5 experiências gastronômicas e outras razões para se apaixonar por Barcelona
Um brunch inesquecível, uma degustação de jamón, tradição e novidades: confira por que a capital da Catalunha merece um lugar de honra no seu roteiro.

Ao caminhar pelas amplas e simétricas alamedas da região de Eixample ou pelas vielas tortuosas do Bairro Gótico, é fácil esquecer que Barcelona é uma localidade costeira. No nordeste da Espanha, banhada pelo Mar Mediterrâneo, a capital da Catalunha abriga um dos mais importantes portos do país – da janela do avião, é de impressionar a visão dos milhares de contêineres na chegada ao aeroporto El Prat.
Nas boas mesas da cidade, no entanto, a lembrança litorânea logo vem à tona: lulas ultramacias, ostras suculentas, camarões tenros e outros pescados chegam ao prato com aquele frescor que só é possível quando se tem a praia logo ali.
Linguine com lagosta do restaurante La Dolce Vita, no hotel Majestic. Foto: Patricia Oyama
A disponibilidade de frutos do mar é um ponto forte, mas há muito mais a explorar na rica cozinha local. Terra do Disfrutar, o número 1 no ranking The World’s 50 Best Restaurants de 2024, e com 31 endereços estrelados na edição mais recente do Guia Michelin – quatro deles com a pontuação máxima de três estrelas –, Barcelona tem na gastronomia um chamariz e tanto. E veja bem: estamos falando de uma metrópole onde a régua é alta quando se trata de atrações turísticas.
No ano passado, Barcelona ocupou a décima posição no ranking de melhores destinos do mundo, de acordo com o Euromonitor International, que utiliza 55 parâmetros, incluindo infraestrutura, segurança, desempenho turístico e outros fatores, para montar sua lista.
Leia também:
22 malas de viagem para todo tipo de aventura
Para quem ama arquitetura, é uma viagem de sonho. Berço do modernismo catalão, ela concentra oito locais eleitos como Patrimônio da Humanidade pela Unesco. Seis deles são projetos de Antoni Gaudí: as casas Batlló, Vicens e Milà (também conhecida como La Pedrera), o palácio e o Parque Güell e, o mais famoso de todos, a basílica da Sagrada Família.
A monumental obra que Gaudí deixou incompleta ao morrer atropelado por um bonde, em 1926, segue em construção até hoje. A meta atual é terminar a Torre de Jesus, a mais alta de todas, até o ano que vem, quando se celebra o centenário do arquiteto, e concluir totalmente a obra até 2030. Ao sair da basílica, com um certo torcicolo de tanto olhar para cima e apreciar os detalhes absurdos da construção, é quase inevitável entrar na torcida pela canonização de Gaudí, católico fervoroso, que dedicou 44 anos de sua vida a esse projeto.
A Sagrada Família: a obra máxima de Gaudí continua em construção. Foto: Patricia Oyama
Os outros dois patrimônios da Unesco na cidade são assinados por Lluís Domènech i Montaner: o Palácio da Música Catalã e o Recinto Modernista Sant Pau. Apesar de ter fãs que consideram suas obras ainda mais belas que as de Gaudí, Domènech i Montaner está longe de ser tão conhecido mundialmente quanto seu colega. Uma visita a Barcelona é uma ótima chance de ajudar a reparar essa injustiça: os trabalhos em mosaico e azulejos, a combinação perfeita de cores e a união de funcionalidade e estética nos projetos desse arquiteto são apaixonantes.
O Recinto Modernista San Pau, assinado por Domènech i Montaner, era originalmente um hospital.: Foto: Patricia Oyama
Com vestígios do império romano aqui e acolá, Barcelona transborda de história em todos os cantos. Para quem vem de um país onde a memória arquitetônica é vista mais como um incômodo a ser derrubado, é fascinante saber que uma das construções do Parque Güell abriga uma escola pública atualmente. Ou que as paredes da igreja Sant Felip Neri, no Bairro Gótico, preservam as marcas de um bombardeio sofrido na Guerra Civil Espanhola em 1938, que vitimou 42 pessoas, entre elas, 20 crianças. Hoje, a praça de mesmo nome em frente à igreja é fechada em certos horários para que os alunos do colégio vizinho possam brincar e jogar futebol no local durante o recreio (o que pode ser comprovado por algumas bolas coloridas presas nas grades da construção do século 18).
Paredes da igreja de Sant Felip Neri: marcas de bombardeio e bolas de crianças. Foto: Patricia Oyama
Se o foco da viagem for arte, é bom saber que uma semana de estadia será pouco. Do Museu Nacional de Arte da Catalunha (MNAC), fundado nos anos 1930, ao Moco Museum, inaugurado no início desta década, Barcelona tem um roteiro cultural que cobre com primazia séculos de movimentos artísticos. Espanhóis, claro, têm destaque nesse circuito: o Museu Picasso, por exemplo, um dos mais visitados da cidade, exibe pinturas desde a época de formação do jovem Pablo e é o lugar perfeito para entender a evolução do traço do mestre nascido em Málaga.
Support, obra de Lorenzo Quinn exposta no Moco Museum. Foto: Patricia Oyama
Outro museu que está na lista de locais mais concorridos não é exatamente de arte: trata-se do Museu do Futebol Clube Barcelona, instalado no estádio Camp Nou. O atual campeão da Copa del Rey é, inegavelmente, uma das maiores atrações turísticas da cidade. Não só o museu, mas também a loja oficial do time, em Las Ramblas, lota de torcedores do Barça e aficionados por futebol em geral.
Leia também:
Louis Vuitton apresenta coleção cruise 2025 com Gaudí como pano de fundo
Como se vê, motivos não faltam para ir a Barcelona. E também não faltam visitantes, por isso, comprar ingressos antecipadamente para as atrações no site oficial de turismo da cidade, visitbarcelona.com, é essencial. Aliás, sempre que possível, vale a pena optar pela visita guiada. A cidade tem profissionais excelentes, que tornam os passeios muito mais interessantes.
Mas o objetivo inicial desta reportagem, antes que a gente se esqueça, é destacar a gastronomia da capital da Catalunha. Não pretendemos falar aqui dos restaurantes estrelados do Michelin, que você pode conferir no site do próprio guia. Trata-se de um recorte pequenininho na infinidade de delícias que a cidade oferece: experiências que a reportagem provou, aprovou e recomenda. Vamos a elas.
1. O brunch do Hotel Majestic
Aos 107 anos recém-completados, o Hotel Majestic é uma instituição em Barcelona e pode se gabar de ter a melhor localização da cidade. Na esquina do Passeig de Gràcia com a Carrer de València, ele tem Chanel, Bvlgari, Dior e Gucci como vizinhos de quadra e fica a poucos metros a pé da Casa Batlló e de La Pedrera, entre outras atrações.
Sacada de uma das suítes do Majestic, com vista para o Passeig de Gràcia. Foto: Divulgação
Ponto de encontro de intelectuais espanhóis, como Federico García Lorca e Antonio Machado, o Majestic foi o QG de correspondentes internacionais, como Ernest Hemingway e Robert Capa, durante a Guerra Civil Espanhola.
Está intrinsecamente ligado à história da cidade, e a família Soldevila Casals, que administra o hotel há três gerações, quer que essa conexão com Barcelona permaneça forte. Dessa forma, os restaurantes e bares do Majestic são abertos a não hóspedes, assim como o spa e a área de wellness.
Mas o troféu de experiência inesquecível vai para o brunch servido aos domingos, que reúne turistas e moradores locais no restaurante SOLC, no primeiro andar.
O banquete começa com uma taça de Moët Chandon (ou outro drink do menu), incluída no valor do brunch. Chega então à mesa um prato de três andares, com ostras, najavas (molusco com formato alongado como uma navalha), mexilhões e camarões, terrine de foie gras com pato, frango, porco e pistache e, no topo, sanduichinhos recheados com creme de grão-de-bico e vegetais.
O prato de três andares é só o começo do brunch do SOLC. Foto: Aline Melo
A história poderia terminar por aí e esta repórter já estaria feliz da vida, mas há muito mais por vir. O menu também inclui um pescado e uma carne, que no dia da visita eram, respectivamente, um robalo envolto em cogumelos e massa folhada, como um bife wellington, e um cordeiro assado sob uma camada de argila. Além de performática – a capa é quebrada com muito garbo pelo garçom –, a argila garante uma carne ultramacia e suculenta.
Entre um prato e outro servido à mesa, você pode se levantar para conferir a estação de clássicos da casa, que incluem ovos estrelados com jamón e camarão, sopa de pescado, arroz com cogumelos e butifarra (um embutido da Catalunha) e o famoso canelone de frango com morilles (tipo de cogumelo) – ainda que você se sinta mais do que satisfeito, não deixe de provar este último prato: a versão de Nandu Jubany, estrelado chef consultor do hotel, para uma das receitas mais emblemáticas de Barcelona é o perfeito exemplo de quando uma comida conforto alcança todo seu potencial com técnicas de um expert.
Por fim, depois de uma seleção de queijos, há o bufê de sobremesas. Torta de chocolate e avelã, mil-folhas de baunilha e caramelo, torrija (um tipo de rabanada) com caramelo e um mochi incrivelmente macio foram as opções naquele dia.
Um detalhe que vale mencionar é que a cozinha comandada pelo chef executivo David Romero prioriza a utilização dos produtos locais – o hotel mantém, inclusive, uma propriedade a poucos quilômetros dali, de onde vem boa parte dos legumes e verduras utilizados no menu do SOLC e também do restaurante e bar La Dolce Vita, no rooftop do edifício centenário. Em tempo: tomar um drink e saborear um linguine com lagosta no alto do Majestic, com vista para a Sagrada Família, é outra experiência memorável em Barcelona.
Hotel Majestic: Passeig de Gràcia, 68-70. O brunch SOLC Gourmet é servido aos domingos, das 13h às 16h30. Valor: 69 euros* (crianças de até 12 anos pagam 39 euros). Reservas são altamente recomendadas e podem ser feitas pelo site do hotel.
*Preços pesquisados em maio de 2025 e sujeitos a alteração.
2. O novo restaurante dos Hermanos Torres
Sergio e Javier Torres são nomes conhecidos entre os foodies brasileiros. Pelo menos para os que já frequentavam o circuito gastronômico de São Paulo em 2007. Foi naquele ano que os gêmeos catalães inauguraram o Eñe, no Itaim-Bibi, apresentando sua criativa cozinha contemporânea ao país. Os irmãos chegaram a abrir um segundo restaurante no Rio de Janeiro, em 2009, mas em 2013 saíram da sociedade na casa paulistana, que fechou pouco depois, assim como o endereço carioca. A vanguarda espanhola, então, não era mais a grande sensação na culinária mundial. Já em sua terra natal o talento dos irmãos brilhava cada vez mais, conquistando prêmios e fazendo sucesso com livros e programas na TV. Hoje, o restaurante Cocina Hermanos Torres é um dos quatro endereços em Barcelona a ostentar as cobiçadas três estrelas no Guia Michelin.
Neste texto, no entanto, o foco é a mais recente casa da dupla, inaugurada há pouco mais de meio ano no Porto Olímpico de Barcelona. Batizado de Eldelmar, o restaurante está localizado no Balcón Gastrònomic, novo polo gourmet da cidade à beira-mar. Ou melhor, no mar, já que ocupa uma grande área que avança sobre as águas.
A proximidade com o Mediterrâneo é reforçada pelos peixes, crustáceos e moluscos fresquíssimos, que são apresentados em um carrinho aos comensais logo no início – a lagosta, ainda viva, vem com as patinhas amarradas para evitar acidentes.
A pesca do dia apresentada na bandeja no Eldelmar. Foto: Patricia Oyama
Aqui, a ideia é interferir o mínimo possível no produto para preservar todo seu sabor e textura. Assim, as ostras cruas ganham apenas um toque de caviar ou de água de tomate e pimentas piparra e biquinho (sim, a brasileira!). Outros ingredientes são preparados na brasa, inteiros, como peixes selvagens e cigalas (tipo de lagostim), servidas com um providencial alicate de lagosta (lambuzar-se faz parte da experiência). O arroz en lata de pescados y mariscos é outro destaque do cardápio. Mas atenção: não há nada de enlatado neste caso. O nome vem da forma de preparo: o arroz é espalhado em uma assadeira de metal retangular de bordas bem baixas, o que garante um cozimento perfeito e uniforme.
Se você não conheceu a cozinha dos Torres no Brasil, o Eldemar é uma ótima oportunidade de conferir o trabalho dos chefs triestrelados por um valor mais acessível do que no restaurante mais famoso da dupla.
Eldelmar – Hermanos Torres: Moll del Gregal, 3, Sant Martí.
3. A degustação de jamón da Reserva Ibérica
Apaixonado por jamón, Manuel López vem de uma família que comercializa há décadas o famoso presunto curado espanhol no Mercado de La Boqueria. Hoje, sua Reserva Ibérica tem lojas em Viena, no Japão e em Hong Kong, além do ponto no mercado mais tradicional. Mas, se você quiser experimentar com calma o autêntico jamón ibérico de bellota, harmonizado com uma boa taça de cava ou jerez, a pedida é o restaurante Reserva Ibérica The Kitchen, ao lado da loja da marca na esquina da Rambla de Catalunya com a Carrer d’Aragó.
Reserva Ibérica: os melhores jamóns cortados com precisão. Foto: Divulgação
Os jamóns comercializados por López vêm de diferentes partes da Espanha. Em comum, são produzidos com o cuidado que garante o selo de 100% ibérico, ou seja, porcos ibéricos criados soltos e alimentados apenas com bellotas e pasto natural. As bellotas, frutos secos de um tipo de carvalho, dão a esse presunto um sabor marcante, profundo e amendoado.
No restaurante da Reserva Ibérica, é possível degustar fatias de jamón com tempos de cura distintos, cortadas com maestria, além de tapas tradicionais, como croquetas e patatas bravas. Uma curiosidade do cardápio, difícil de encontrar mesmo na Espanha, são pratos preparados com cortes frescos do porco ibérico – uma carne vermelha e saborosa, completamente diferente dos animais de granja. De sobremesa, a tradicional tarta de queso (um tipo de cheesecake sem cobertura) também vale as calorias.
Reserva Ibérica The Kitchen: Carrer d’Aragó, 258.
4. As delícias do Colmado Murria
Colmado é a palavra em espanhol para os tradicionais empórios ou armazéns de secos e molhados. Um dos mais antigos de Barcelona é o Colmado Murria, fundado em 1898 e comandado há mais de cinco décadas por Joan Murria, que assumiu o balcão aos 19 anos, após a morte de seu pai. O lugar mantém a bela fachada histórica e o espírito de mercearia, mas desde 2023, além dos produtos cuidadosamente selecionados, a casa também passou a funcionar como um restaurante intimista.
O cardápio é assinado por Jordi Vilà, chef do Alkimia, endereço de Barcelona com uma estrela Michelin, e do Al Kostat. Alguns pratos, inclusive, vêm dessas casas, como o surpreendente nigiri catalão de atum, capaz de conquistar até os mais puristas amantes da cozinha japonesa. Trata-se de uma exemplar fatia de atum gordo, que, em vez de cobrir um bolinho de arroz, vem sobre um pedaço macio de pão do tamanho de um nigiri tradicional.
Nigiri catalão: atum excepcional. Foto: Patricia Oyama
Outras atrações do cardápio são o tamboril e a lula com arroz negro e o “filé wellington freestyle”, que recheia um croissant da Forneria San Josep, icônica padaria da cidade. A crema catalana em toda a sua glória fecha a refeição com louvor.
Colmado Murria: Carrer de Roger de Llúria, 85. Reservas são essenciais e podem ser feitas pelo site do empório.
5. Os chocolates da Amatller
Fundada em 1797, a Amatller é uma das mais antigas fabricantes de chocolate da Europa e uma das marcas mais tradicionais de Barcelona. A Casa Amatller, por sinal, é um dos pontos turísticos da cidade: a antiga residência do industrial Antoni Amatller, desenhada pelo arquiteto Puig i Cadafalch, faz parte do chamado quarteirão da discórdia, resultado de uma competição entre os ricos de Barcelona, na virada do século 20, para ver quem fazia a residência mais incrível (a Casa Batlló, projetada por Gaudí, e a Casa Lleò Morera, por Domènech i Montaner, eram as concorrentes). Na Casa Amatller, que hoje é um museu, você pode degustar um chocolate quente no final da visita.
Amatller: embalagens lindas para chocolates com história. Foto: Patricia Oyama
Mas se quiser fazer seu próprio chocolate no muque o endereço é a loja da marca no bairro El Born. O local promove um mini-workshop em que o visitante tem a experiência de fazer chocolate do jeito “raiz”, ou seja, esmagando grãos de cacau torrado até obter uma pasta. O resultado é curioso – mas nem de longe fica gostoso como os chocolates à venda no local, nas mais lindas embalagens. As latinhas, que reproduzem ilustrações dos cartazes da Amatller do início do século 20, são presentes perfeitos de viagem. Depois de comer tão bem em Barcelona, afinal, é até desfeita não levar uma doçura para quem não foi.
Espai Chocolate Amatller: Plaça de les Olles, 9, Ciutat Vella. Reservas para a visita com degustação e preparo manual do chocolate podem ser feitas neste site.
A jornalista Patricia Oyama viajou a Barcelona a convite do Majestic Hotel & Spa Barcelona.
Leia também:
Ilha de Páscoa: como é estar no umbigo do mundo
Para ler conteúdos exclusivos e multimídia, assine a ELLE View, nossa revista digital mensal para assinantes