Dior, verão 2024 alta-costura
Vestido criado pelo fundador da marca nos anos 1950 serve de inspiração para a diretora criativa Maria Grazia Chiuri no desfile de verão 2024 de alta-costura da Dior.
O verão 2024 de alta-costura da Dior pode ser visto como mais um capítulo nos estudos de atualização de criações do próprio Monsieur Dior pelas mãos de Maria Grazia Chiuri. Na contramão da temporada passada (inverno 2023), em que a diretora de criação eliminou ou suavizou estruturas rígidas de modelos clássicos da marca, a de agora retoma as formas arquitetônicas.
O foco, contudo, continua o mesmo. Já faz algumas coleções que Maria Grazia dedica a maior parcela da apresentação aos looks “cotidianos”, com os vestidos e demais peças, digamos, de festa representados em menor quantidade e pontualmente. O movimento, segundo a estilista, é a demanda crescente por esse outro lado da couture.
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
O desfile começa com uma série de looks de algodão bege, inspirados em elementos do trench coat. Com corte de alfaiataria, pregas, drapeados e construção tipo moulage, eles dão conta da parte mais usual do verão 2024 de alta-costura da Dior. Pela cor e matéria-prima, lembram os tecidos usados para as provas e pilotagem de novas peças. Ou então os moldes de papel usados para o corte de tecidos antes da confecção.
O vestido La Cígale, da coleção de inverno 1952 da Dior. Foto: Reprodução
Aos poucos, as linhas retas da alfaiataria se curvam para formar versões modernas de silhuetas emblemáticas da moda dos anos 1950. Durante a pesquisa para esta coleção, Maria Grazia encontrou um vestido da coleção de inverno 1952, criado por Christian Dior em si. Chamado La Cígale, o modelo tinha todos os códigos essenciais à identidade do seu criador, porém com construção rígida, cortes geométricos, aparência pesada, quase como uma armadura.
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
O efeito metálico vem do moiré, um dos materiais favoritos dos couturiers do século passado (hoje, ele está mais associado à decoração) pelo seu brilho e estrutura. E ele nem é um tecido tecnicamente.
Moiré é um padrão aplicado sobre uma trama, como seda, tafetá, – quanto mais pesada, melhor. O processo tem nome, calandragem, e consiste numa espécie de prensa. Os tecidos umedecidos passam por rolos com nervuras ou linhas diagonais, sob alta temperatura e pressão. Dada irregularidade da superfície compressora, só algumas fibras são amassadas e marcadas – outras continuam intactas. As texturas e os reflexos variados (depende da incidência da luz) vêm desse mix de fios perfeitos e modificados.
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Uma curiosidade nada ao acaso sobre o vestido de 1952, é que ele representa uma ruptura, embora leve, no estilo de Christian Dior. Até então, a maison era conhecida pelos vestidos das mulheres flores: delicados, desenhando o corpo com suavidade e fluidez natural. O La Cígale impôs toda uma geometria e robustez àquela imagem de feminilidade.
Também era incomum usar moiré em peças secundárias, só nas dedicadas a ocasiões de muita pompa. Ao romper tal associação, Monsieur Dior fez algo similar ao que Maria Grazia propõe nesta coleção: roupas para o “dia a dia” com a excelência da alta-costura.
Pela primeira vez na sua trajetória na Dior, Maria Grazia usou pencas de moiré. Ele aparece em adaptações e variações do próprio La Cígale e de forma pontual – na parte de cima de um vestido de saia plissada, em jaquetas com lapelas transpassadas, em calças usadas com bustiê ou tops cobertos de plumas e em saias rodadas bordadas com blusa transparente.
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
O resultado é uma coleção equilibrada, com camadas de passado e presente, simplicidade e grandiosidade, reverência e inovações costuradas com maestria. Maria Grazia tem a tendência de ofuscar as qualidades de suas roupas com narrativas ou inspirações sobre temas variados, às vezes pouco relacionados à coleção. Não é o caso do verão 2024 de alta-costura.
A artista convidada para colaborar com a apresentação foi Isabella Ducrot. Seu trabalho propõe uma abordagem humana sobre os tecidos – tanto na sua fabricação quanto nas suas implicações em nossas vidas e corpos. São dela os desenhos de roupas imensas e planificadas nas paredes da sala e é sobre ela as palavras lidas pela modelo e atriz Violeta Sanchez na trilha sonora.
Dior, verão 2024 alta-costura.
Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura.
Foto: Divulgação
Dior, verão 2024 alta-costura. Foto: Divulgação
O texto é o poema “To weave is human”, sobre a relação entre trama e urdume (o posicionamento dos fios no tear). Aí vai um trecho:
“Sem a trama ele está sozinho no palco/ em fortes linhas paralelas – entediado até a morte./ É por isso que todo urdume fica louco/ querendo conhecer a trama o mais rápido possível. Todo tecido resulta, assim,/ desse abraço forçado, um grande projeto/ que apenas as mentes humanas estão destinadas a compreender/ e executar.”
Pois bem, qual é um dos principais pré-requisitos da alta-costura? O trabalho 100% manual. Em tempos tecnológicos de inteligências artificiais, a lembrança é sempre pertinente.
Leia mais: A história, a importância e os ícones da Dior
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