A vida social voltou e com ela um novo jeito de ver e ser visto

Após dois anos de pandemia, o mundo de festas e eventos está de volta. Neste novo momento, sofrer pela moda, ao que tudo indica, está com os dias contados.


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Quando fui convidado para escrever esta matéria, precisei acionar minha memória e recuperar algumas das várias frases e imagens vistas e ouvidas nas últimas semanas. Depois de dois anos de contatos reduzidos ao máximo, estamos recuperando um pouco da agitação social daquele tempo pré-pandêmico. De exposições a feiras de arte, aniversários a desfiles, parece que a velha engrenagem social voltou a rodar, e a moda, claro, faz parte disso.

Desde que a covid-19 trancafiou muita gente dentro das próprias casas, não faltaram teorias sobre o tal look do retorno. Teve um momento em que se acreditou que, uma vez vacinados e com contágios controlados, voltaríamos à cena em estado máximo de glamour e exuberância. Tiveram associações com os anos loucos da década de 1920 e teve também quem apostou numa abordagem mais comedida, meio confortável, meio arrumada. Acontece que ninguém sabia exatamente quando voltaríamos a esfregar ombros em pistas, corredores e até mesmo na rua. Muito menos em que condições isso aconteceria.

Quando finalmente aconteceu, a prática se mostrou um tanto diferente das várias teorias Nem uma nem outra e meio que tudo junto e ao mesmo tempo. Porém, mais do que qualquer tendência, colocar o pé para fora de casa hoje significa levar com você um dress code próprio que já começa esbarrar nos tradicionais e velhos padrões.

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“Estamos vivendo um período de excessos, a pandemia limitou nossas vaidades. Por isso, neste retorno à vida social, todos estão exagerando, sim, ao montar um look. A diferença, agora, é que o conforto fala mais alto”, diz Roberta Maria de Pádua, comunicadora estratégica da agência SOKO. “Aprendi a trazer as ‘peças de casa’ para a rua.” E por peças de casa, Roberta se refere ao bom e velho moletom, a camisa oversized, pés à mostra e até pijamas, que pode muito ir além de um brunch. Tudo isso junto com um bom salto (que não machuque) ou uma calça de alfaiataria.

Alguns desfiles internacionais da temporada de inverno 2022 trouxeram propostas que dialogam bem com esse momento relaxado e descontraído: da simplicidade da regata branca, que deu o ar da graça nos desfiles da Prada e da Bottega Veneta, até os vestidos de tricôs da Proenza Schouler, que oferecem um shape escultural sem a rigidez.

Prada, inverno 2022.

Prada, inverno 2022.Foto: Divulgação

Bottega Veneta, inverno 2022.

Bottega Veneta, inverno 2022.Foto: Divulgação

“Estamos nos redescobrindo depois de tanto tempo. Estamos num momento de exuberância, mas de modo algum desconfortável. Estamos aprendendo a viver com esses dois lados”, reflete Carollina Lauriano, curadora adjunta da 13ª edição da Bienal do Mercosul. Durante a SP-Arte 2022, ela foi vista circulando pelo prédio da Fundação Bienal a bordo de um vestido de tricô, trench coat e tênis nos pés. Na mesma semana, foi a festa do artista Thiago Tebet, em seu estúdio, no bairro do Bom Retiro, com look igualmente high-low.

“O equilíbrio das coisas é necessário”, fala a curadora. Ela lembra ainda que a pandemia acelerou processos que estavam no ar e precisavam se concretizar. Ser refém de tendências ou segui-las à risca, atualmente, parece uma bela furada.

Não é uma novidade que o vestimos reflete nossos valores e implica em como nos posicionamos política, cultural e socialmente. Ainda assim, há um novo frescor na ideia de liberdade para além de códigos rígidos e pré-ordenados. “Acredito que falar de um corpo diferente do ideal dos padrões ainda é uma questão que esta sendo desmistificada, e como é um lugar que eu posso comunicar, há sempre uma ideia de repensar e entender esses volumes”, diz a artista Gabriella Garcia, que foi a um jantar da Gucci, no Theatro Municipal de São Paulo, com um vestido de modelagem ampla, bolsinha de crochê e flats.

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Ao que tudo indica, os eventos sociais – até os mais exclusivos ou requintados – vão precisar se acostumar a uma nova imagem, e isso implica na revisão de pequenos (grandes) detalhes, como o salto alto. A partir de agora, ele passa a ser repensado e corre um grande risco de passar mais tempo no closet. “Sou uma grande defensora do salto, mas também entendendo que ele vem mais confortável e com adaptações, como trocar o salto agulha por um salto bloco ou por um modelo não tão alto”, diz Carollina.

No sentido contrário, passamos a entender que acessórios antes barrados por sua informalidade se adaptaram. Os tênis talvez sejam o melhor exemplo. Já há algum tempo eles ganharam status cool a ponto de carregar uma informação de moda mais atual, as flats a mesma coisa e até mesmo as sapatilhas deixaram de ser caretas. “Hojem, temos diversas possibilidades de substituir o salto com sapatos que sejam tão poderosos quanto”, completa a curadora.

“Meu guarda-roupa está sendo construído há dez anos, e, agora, estou ainda mais atenta à relação que tenho com a roupa. Faz parte da minha identidade, da minha construção como pessoa”, diz Roberta, sobre a imposição das tendências e como se salva dessa armadilha. “Tendência é sempre uma relação complexa, de um lado tudo isso te impacta, gera desejo. Ao mesmo tempo, fico pensando o que isso tem a ver comigo, com minha personalidade”, completa Carollina.

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Se ir mais à vontade em um simples coquetel já está incomodando algumas pessoas, vestir a camisa do descompromisso parece ser a revolução do momento. Porém, esse novo ponto de vista tem mexido nas estruturas de como enxergamos corpos diversos em nossa sociedade. “Ainda temos uma imposição muito grande a essa liberdade, ao oversized, ao loungewear, principalmente quando falamos do corpo da mulher”, diz Carollina.

“É como se para expressar feminilidade os shapes necessários precisassem ser aqueles mais marcados, acinturados, uma calça justa. Ainda temos essa noção de que essas referências ‘valorizam o corpo da mulher’. Porém, acho que a gente vem ganhando mais espaço, inclusive no poder de ter mais opção de escolha”, continua a curadora.

Versace, inverno 2022.

Versace, inverno 2022.Foto: Divulgação

Dior, inverno 2022.

Dior, inverno 2022.Foto: Divulgação

Nessa geleia geral em que estamos, há espaço para tudo – desde um corset sem sofrimento, como fez a Versace em seu inverno 2022, até se preparar para o que der e vier, transformando suas roupas em verdadeiras armaduras urbanas, a exemplo das criações da Dior e Balmain para a atual temporada.

“Gosto de pensar que roupas são como próteses do corpo, que nos dão um ar imponente. É preciso ter um tecido bom, ser de qualidade, uma roupa que te abraça, te sustenta, mas, antes disso, não podemos esquecer que tudo é questão de personalidade, e o mais importante é estar bem e se sentir poderosa”, encerra Roberta. Recado dado.

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