Xuxa viaja no tempo em ensaio e entrevista para ELLE
Às vésperas de finalizar o documentário sobre sua vida, Xuxa falou a ELLE e relembrou seus tempos de modelo em um editorial de moda. Confira alguns trechos da entrevista publicada no Volume 07, em março de 2022.
Xuxa Meneghel anda fazendo viagens pelo tempo. Estimulada por certa introspecção que veio com a pandemia, começou a olhar muito para trás. Em 2020, publicou o livro Memórias – Xuxa Meneghel (Globo Livros), em que escolheu 59 tópicos para passar a sua vida em revista – uma narrativa que fez rasantes por temas dramáticos, como os episódios de assédio sexual que enfrentou na infância, e por histórias hilárias, como as que viveu juntamente com a amiga Luiza Brunet.
Na paralela, começou a alinhavar a produção de um filme de ficção, chamado Rainha, inspirado em lances de sua vida. E, por fim, está finalizando o que talvez seja o projeto autobiográfico mais imersivo, uma série documental que acabou colocando a estrela cara a cara com vultos do seu passado, como o ator Marcelo Ribeiro, que, aos 12 anos, contracenou com ela no filme Amor, estranho amor, em uma cena erótica que rendeu décadas de polêmica.
Ou como sua ex-empresária e diretora de seus programas, Marlene Mattos, com quem rompeu há 19 anos. A foto do reencontro entre as duas eletrizou as redes sociais e, claro, disseminou uma onda de curiosidade sobre o doc, produzido pela Globoplay, em parceria com a Endemol.
Três semanas antes de completar 59 anos, Xuxa, consagrada na era das apresentadoras infantis, conversou com ELLE e explicou por que entrou nessa jornada pelo seu passado. Mas também olhou para a frente. Com um pragmatismo que não deixa de ser surpreendente para uma artista que lida com a imagem desde os 16 anos, falou de seu processo de envelhecimento sem dourar a pílula. Ainda assim, mostrou que continua queimando muita lenha na grande usina do entretenimento.
Depois do pacotão sobre o passado, Xuxa ainda cairá em alto-mar para comemorar seus 60 anos em um navio temático, no ano que vem. Em seguida, a ex-rainha dos canais abertos embarca em apostas no streaming.
Vai pegar a estrada, nas gravações do reality Caravana das drags, que vai coapresentar na Amazon. E depois começa a gravar para a Disney+. “Vão ser cinco episódios e estou muito feliz porque vou realizar o sonho antigo de trabalhar com a Angélica. Sempre quis muito fazer algo com ela”, diz.
Xuxa na capa do Volume 07 da ELLE. Foto: Gleeson Paulino
Como estão os preparativos para o aniversário de 60 anos? Vai ter festa?
Olha, festa de aniversário é uma coisa que me dá assim um pouco de ugh… Não gosto, não. Acho muito chato. E não tem um dia em que não me pedem para gravar uma mensagem de parabéns para alguém, cantando a musiquinha: “Hoje vai ter uma festa, bolo e guaraná, muito doce pra você”. É isso uma ou duas vezes, diariamente! (risos) E cansei mesmo porque, durante 14 anos, a Marlene me fazia ter festas de aniversário durante três dias, sempre nos dias 26, 27 e 28 de março. Acho que já comemorei demais. Mas na verdade eu iria fechar esse ciclo este ano, completando 59 anos no Navio da Xuxa, em alto-mar, com shows de Lulu Santos, Claudia Leitte, Ludmilla e Pabllo Vittar, além do meu. Iam ser três dias de festa, de novo. Mas por causa da pandemia a viagem foi adiada para o ano que vem. Tudo bem, não foi aos 59 anos, então vai ser aos 60. Aí, aos 61, vou querer no máximo um bolinho vegano bem pequenininho.
Xuxa e o envelhecimento
Você escreveu seu livro de memórias com 57 anos e dedicou um capítulo para falar do seu envelhecimento. Você se sente velha?
Não estou me achando. Eu sei que estou velha. Ano que vem vou fazer 60 anos e uma mulher dessa idade é uma senhora, não é uma novinha. Óbvio, não é a mesma mulher da época da minha mãe ou da minha avó. Mas, convenhamos, as células morrem, a sua pele é a da sua idade. Quando posso fazer tratamentos que não são tão abrasivos, faço, mas sou completamente contra esses procedimentos que as pessoas fazem, e exagerando. Preenchem daqui, botam botox dali. Pelo fato de eu lidar com a imagem desde os 16 anos, olho no espelho e vejo que as coisas não são mais como eram. Não é preciso que me falem.
Mas você costuma refletir sobre o envelhecimento?
Na verdade, existe uma cobrança do meu público que é muito maior do que a minha. Sempre foi muito difícil ver quem você gosta envelhecendo, sabe? Quando eu tinha 20 anos, cansei de comentar sobre alguns artistas: “Caraca, olha como envelheceu!” E hoje eu que estou no momento de ouvir: “Caraca, a Xuxa tá velha!” Acho isso normal, natural. Só acho um pouco errado quando as pessoas cobram certa atitude minha. Coisas do gênero: “Por que, com o dinheiro que ela tem, não faz plástica, usa botox ou faz preenchimento?” Ué, porque não quero! Andei falando para todo mundo que ia fazer depois dos 60 anos. Eles estão chegando e ainda não estou com vontade. Pode ser que com 70 eu faça, mas não porque as pessoas querem. Eu acho que o fato de ter ficado com o Junno já na casa dos 50 anos, e ele ter me aceitado do jeito que eu sou, de chegar pra mim e dizer “cara, você tá linda, tá gostosa assim”, me deu um up. Porque aí sinto que, uau, não estou assim tão ruim. (risos) Entendo que não deve ser fácil para as pessoas verem alguém que começou na televisão com 20 anos ir chegando aos 60. Mas eu mudei mesmo. Imagina se estivesse usando chuquinha até hoje. Eu não vou fazer isso, de jeito nenhum.
Quem são as pessoas que falam a verdade, que dão uma situada quando acham que você precisa?
Ah, eu acho que eu tenho algumas pessoas. O Junno em alguns momentos, a minha filha em outros, algumas pessoas que trabalham comigo. E uma pessoa que fazia muito isso comigo era a Maria (Maria do Rosário, funcionária que trabalhou e morou por 30 anos com Xuxa e morreu no ano passado). Agora, que estou mais gordinha, me olho no espelho e falo: nossa, se a minha mãe (dona Alda, que morreu em 2018) estivesse aqui, ia dizer: “Você engordou um pouquinho, mas tá linda, tá?”
Você está finalizando um documentário sobre a sua vida. O que a levou a entrar nesse processo de olhar para trás?
Isso tudo veio com a pandemia, uma coisa que me fez mergulhar em mim. Eu estava mudando de casa, comecei a mexer nas minhas fotos, a separar registros de família. Aí pensei: cara, isso daí pode dar um registro legal, vai que eu começo a escrever. Eu tinha lido um livro de memórias da Brigitte Bardot (Lágrimas de combate, Globo Livros). Fiquei apaixonada, porque ela usa tópicos para falar da vida dela. Tenho certeza de que tenho muita coisa ainda para viver, não dá para escrever uma autobiografia, mas pensei que nesse formato de memórias seria bacana. Depois desse livro, me procuraram perguntando se eu queria fazer o documentário. A princípio ia ser uma coisa intercalada com shows e música. Depois, quando o Pedro Bial entrou para dirigir, virou outra coisa, mais interessante, com a ideia de mexer na minha vida e mostrar todos os meus aspectos. Não vai ser um documentário para me enaltecer. Eles vão mesmo fazer um apanhado de tudo o que aconteceu. Mas estou relaxada, tranquila. E sei que vou ser bem tratada pelo Pedro, que eu amo de paixão e é um cavalheiro. Além disso, eu já estava envolvida no projeto do filme Rainha, que é uma ficção, mas inspirada na minha vida. Já estamos procurando uma atriz para fazer. Eu ficava horas conversando com duas roteiristas, lembrando coisas do passado. Como é muita coisa junta, até pensei: será que as pessoas vão querer ficar vendo tudo? Mas aí vi que são abordagens completamente diferentes.
E qual tem sido o efeito dessa viagem no tempo em você?|
A experiência toda está dando uma mexida muito importante em mim. O livro com as minhas memórias traz as coisas que eu quis mostrar. O documentário, com certeza, traz outras, nas quais eu não mexeria por conta própria. Não sei se eu iria querer remexer em certos assuntos, ou ouvir comentários sobre eles, ou falar com certas pessoas. Eu, sozinha, não tomaria a iniciativa de procurar um ou outro que vão aparecer ali. Mas acho que muita gente vai querer saber disso tudo. E acabaram vindo coisas incríveis. A conversa com o Marcelo Ribeiro, por exemplo, foi surpreendente, porque ele falou detalhes do lado dele que eu não sabia, como a de que ele queria muito fazer o filme. Também tem ali depoimentos de pessoas que me ensinaram muito. A nossa penúltima entrevista, por exemplo, foi com o Boni. Foi incrível, um negócio assim… Nossa! Aquele cara com uma cabeça excepcional – e aquela pessoa que foi abrindo espaço para o meu programa na Globo, primeiro das 8 às 10, depois das 8 ao meio-dia, aí das 8 às 13 horas. Primeiro de segunda a sábado, depois de domingo a domingo. Mas fiquei mexida mesmo com as coisas que envolvem a minha família, na minha cidade natal, Santa Rosa, no Rio Grande do Sul. Tem ali desde sensações maiores até detalhezinhos que me surpreenderam.
O que, por exemplo?
Eu não sabia disso, mas tem uma historiadora lá, em Santa Rosa, que pesquisou bastante a minha vida. Ela contou que, quando eu era bem pequena, ia para escola na caçamba de um caminhão. Eu não tinha como lembrar, era muito criança. Agora, o mais impressionante foi ver que toda a grandeza que sempre vi na minha mãe não é coisa só dos meus olhos. Às vezes, eu ficava pensando: será que eu estou exagerando, por que sempre a amei tanto? Mas vi, conversando com vizinhos da família, que tem quase uma unanimidade em volta dela. Também comecei a entender por que gosto tanto da natureza e da convivência com animais – é tudo coisa que vem da minha família. É muito material para editar. Não digo que o público vai saber dessas coisas todas, mas que bom que eu estou sabendo. O filme, enfim, vai ser a cereja do bolo para fechar essa viagem ao passado.
Estamos em uma época que educa muito sobre comportamentos que não podem e não devem ser repetidos. Mas que também é uma era de lincha mentos virtuais. Você perde o sono com as críticas que recebe na internet?
Cara, no geral, eu entendo completamente. A gente está aqui para aprender. Acho que as pessoas têm que se educar, melhorar, rever o que pensavam e o que disseram, e isso é bom. Claro, às vezes acho que o mundo está retrocedendo, com essas guerras, com as pessoas apoiando essa política nojenta que a gente vive hoje em dia. Mas a gente tem que aprender, não pode se recusar a ir melhorando.
Você tem muitas críticas ao que se fazia na era das apresentadoras infantis, nos anos 1980 e 90?
Tem coisas que eu falava naturalmente porque eu via e ouvia aquilo a vida inteira e depois repetia sem saber. Vendo algumas imagens minhas do passado, vem aquilo: “Carácoles! Não devia ter falado isso”. Mas eu pensava assim. Eu cansei de levar circos no meu programa e de ir a zoológico gravar bichos presos. Hoje eu não faria isso nem a pau. Fico pensando: “Meu Deus do céu, eu apoiei uma atrocidade dessas…” Outras vezes, fiz brincadeiras no programa que soam como racismo. Era um mundo em que a gente nem contestava as coisas. Nos anos 1980, a gente não tinha uma Barbie que não fosse loira. Era a coisa mais normal a gente ver isso e ninguém falar: “Vem cá, cadê a Barbie moreninha, a Barbie negra, a japonesa, a indígena, a indiana?” A gente cansava de ver a menina da favela que não podia ter uma Barbie e, quando conseguia uma, era uma falsificada e loira – ela não podia se enxergar naquela boneca. A mesma coisa acontecia com as princesas da Disney. Depois o mundo começou a aprender, a gente começou a se ouvir mais. Hoje a gente tem mais informação, o que também não significa que coisas horríveis não aconteçam e que as pessoas não estejam nem aí pra elas. Mas é um aprendizado.
E a estética dos anos 1980? Você ainda tem a sua coleção de botas?
Sim, tenho um acervo com umas 100 botas! Até andei pensando em fazer uma exposição. Quando a gente lembra da estética da época como uma coisa exagerada, tem que ver também que as pessoas não andavam nas ruas usando aquilo tudo – as minhas roupas faziam parte de um figurino de artista, de palco, de cenografia. E a moda tem muito essa coisa que vai e volta. Às vezes, vejo imagens de desfiles junto com a Sasha e ela comenta: “Olha, essa coisa aí dos anos 80 voltando”.
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