O que a nova campanha Gucci com Daria Werbowy diz sobre o futuro da marca e os rumos da moda
Depois de sete anos afastada dos holofotes, modelo e musa de Phoebe Philo na Céline retoma os trabalhos e indica possíveis mudanças de estilo para os desfiles de verão 2024.
Por essa ninguém esperava. Na manhã deste sábado (05.08), nossos feeds e stories foram dominados pela imagem de Daria Werbowy na nova campanha de alta-joalheria da Gucci – a primeira com direção criativa de Sabato De Sarno, estilista que substitui Alessandro Michele.
Na foto, feita em Los Angeles por David Sim, com styling de Alastair McKimm, a modelo aparece de cabelos e corpo molhados, com aparência natural e nada além de uma calcinha de biquíni preta e um brinco.
A modelo Daria Werbowy e o diretor criativo da Gucci, Sabato De Sarno, em 2003. Foto: Reprodução Instagram | @sabatods
O post original veio do próprio designer. Na legenda, ele escreve que Daria e ele iniciaram suas carreiras no mesmo ano, 2003, e por isso o comeback. “E aqui está você comigo no início dessa nova aventura”, nas palavras de Sabato. Sua primeira coleção para Gucci será apresentada no dia 22 de setembro, na semana de moda de Milão.
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Por que Daria Werbowy numa campanha da Gucci é surpreendente?
Bom, por alguns motivos. O primeiro é o retorno da modelo aos trabalhos – ela estava afastada/aposentada da moda desde 2016. O segundo é a marca responsável pelo comeback. Nos primeiros anos da década de 2010, Daria se tornou a principal representação da mulher Céline, quando Phoebe Philo era a diretora de criação e o acento gráfico estava presente no nome da casa.
A designer inglesa encontrou nos olhos de esfinge e no corpo atlético da modelo não só a figura perfeita para traduzir e vestir seu female gaze, como uma musa e quase sósia (fun fact: quando vi a foto pela manhã, achei que era um meme com a estilista).
A modelo Daria Werbowy, o fotógrafo Juergen Teller e a estilista Phoebe Philo. Foto: Reprodução
Phoebe Philo ajustando roupa de Daria Werbowy. Foto: Reprodução
Em 2021, Phoebe Philo anunciou o lançamento de sua marca própria e, desde então, já se especulava o retorno de Daria de alguma maneira. Sabe-se pouquíssimo sobre essa estreia, prevista para setembro. Não há informações sobre um possível desfile, uma apresentação em loja ou ateliê, nada. Apenas que o site da grife já está no ar para quem quiser se registrar para receber em primeira mão qualquer novidade.
Ah, outro detalhe importante: a Gucci é uma das principais marcas do grupo Kering. A etiqueta Phoebe Philo conta com a LVMH como investidora minoritária. Ou seja, não dá para descartar a provação e o joguinho de poder.
O que a campanha com Daria Werbowy indica sobre o futuro da Gucci
Bom, só especulação por enquanto, porém com pistas mais concretas. Que a imagem da Gucci passaria por um extreme makeover não é novidade. A limpeza visual foi colocada em prática no instante em que Michele encerrou seu contrato. A diferença, agora, é a indicação de uma suposta estética. No caso, um visual natural e glossy ao mesmo tempo, leve, solar, sem muitos excessos e distrações. Bem naquela vibe chique sem esforço, sabe? E bem mais sexy também. Ainda na fase Michele, a marca mostrava interesses gigantesco em recuperar elementos da era Tom Ford.
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Mas para entender melhor onde esse estilo pode levar a Gucci e boa parte do mercado de luxo, precisamos voltar no tempo e falar mais sobre o sucesso de Daria como modelo.
Quem é Daria Werbowy
Nascida na Polônia e criada nos arredores de Toronto por pais com ascendências ucraniana e canadense, Daria, 39, diz ter sido uma criança meio tomboy com predileção por atividades físicas a céu aberto. O fato de ela ser uma excelente velejadora está aí de prova.
Aliás, ela só não começou a competir profissionalmente porque ingressou na carreira de modelo aos 14 anos, após ser vista por um booker local em um shopping da cidade. Sua estreia nas passarelas de grandes marcas aconteceu em 2003 e não demorou muito para que ela se tornasse o nome mais quente do momento, sendo disputadíssima por marcas como Gucci, Prada, Versace, Chanel e Dior.
Daria Werbowy na sua primeira grande campanha: Prada, inverno 2003. Foto: Divulgação
Apesar do sucesso (ela é uma das modelos com o maior número de aberturas e fechamentos de desfiles em uma só temporada – foram 12 no verão 2004), Daria nunca ligou muito para a profissão. Em 2008, decidiu dar um tempo nos trabalhos, alegando cansaço físico e mental. Em entrevistas, ela falou sobre como o dinheiro e o materialismo da indústria a incomodavam.
Quando voltou, em 2013, foi nos próprios termos: só aceitava trabalhos que faziam sentido para ela ou que se alinhavam com seu ponto de vista sobre um tudo. Foi nessa época que Daria e Phoebe Philo estreitaram relações e produziram algumas das coleções e imagens mais reverenciadas dos últimos tempos.
Daria Werbowy em campanha da Céline. Foto: Divulgação
Dez anos antes, quando estourou nas passarelas, foram suas qualidades camaleônicas o principal atrativo para estilistas, fotógrafos, stylists e editores. Acontece que ela é muito mais. Foram sua imagem e sua atitude natural que a colocaram no topo do ranking de modelos. Era um visual simples, saudável e, sobretudo, objetivamente sincero.
O boom da Céline e o female gaze de Phoebe incorporado por Daria aconteceram na esteira da crise financeira de 2007/2008, quando o hoje infame termo quiet luxury surgiu. A praticidade e simplicidade continuavam em pauta, porém sem a frieza ou restrição aos básicos e clássicos.
Daria Werbowy em campanha da Céline. Foto: Divulgação
A ausência de detalhes e gestos espalhafatosos criou o contexto ideal para que as ideias de Philo, voltadas aos desejos e necessidades de muitas mulheres, pudessem se destacar.
Por que Daria Werbowy, Sabato De Sarno, Gucci e Phoebe Philo parecem tão importantes?
Não seria errado dizer que o retorno de Daria importa só pela beleza. Seria, sim, limitado, raso até. Ao lado de Phoebe, a modelo foi responsável por uma das principais mudanças de olhar, pensamento e comportamento na moda do século 21. Tipo divisor de águas mesmo.
Tudo bem que eram outros tempos, mas só a menção ao nome das duas causam expectativas por transformações similares. Não é novidade, a sensação de cansaço e saturação é assunto recorrente nas semanas de moda. Pelo menos desde que os eventos presenciais puderam ser retomados. Ideias e principalmente discursos sobre o próximo passo são vários, ações e resultados relevantes, contudo, são pouquíssimos.
Daria Werbowy em campanha da Céline. Foto: Divulgação
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A campanha de alta-joalheria da Gucci, com uma versão atualizada de um estilo que se mostrou alternativo no começo da década de 2010 para, depois, se provar dominante, pode ser interpretada como um sinal positivo de que o jogo finalmente pode virar. Afinal, ninguém aguenta mais a nostalgia Y2K e o tal quiet luxury voltou falando tanto e tão alto que todo mundo já se cansou.
Vem coisa boa por aí? Torcemos para que sim.
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