Para reconquistar mercados, Pierre Cardin aposta em novos talentos ao redor do mundo

De passagem pelo Brasil, o CEO e diretor criativo Rodrigo Basilicati-Cardin, fala sobre seu projeto com estudantes de moda e as estratégias de reposicionamento da histórica marca francesa.


Sob novo comando, a marca Pierre Cardin busca novas estratégias para atualizar a marca e torná-la desejo entre novos consumidores. Visita ao brasil e concurso no país fazem parte do plano. Acima, foto do desfile da marca na Paris Fashion Week
Foto: Divulgação/Getty Images



Na noite da terça-feira (09.05), a marca Pierre Cardin trouxe ao Brasil sua coleção de inverno 2023, desfilada em março deste ano durante a semana de moda de Paris. Apresentada no auditório Simón Bolívar, no Memorial da América Latina, foi uma compilação de cores vibrantes, recortes geométricos e volumes com aspecto sci-fi. Resumidamente, uma versão atualizada da estética Space Age pela qual o designer francês, falecido em 2020, ficou conhecido em meados do século 20.

A turnê faz parte de uma estratégia de marketing para reposicionar a marca, fundada em 1950, novamente sob os holofotes da moda de luxo. “É uma forma de promoção”, diz Rodrigo Basilicati-Cardin, CEO e diretor criativo da maison. “A semana de moda de Paris recebe milhões de visitantes. É difícil conseguir esses números de outra forma, então aproveito para desfrutar o máximo desta plataforma”, continua ela.

Rodrigo Basilicati Cardi é o novo CEO à frente da Pierre Cardin e busca estratégias para atualizar a marca

Antes da apresentação de março, fazia 30 anos que a Pierre Cardin não participava do evento. É que, apesar da sua importância na história da moda e de toda revolução que promoveu com as roupas de cortes retos, formas simples e produzidas em série, numa época em que o prêt-à-porter era coisa do outro mundo, a grife acabou perdendo brilho e relevância com o passar do tempo. E muito devido a uma de suas maiores inovações: os licenciamentos.

No fim da década de 1950, Cardin ficou conhecido como o “napoleão dos licenciamentos” e “o estilista das massas”. Isso porque o estilista decidiu licenciar algumas de suas criações para uma loja de departamentos. Algo impensável para a elite criativa parisiense, um rebaixamento de nível sem precedentes. E ele não estava nem aí. Sem medo, afirmava que era a única maneira de ganhar dinheiro, mesmo que isso custasse o posto que ocupava na Câmara Sindical de Alta-Costura.

Acontece que o esquema tem efeitos colaterais. A marca, sua imagem e o que representa podem acabar pulverizados demais quando os licenciamentos se multiplicam, sem controle e sem estratégica. A consequência é a perda de relevância e diferencial.

Como funciona um licenciamento?

Para deixar claro, os licenciamentos funcionam assim: empresas interessadas assinam um contrato para produzir, distribuir e comercializar determinado produto da Pierre Cardin em regiões previamente acordadas. Ou seja, elas compram a assinatura do produto, seu manual técnico de costura e confecção e ficam responsáveis por todo o processo de produção e custos operacionais envolvidos a partir daí. Sendo assim, não existe uma centralização comercial – e também nenhum controle sobre como, onde e a que preços aquelas peças serão vendidas.

Vestidos desfilados por Pierre Cardin no Brasil não serão vendidos no país

As peças desfiladas por aqui não estarão à venda Foto: Getty Images

Como a grife francesa não tem lojas próprias, a revenda fica por conta desses licenciados – cada um lucra com o que faz, e a Pierre recebe os royalties firmados no começo da negociação. E devido ao fato de cada contrato ser por produto, a oferta varia muito ou completamente de acordo com a região de comércio. Por isso, quem viveu sabe, no Brasil a Pierre Cardin acabou se tornando sinônimo de ternos com bom custo benefício, embora não exatamente atraentes, e calças jeans básicas, tudo para o público masculino.

“É algo muito nosso”, fala Rodrigo, que não pretende mexer nesse modelo de negócio. “Abrir lojas próprias leva tempo, seria uma mudança mais complexa, e eu tenho receio do resultado.” Por outro lado, o executivo deseja estar mais próximo e conectado com seus parceiros e licenciados, a fim de garantir um controle um pouco maior sobre a qualidade e apresentação dos produtos. Com isso, espera-se sobretudo uma imagem unificado ou, ao menos, em consonância com a matriz.

Incentivo a novos talentos

Outra estratégia para colocar o nome Pierre Cardin na boca e na lista de consumo das novas gerações é o Pierre Cardin Young Designers. Trata-se da busca de jovens talentos ao redor do mundo para integrar a equipe de estilo da casa, em Paris. Com passagens anteriores pelo México, Coréia do Sul e Estados Unidos, o projeto aconteceu também no Brasil, com a colaboração de 37 universidades aprovadas pelo MEC e espalhadas pelas cinco regiões do país. Os finalistas e o vencedor foram anunciados na data do desfile na capital paulista.

Ao todo, foram 570 inscrições, feitas mediante o envio de um croqui original, reunidos e pré-selecionados pelos professores das respectivas instituições de ensino. Em seguida, 200 nomes foram aprovados e enviados à equipe da Pierre Cardin, em Paris. Lá, 40 alunos foram escolhidos para participar de um workshop com o time francês, realizado presencialmente em São Paulo.

“O workshop sempre transforma nossa decisão. Às vezes olhamos os desenhos lá de Paris e ficamos interessados em uma pessoa específica. Aí, durante a oficina, nossa impressão muda: quem achávamos que era bom, na verdade, é mais ou menos, e o mais ou menos é quem é realmente bom”, diz Rodrigo.

Na etapa brasileira do concursos, os finalistas foram seis: Vitória Stersa, da Universidade Estadual de Londrina (PR)s, David Chaddad, do Centro Universitário Belas Artes (SP), Letícia Porto, da Faap (SP), Natália Wolkmer, do Senac de Porto Alegre (RS), Lucas Lima e Felipe Navarro, ambos da Universidade Estadual de Maringá (PR).

Todos ficaram sabendo que chegaram à reta final junto ao público do desfile. Ao vivo, seus nomes foram anunciados por Rodrigo, antes de revelar a grande vencedora: Letícia Porto, natural de Araçatuba, no interior de São Paulo. Ela será contemplada com um estágio de três meses na sede da marca em Paris, com todos os custos de transporte, alimentação, acomodação e despesas pessoais cobertos pela empresa. 

Letícia é uma das sete estudantes ao redor do mundo a receber este prêmio em 2023. Camboja e China estão entre os próximos destinos. A ideia é que, passado o tempo do estágio, eles sejam contratados, como já aconteceu com o estudante mexicano Yago Rosas, que residirá na capital francesa de agora em diante.  

Na contramão do mercado, o CEO não deseja chamar um “outsider”, como disse, para ocupar a direção criativa. A dança das cadeiras de estilistas em grandes casas, que se tornou comum nos últimos tempos, não o anima. “Essa coisa de contratar um nome grande para desenhar para a maison, sabe… Tem algo aí que não me apetece”, confessa ele. “Você arrisca perder completamente sua linha de design e eu quero manter nossa linguagem.”

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