Quem são as estrelas da nova campanha da Gucci?
Primeira coleção da Gucci assinada pelo diretor criativo Sabato De Sarno ganha campanha com modelos new face e referências à fotografia de moda dos anos 1990. Mas o que isso significa?
A nova campanha da Gucci não tem nomes, nem rostos conhecidos. Até porque as estrelas não são pessoas, são produtos. Tipo a nova versão da bolsa Jackie, o sapato slingback (tendência forte do verão 2024) ou os microshorts de alfaiataria. Fotografada por David Sims e com styling de Alastair McKimm, essa é a primeira publicidade de uma coleção assinada pelo diretor criativo Sabato De Sarno, sucessor de Alessandro Michele.
Como no desfile, a virada aqui foi de 180º. Nada de cenários grandiosos, personagens recém-saídos de uma viagem no tempo, de teatralidade, de fantasia. Agora, a mensagem é direta e reta. Bem no estilo de grandes fotografias de moda dos anos 1990.
Mas por que os anos 1990?
Foi nessa época que o estilista Tom Ford tornou a Gucci uma das marcas mais lucrativas e desejadas do mundo. Nostalgia anda em alta, anemoia (a nostalgia de algo ou tempo que não se viveu) idem. Mas não é só isso.
Sabato era adolescente na década de 1990. Suas primeiras ideias sobre estilo foram formadas justamente pelas imagens produzidas naquele período. É com base em tais memórias que ele pretende dar cara nova à casa florentina.
Foto: Divulgação
A primeira campanha sob direção de Sabato De Sarno, a da linha de fine jewelry, já dava sinais sobre o rumo que o estilista tomaria. É aquela com a modelo Daria Werbowy, com cabelos molhados, à beira de uma piscina, vestindo apenas a parte de baixo de um biquíni preto e brincos de ouro.
O desfile de estreia de Sabato na Gucci, em setembro, só reforçou a suspeita. Tanto pelas reedições de peças criadas por Tom Ford quanto pela imagem limpa, sem excessos e pelas roupas pensadas para o dia a dia, adaptáveis a qualquer vontade ou estilo.
E as modelos na nova campanha da Gucci?
A nova campanha da Gucci conta com cinco modelos: Fadia Ghaab, Jiahui Zhang, Nyajuok Gatdet, Violet Hume – todas novatas que estrearam na passarela no primeiro desfile assinado por Sabato De Sarno, durante a semana de moda de Milão.
No entanto, a relação – ou papel – do quinteto na construção das imagens e, mais ainda, na mensagem que deseja ser comunicada é diferente do que acontece quando celebridades e influenciadores são contratados para divulgar uma linha ou peça específica.
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Quando a Gucci chamou Kendall Jenner e Bad Bunny para anunciar a nova coleção de malas de viagem, ou quando Paul Mescal e Xiao Zhan foram fotografados para comunicar a linha comemorativa dos 70 anos do mocassim Horsebit, não é só o produto que está em jogo.
A ideia é simples: aproveitar a popularidade e alcance de determinada personalidade para tentar vender um produto a clientes em potencial. É uma estratégia já bem conhecida e recorrente até hoje, porém nem tão eficaz ou interessante para marcas de luxo.
É que a leitura daquelas imagens não tem como ser dissociada do que a celebridade em questão representa. Com isso, alguns nichos de consumidores podem não se ver contemplados ou até mesmo desejar não serem associados àquela pessoa ou estilo.
E daí? Qual é o problema?
Até pouco tempo, valia a máxima “os incomodados que se retirem”. Aquelas campanhas nem eram destinadas a quem prefere discrição à tendência do momento. Via de regra, publicidades de moda com grandes nomes são para conquistar quem ainda não é cliente e quem gostaria de ser, mas só consegue pontualmente.
É o que o mercado chama de consumidores aspiracionais. Eles não compraram com tanta frequência, nem deixam grandes quantias de dinheiro a cada visita às lojas. O foco desse público é majoritariamente acessórios, edições especiais ou limitadas e peças hit.
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Foi esse nicho o responsável pelo boom de vendas das marcas de luxo quando a Covid-19 começou a arrefecer graças às vacinas. O problema é que a euforia passou. As promessas ou crenças de que o mundo seria um lugar melhor após a pandemia caíram por terra.
Em mercados importantes, como EUA, China e Europa, a realidade econômica – com inflação nas alturas, taxas de juros oscilantes, incertezas políticas, além de duas guerras – fez muita gente, em especial os tais consumidores aspiracionais, pensar duas vezes antes de abrir a carteira.
Nos nove primeiros meses de 2023, as vendas das marcas de luxo cresceram em ritmo bem mais fraco em comparação ao mesmo período do ano anterior. E aí que, em tempos bicudos, desagradar qualquer consumidor, de qualquer nicho ou perfil, não é uma boa ideia.
O que isso tem a ver com a nova campanha da Gucci?
Existem duas maneiras de interpretar a campanha de verão 2024 da Gucci. A primeira é do ponto de vista financeiro. Uma das estratégias adotadas pelo grupo Kering, do qual a etiqueta faz parte, para reduzir os impactos da desaceleração do consumo é o investimento em qualidades essenciais e históricas de suas grifes.
Em entrevista ao The Business of Fashion, o CEO interino da Kering, Marc Duplaix, explica bem o assunto: “Tivemos alguns clientes absolutamente apaixonados pela visão de Alessandro Michele, mas a maior parte deles compra produtos Gucci, não produtos Alessandro ou Sabato De Sarno ou Frida Giannini. É isso que pretendemos: que as pessoas comprem produtos Gucci porque amam a marca”.
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Ou seja, importa mais o produto do que quem o veste ou a história na qual foi inserido. Livre de possíveis associações, as chances de um maior número de pessoas se identificarem e desejarem aquelas peças é maior. O fato de serem itens clássicos, com aspirações atemporais, também ajuda. Por isso, os modelos poucos conhecidos, a obsessão com os arquivos e a preferência dos executivos por criadores sem muita visibilidade e, por consequência, ainda sem uma identidade ou assinatura marcante.
A outra maneira de interpretar depende da narrativa. A usada por Sabato De Sarno fala de uma moda menos impositiva, com mais possibilidades, como uma plataforma para expressão de vozes e imagens pessoais. Em um comunicado sobre a campanha recém-lançada, a Gucci afirma: “A sensualidade concebida como uma atitude de beleza, liberdade e confiança torna-se o tema predominante de uma coleção que estende um convite pessoal a cada mulher”.
O diretor de criação já havia dito algo similar na ocasião do seu desfile de estreia. As roupas do verão 2024 da Gucci conversam diretamente com uma série de vontades e necessidades das consumidoras da casa. É aquela peça que faz a diferença, que dá para combinar de sei lá quantas maneiras, que resolve, ajuda e não decepciona. E ainda te deixa bonita, elegante e sensual. Do seu jeito.
Qual é a versão verdadeira e qual é a falsa? Qual é certa e a errada? As duas. É meio impossível separar uma interpretação da outra. Mais do que nunca, a sinergia entre o lado comercial e criativo de uma empresa de moda precisa de harmonia e afinamento máximos.
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