Lady Gaga fala à ELLE sobre “Coringa: Delírio a dois”
"Eu me sinto muito confiante como atriz. Provavelmente, porque criei personagens durante toda a minha carreira", diz ela.
Lady Gaga parece à vontade ao falar de Lee Quinzel, versão da personagem popularmente conhecida como Harley Quinn, ou Arlequina para nós, brasileiros, que interpreta em Coringa: Delírio a dois. A sequência do filme dirigido por Todd Phillips em 2019, que ganhou o Leão de Ouro em Veneza, deu um Oscar a Joaquin Phoenix e arrecadou mais de US$ 1 bilhão, estreia nesta quinta-feira (3.10) nos cinemas brasileiros.
“Eu me sinto muito confiante como atriz. Provavelmente porque criei personagens durante toda a minha carreira em meus álbuns, além de atuar desde pequena”, disse em entrevista com a participação da ELLE, em Los Angeles.
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Na trama, Lee aparece na vida de Arthur Fleck (o nome civil do Coringa interpretado por Phoenix) na prisão onde ele está detido depois de assassinar diversas pessoas na história do filme anterior. Lee está na ala psiquiátrica do hospital adjacente ao presídio, internada à força pela mãe – ou pelo menos é isso o que ela diz.
Ela é uma personagem ambivalente, de difícil descrição, que nunca se sabe se mente ou fala a verdade, ou se é apenas o produto da imaginação de Fleck. O filme inteiro é assim: o real e a fantasia se misturam, e essa confusão é representada muitas vezes por cenas musicais.
Para falar sobre Coringa: Delírio a dois com a imprensa, a cantora e atriz de 38 anos apareceu em uma suíte do hotel Four Seasons de Beverly Hills vestindo paletó e bermuda em estampa tartã de tons diferentes. Ela também usava um casquete preto com véu. Os saltos eram altíssimos, o batom, vermelhíssimo, e no dedo anular havia um diamante gigante do anel de noivado com o empresário Michael Polansky. Os cabelos estavam platinados, assim como a sobrancelha. Claro que, Gaga sendo Gaga, cinco dias depois, já estava ruiva na première do filme em Londres.
Lady Gaga como Lee e Joaquin Phoenix como Arthur/Coringa no filme Foto: Divulgação
Ela entrou sorrindo, cumprimentando os jornalistas da América Latina, Ásia e Austrália, e dizendo que ia mover a cadeira um pouco para trás da mesa redonda “para poder ver todo o mundo”. Ouviu cada pergunta com atenção e deu as respostas completas e bem refletidas, mas escondeu um segredo: o lançamento de Harlequin, um álbum que acompanha o filme, com canções que aparecem no musical, além de duas inéditas.
A seguir, leia os principais trechos da conversa com a cantora e atriz:
Você disse que ama o primeiro filme do Coringa. Como foi receber o convite?
Fiquei honrada. Amei interpretar Lee e Arlequina, mas queria ajudar a contar o resto da história de Arthur. Quem diria que alguém como ele não poderia amar? Achei tão legal que ele tem essa capacidade total no filme. Lee tanto permanece sendo ela mesma, como às vezes se anula pois dedica cada momento de sua vida a ele. Minha Lee, minha Arlequina, não é uma vítima. Ela está tentando tirar o Coringa de dentro do Arthur o tempo todo. É isso o que ela quer. Cabe ao público descobrir como se sente em relação a isso e às intenções dela.
“Também sou Stefani e Gaga. Sou as duas coisas. É como colocar uma pele ou me transformar”
Como muitos personagens nesse universo dos quadrinhos, há uma dualidade: Lee e Arlequina, Arthur e Coringa. Dado que Lady Gaga é uma espécie de construção sua, Stefani, você teve algum tipo de insight natural sobre essa dualidade?
Essa é uma das principais razões pelas quais queria fazer esse filme, porque o que criei na minha carreira musical foi, de muitas maneiras, essa rebelião total. Isso se reflete de muitas maneiras nessa personagem e faz parte da história de Arthur desde o primeiro filme: como usamos nossa identidade como arma para nos comunicar e talvez falar coisas que não sabemos dizer quando não somos essa outra pessoa. Acho que é por isso que as pessoas se apaixonaram pelo primeiro filme, porque Arthur é um personagem poderoso que elas simplesmente deixam de lado na vida cotidiana. E o Coringa é alguém de quem você não consegue tirar os olhos. Ainda assim, são a mesma pessoa. É apenas a ideia dele de si mesmo que muda. Conversamos (Gaga, Joaquin Phoenix e Todd Phillips) muito sobre como Arlequina ganha vida porque Arthur queria e precisava disso. Qual é a versão de Arlequina na mente de Arthur e qual é a versão dela realmente? Porque a maneira como nos vemos e a maneira como nossos amantes nos veem são totalmente diferentes.
Você vê sua Arlequina como sua Mãe Monstra? (Na música “Manifesto of mother monster”, a cantora fala da dualidade de bem e mal que todos temos)
De certa forma, sim. Não quero dar spoilers, as pessoas precisam assistir para entender quem ela é. Lee é realmente uma personagem muito complexa. Você não consegue defini-la, e tenho certeza de que todas as mulheres aqui sabem o que quero dizer: quando as pessoas tentam dizer quem você é, o sentimento mais libertador é se rebelar contra isso. Então, o desafio dela está relacionado às minhas personas. Mas eu também sou Stefani e Gaga. Sou as duas coisas. É como colocar uma pele ou me transformar. Todo o mundo faz isso o tempo todo, só a maneira como fazemos que é diferente.
Lady Gaga, Joaquin Phoenix e o diretor Todd Phillips (ao centro) durante as filmagens Foto: Divulgação
Normalmente, a Arlequina é vista como uma vítima do Coringa. No filme, não. Como você lidou com o fato de Lee ser obcecada pelo Coringa, o que a torna vulnerável, mas também manipular Arthur?
Permiti que houvesse tensão. Nem tudo faz sentido na vida. Às vezes, quando você está fazendo um filme, há um desejo de tudo fazer sentido. Mas nós, seres humanos, cometemos erros o tempo todo. Somos contradições ambulantes. Dizemos uma coisa e fazemos outra. Pensei muito sobre como seria nos dias de hoje interpretar uma mulher obcecada por um homem que define todo o seu ser, cada escolha que ela faz. E como isso a torna frágil, mas também como ela também está totalmente no comando o tempo todo. E nós (Gaga, Phoenix e Phillips) realmente conversamos muito no set sobre quem ela realmente amava. Porque mesmo que eu reconheça profundamente seu amor pelo Coringa, sempre tive convicção de que ela ama Arthur também. Não acho que ela poderia amar completamente esta versão do Coringa sem amar o Arthur. Acho que essa é minha perspectiva única como mulher, que podemos ser ambas as coisas e sentir amor pelos dois.
Você se sente tão confiante como atriz quanto como cantora? Pergunto até porque na música você tem controle total. E no filme, não.
Eu me sinto muito confiante como atriz. Provavelmente porque criei personagens durante toda a minha carreira em meus álbuns, além de atuar desde pequena. Para mim, tudo se resume a criar um novo universo a cada vez, e o de Lee é completamente diferente do meu quando estou no palco. A maneira como me apresento no palco está sempre ligada à minha história e à minha experiência, mas também a um sonho, e isso é muito parecido com quando você está atuando.
“Cada personagem que eu crio afeta minha música porque é tudo uma coisa só”
Este é o maior filme da sua carreira, e você vai lançar um álbum de inéditas em fevereiro, o primeiro em cinco anos (na entrevista, ninguém sabia do álbum com covers ligado ao filme, anunciado posteriormente). Como você descreveria este momento?
Eu me sinto muito grata. Gostaria de dizer a jovens artistas que ser você mesmo é sempre a parte mais valiosa, porque sua perspectiva é o que o torna único. Sou muito grata que as pessoas estejam interessadas na minha perspectiva. Estou interpretando uma personagem como Lee, que as pessoas já conhecem. E elas estão interessadas em ver como eu fiz.
A maneira como Lee canta é muito diferente de Lady Gaga. Seu trabalho como Arlequina impactará sua carreira musical de agora em diante?
Definitivamente. Já impactou. Cada personagem que eu crio afeta minha música porque tudo é uma coisa só. É realmente muito divertido deixá-los colidir. Sendo uma mulher artista, as pessoas tentam o tempo todo dizer quem você é. Ou querem que você explique quem é. Acho que há muita liberdade em dizer não. Não tenho certeza se sei totalmente quem sou. Mas definitivamente sei que música, cinema, performance de palco, maquiagem e moda são as maneiras pelas quais me comunico.
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Joaquin Phoenix com Arthur/Coringa e Lady Gaga como Lee Foto: Divulgação
Você e Joaquin Phoenix ensaiaram muito para estabelecer a química intensa no filme?
Na verdade, nunca ensaiamos uma cena. Tudo era muito cru, fresco. Mas conversávamos sobre as cenas. Em relação às músicas, dependia do momento. Canto de algumas maneiras diferentes dependendo do que está acontecendo e do que estamos tentando dizer. Para algumas músicas, eu estava mais ensaiada, e para outras tentei não ensaiar para que (a voz) pudesse vir de um lugar bem diferente.
Era uma emoção crua, então?
Gosto de pensar que a emoção crua pode existir mesmo quando estou usando toda a minha técnica no palco. Mas Lee não é cantora, então, se a voz dela ficava mais forte, eu me perguntava por que isso estaria acontecendo. E muitas vezes neste filme era por causa do que Arthur estava sonhando. E há outras vezes em que eu estava cantando para me acalmar. Ela meio que tem esse desconforto. Algo que dei a ela, que é realmente significativo para mim, é a maneira como a música serve para me embalar. Acho que a embalou também.
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