexander McQueen, que fez sua estreia na grife na mesma temporada de alta-costura. Nessa dança das cadeiras da moda, vale lembrar que Galliano substituiu Gianfranco Ferré, que anunciou sua aposentadoria da Dior um ano antes.

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Desfile da Versace em 1997 ©Courtesy of Versace

Morte de Gianni Versace
Assassinado por um serial killer na porta de sua mansão em Miami, Gianni Versace foi o responsável pela construção de um império fashion entre os anos 1980 e 1990, depois assumido e reinventado (não sem momentos de altos e baixos) por sua irmã, Donatella. Ícone do estilo extravagante, superlativo e sensual de uma época, sua combinação de supermodelos (era a época de Linda Evangelista, Naomi Campbell, Cindy Crawford, entre outras), superlogos e roupas supercoloridas inspirou muitos e muitas na indústria. Pouco mais de um mês depois de sua morte, a princesa Diana, ícone internacional de estilo e uma das grandes clientes de Versace, também morreria em um evento trágico. A morte de ambos foi noticiada na primeira página de jornais no mundo inteiro.

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O clero do papa João Paulo II vestido pelo estilista francês Jean Charles de Castelbajac ©Antonio Ribeiro/GAMMA RAPHO7

O papa na moda – e sem montagem
Mais de 20 anos antes da imagem do papa Francisco – feita a partir de uma montagem utilizando inteligência artificial – vestido com um casaco puffer branco fashionista viralizar nas redes, outro papa foi realmente vestido pelo, com o perdão do trocadilho, “alto clero” da moda internacional. Em agosto de 1997, o estilista francês Jean-Charles de Castelbajac (famoso por seu prêt-à-porter lúdico e colorido) veste o Papa João Paulo II e o clero durante as Jornadas Mundiais da Juventude em Paris.

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A estreia de Gaultier na alta-costura © Michael Thompson/Courtesy of Jean Paul Gaultier

Revival da alta-costura
Nos anos 1990, Gaultier já era famoso, já tinha o apelido de enfant terrible da moda, mas ainda não tinha se aventurado na alta-costura, um sonho de sua infância, quando o setor contava com 200 marcas. Em 1996, haviam sobrado apenas 15, num sinal de franca decadência do prestígio do que há de mais luxuoso e exclusivo na criação de moda. Tudo muda na Primavera/Verão de 1997, quando, além da estreia de Galliano na Dior, Gaultier desfila sua primeira coleção haute couture. Ao mesmo tempo, Thierry Mugler apresenta a coleção Les Insectes, uma das mais emblemáticas de sua carreira.

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Capa do disco Homogenic, com look de McQueen © Nick Knight/Courtesy of Björk

Björk por Alexander McQueen
Em setembro, McQueen veste Björk para a capa de seu álbum Homogenic, fotografada por Nick Knight. O vestido inspirado em um quimono japonês, o colar semelhante aos usados ​​pelas culturas Ndebele (África do Sul) e birmanesa, além de um penteado esculpido que lembra os dos nativos americanos tribos Hopi e Tewa ecoam o multiculturalismo tanto do estilo de McQueen quanto de sua coleção Eclect Dissect, que o estilista assinou para a Givenchy e desfilou na semana de alta-costura dois meses antes. Nela, ele mistura referências ao século 19, figurinos e acessórios de culturas dos cinco continentes. Mas, principalmente, a capa do disco se inspira, a pedido da própria Björk, em outra imagem icônica da moda, criada por McQueen e Nick Knight para a vigésima edição da revista Visionaire, cuja editora convidada era Rei Kawakubo. A foto traz a modelo Devon Aoki como uma heroína de mangá, com um olho de vidro e um grande alfinete na testa, usando um vestido com referência japonesa de McQueen.

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Look da coleção Body Meets Dress, Dress Meets Body, da Comme des Garçons ©TimothyGreenfield Sanders

Coleção Comme des Garçons
Se nos anos 1980 Rei Kawakubo questionou os preceitos da moda ocidental, nos anos 1990 ela discute os padrões de beleza feminina que se repetem desde a Antiguidade. Intitulada Body Meets Dress, Dress Meets Body, a coleção do Verão 1997 da Comme des Garçons intriga, espanta, causa mal-estar em alguns e provoca todos ao redesenhar a silhueta feminina por meio de protuberâncias criadas em vestidos justos, confundindo o que é a forma da roupa e do corpo. Dessa maneira, Rei Kawakubo quer refletir sobre a noção de corpo ideal, um conceito também presente no desfile de Margiela apresentado na mesma temporada, em que ele explora novas silhuetas a partir da tradição clássica do drapeado, uma técnica milenar presente tanto no Egito quanto na Grécia Antiga. (As coleções foram desfiladas em 1996, mas aparecem na mostra na seção da temporada para o Verão 1997, considerando que foi nesse ano que elas chegaram às lojas e foram usadas.)

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O nascimento da it-bag

Carry Bradshaw, de Sex and the City (cujo piloto também foi filmado em 1997) não é a única a amar a Fendi Baguette. O modelo inspirado no pão, com alcinha curta para ser usado embaixo do braço (como uma baguete francesa…) é considerado a mãe das it-bags, fenômeno que se espalhou a partir do lançamento da bolsa, em 1997, e se transformou numa grande fonte de renda das marcas de luxo.

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Stella McCartney na Chloé e os novos grandes estilistas
Pioneira da moda de luxo consciente e mais sustentável, Stella McCartney faz sua estreia na Chloé e exemplifica bem a onda de jovens estilistas nomeados para a direção de grandes marcas francesas em 1997, antecipando o fenômeno da globalização na criação de moda. Entre todos os nomes indicados para as maisons (McCartney, Galliano na Dior, Alexander McQueen na Givenchy e Hedi Slimane, que estreia à frente da linha masculina da Yves Saint Laurent), apenas um é francês: Nicolas Guesquière, que faz seu primeiro desfile como diretor criativo da Balenciaga, cargo que ocupou até 2012, quando saiu e assumiu a Louis Vuitton (onde está até hoje). Na LV de 1997, a estreia na direção criativa foi de Marc Jacobs. O estilista cria, pela primeira vez, uma coleção de prêt-à-porter para a grife, que até então só vendia bolsas, malas e acessórios, renovando a imagem da maison.

 

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