A revolução do Slim Look da Dior
Inspiração da mais recente coleção da Dior, saiba como foi a primeira apresentação do estilista Marc Bohan, em 1961.
Poucos dos elegantes salões de alta-costura foram palco contínuo de tantas expressões criativas diferentes como aqueles na 30, avenue Montaigne, em Paris. Menos ainda conseguiram preservar a imagem de luxo e tradição, apesar de diretores de criação cheios de personalidades e estilos próprios. Sonzinhos, a jovialidade intensa de Yves Saint Laurent, os espetáculos dramáticos de John Galliano ou o ativismo político de Maria Grazia Chiuri não teriam tanto sucesso, não fosse o diálogo estabelecido com os valores criados por Christian Dior em si.
Exemplo recente de uma dessas conversas é a coleção de prêt-à-porter de verão 2022, na qual Chiuri, atual diretora criativa, se inspirou nas primeiras criações de Marc Bohan para maison, 60 anos atrás. Ainda que não tenha marcado a história da grife com momentos emblemáticos ou grandiosos, o estilista deu os passos que a casa precisava para reaver os aplausos cada vez menos frequentes nos salões desde a morte do fundador, em 1957.
Apesar de muito comentadas inicialmente, as coleções de Yves Saint Laurent – o primeiro sucessor do couturier – perderam rapidamente as reações eletrizantes da sua estreia, em 1958. Suas propostas ousadas e os fletes juvenis do estilista começaram a incomodar a clientela conservadora da alta-costura e a cansar a imprensa internacional.
O fracasso de sua última coleção (Souplesse, Légèreté, Vie, do inverno 1961) e os traumas da convocação pelo exército se somaram a um colapso nervoso. Internado aos 24 anos, Yves recebeu não apenas a notícia de sua demissão como diretor dos ateliês Dior, mas da nomeação do rival Marc Bohan como seu substituto.
Roger Maurice Louis Bohan, ou Marc, como se rebatizou a pedido do antigo chefe, o estilista Robert Piguet, era um profissional experiente. Dez anos mais velho que Saint Laurent, já havia trabalhado para Patou, Molyneaux e Madeleine de Rauch e, depois de conhecer Christian Dior em 1957, dirigiu os ateliês da marca em Londres. Assumir os salões em Paris era a oportunidade que ele buscava – e uma que o preocupado Marcel Boussac, o maior investidor da maison, estava ansioso para oferecer.
O estilista Marc Bohan, ao final de seu primeiro desfile para Dior.Foto: Getty Images
Sua estreia na Dior, em 26 de janeiro de 1961, foi um sucesso. Os novos vestidos e conjuntos reviveram a animação dos tempos passados na avenue Montaigne. Os primeiros aplausos, vindos da Duquesa de Windsor, iniciaram ondas de comoção que terminaram em cadeiras e pessoas no chão, taças de champagne quebradas e um orgulhoso Marc Bohan pressionado contra a parede, sendo beijado e parabenizado por uma horda de novas admiradoras.
A nova linha foi chamada de Slim, em referência a silhueta fina e simples das peças inspiradas no guarda-roupa feminino dos anos 1920. As jaquetas e saias, elegantemente discretas e minimalistas, tiveram apelo imediato entre as mulheres na plateia. Suaves e femininos, os modelos fugiam da sofisticação extrema da mulher idealizada por Christian Dior anos antes. Os designs eram contemporâneos e traziam luz à inclinação de Bohan para a simplicidade.
O Slim Look, da Dior.Foto: Getty Images
Com destaque para cores lisas, a coleção renunciava a exageros, com exceção das flores, parte da aura de Dior. Quatro vestidos de chiffon florido, por exemplo, batizados como Jardim da Itália, de Paris, da Espanha e Jardim Inglês, entraram juntos na apresentação. A proposta era combinar as peças com chapéus coloridos de palha Baku, feitos a partir de folhas de uma palmeira asiática, a Talipot.
O sucesso do Slim Look da Dior
O lírio-do-vale, flor preferida de monsieur Dior, apareceu em bordados no vestido Miss Dior, de organdi marfim. A criação protagonizou um escândalo em 15 de julho de 1961, durante um festival de cinema de Moscou. A estrela de Hollywood Elizabeth Taylor chegou estrategicamente atrasada e encontrou a atriz italiana Gina Lollobrigida, constrangida, com o mesmo vestido. Anos mais tarde, Bohan explicou que fez o vestido para Taylor e que, apaixonada pela peça, Lollobrigida teria encomendado uma cópia exata na Itália.
As atrizes Gina Lollobrigida e Elizabeth Taylor.Foto: Getty Images
Essa não foi a única aquisição da Liz Taylor naquela temporada. Ela comprou outros 11 vestidos da linha Slim, incluindo o Soirée à Rio, de chiffon de seda verde claro e faille marfim, com bordados de flores e insetos. Um de seus preferidos, ela usou o modelo para receber seu primeiro Oscar de Melhor Atriz, pelo filme Butterfield 8 (1960). A atriz Olivia de Havilland também usou uma versão (original) do vestido na festa do 21º aniversário da estreia do filme ...E o vento levou (1939).
Outras clientes ilustres se apaixonaram pela coleção, como a primeira-dama americana Jackie Kennedy, que encomendou o casaco de linho rosa Vie en Rose para a visita oficial a Caracas, na Venezuela, em dezembro de 1961.
Look da coleção Slim, da Dior.Foto: Getty Images
O sucesso do Slim Look definiu não apenas o ritmo jovial da marca na década de 1960 como o legado do estilista na Dior. Marc Bohan viria a se tornar o estilista com maior tempo na maison, com quase três décadas na direção, deixando o cargo em 1989.
Maduro, seguro e sensível aos desejos de suas clientes, Bohan costumava pedir que, ao falar de roupas e modas, “não se esqueçam da mulher”. Sessenta anos mais tarde, esse pensamento é igualmente parte do rumo criativo de Maria Grazia Chiuri, que se juntou à Dior em 2016 como sua primeira diretora mulher. Neste exemplo de diálogo, é a ideia de uma mulher contemporânea que domina – uma mulher glamourosamente livre.
Dior, verão 2022.Foto: Divulgação
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