No quesito figurino do Oscar 2024, há deleite para todos os gostos e estilos fashionistas. Pesquisa histórica não falta, e entre Barbie, Pobres criaturas, Assassinos da Lua das flores, Napoleão e Oppenheimer, difícil dizer qual foi a mais minuciosa. 

Se criar o guarda-roupa da boneca mais polêmica e famosa do mundo parece coisa de criança, é bom lembrar que o acervo da Mattel remonta a 60 anos e milhares de roupinhas, packs de looks, acessórios e Barbies e Kens de todos os estilos e profissões. Em Pobres criaturas, a era vitoriana se misturou ao surrealismo e à alta-costura. Já em Napoleão, mais de 4 mil uniformes militares foram criados com a missão de remeter aos quadros pintados da época, e não a uma fantasia barata de soldado. Em Assassinos da Lua das flores, a preocupação foi retratar fielmente a indumentária da nação Osage, um povo nativo dos Estados Unidos, agregando elementos da moda da época. Finalmente, Oppenheimer é um show de ternos bem cortados.

A seguir, detalhes saborosos da confecção dos cinco figurinos indicados à estatueta dourada em 2024.

Barbie

Figurinista: Jacqueline Durran.
Quem é ela na fila de Hollywood? A britânica coleciona dois Oscar, um ganho em 2013, pelo figurino de Anna Karenina (2012), e outro por Adoráveis mulheres (2020), assinado por Greta Gerwig, diretora de Barbie. Foi daí que surgiu o convite para repetir a parceria. Na edição do Oscar do ano passado, Jacqueline foi indicada pelo figurino de Cyrano (2021). Ela também assinou o guarda-roupa de longas tão diversos quanto Spencer (2021) – um desfile de looks deslumbrantes vestidos por uma Lady Di interpretada por Kristen Stewart – e 1917 (de 2019), filme sobre a Primeira Guerra Mundial.
O figurino: Na Barbieland, claro, há muito rosa, mas não apenas. O ponto de partida da figurinista foram os packs de figurinos que vêm com as bonecas Barbie, em especial os mais antigos. Já a praia, no contexto da boneca, foi essencial para a cartela de cores e o mood de todos os looks. A inspiração vem da Barbie Malibu, surfista, lançada no fim dos anos 1970, misturada com uma atmosfera da Riviera Francesa do início dos anos 1960, segundo Jacqueline. Todas as 15 combinações de cores usadas em Barbieland, diz ela, vêm dessa referência, em tons pastel vibrantes combinados em trio: lavanda, azul brilhante, azul-claro; verde, laranja, bege; laranja, azul, rosa; e dois rosas e um amarelo. Brigitte Bardot é uma das musas inspiradoras das peças com toque retrô, tanto na praia quanto fora dela. Com 11 semanas para criar centenas de figurinos, Jacqueline contou com compradores que iam diariamente a lojas de Londres, onde ela mora, procurar peças e tecidos de cores específicas (a maioria do figurino foi criada do zero). Todos os looks têm inspiração no que já foi criado para a Barbie ao longo de 60 anos de história da boneca, mas algumas roupas são praticamente reproduções fiéis, caso do look caubói de Ken e da roupa de patinação de tons fluo usada tanto por “Barbie Robbie” quanto por “Ken Gosling”.
Preste atenção: Nos acessórios e looks Chanel que pipocam ao longo do filme. A figurinista diz que praticamente todas as roupas que ela não mandou fazer para o filme são da maison francesa, da qual Robbie é embaixadora. As peças são, na maioria, do acervo dos anos 1980 da grife.
Outras indicações: São oito, entre elas a de melhor filme, melhor atriz coadjuvante (America Ferrera), melhor ator coadjuvante (Ryan Gosling), melhor roteiro adaptado, canção original (“I’m Ken”, de Gosling) e direção de arte.

Pobres criaturas

Figurinista: Holly Waddington.
Quem é ela na fila de Hollywood? A britânica é a mais nova no circuito em relação às figurinistas concorrentes. Seu primeiro trabalho como figurinista-chefe é de 2013, com Jack, o caçador de gigantes. Um ano antes, foi assistente de figurino de Lincoln, de Steven Spielberg. Formada em belas-artes na The Ruskin School of Drawing and Fine Art, da Universidade de Oxford, começou a carreira na Angels Costumes, uma grande empresa fornecedora de figurinos para teatro, cinema e televisão em Londres. “Me inscrevi e trabalhei lá como figurinista de roupas femininas de época, aprendendo tudo sobre roupas históricas”, contou em entrevista ao Hollywood Reporter.
O figurino: “Yorgos Lanthimos (o diretor) não queria que o filme fosse como um drama de época, como um longa de ficção científica e muito fashion. O resultado é uma mistura de A época da inocência (1993), surrealismo e alta-costura”, resumiu Holly, em entrevista, na época do lançamento do filme. No longa, Bella Baxter (Emma Stone) é uma criação estilo Frankenstein, que evolui de uma criança ingênua para uma mulher sexual e politicamente liberada. O guarda-roupa da personagem tem como missão acompanhar sua evolução e ressaltar as características únicas de Bella. Para isso, a figurinista recorreu ao estilo da era vitoriana, mas numa versão mais leve, com tecidos fluidos, como seda, organza e cetim. A ideia, segundo ela, era criar uma interpretação, e não uma roupa totalmente fiel a um período.
Preste atenção: Nas mangas bufantes, inspiradas em um período curto dos anos 1890 em que foram usadas, diz a figurinista. Para o filme, ela criou versões mais exageradas, que, segundo ela, empoderam a personagem.
Outras indicações: São 11, entre elas a de melhor atriz (Emma Stone), melhor diretor (Yorgos Lanthimos), melhor roteiro adaptado, trilha sonora e direção de arte.

Assassinos da Lua das flores

Figurinista: Jacqueline West.
Quem é ela na fila de Hollywood? Nomeada ao Oscar por Duna (2021), O regresso (2015), O curioso caso de Benjamin Button (2009) e Contos proibidos do Marquês de Sade (2000), a estadunidense foi estilista antes de virar figurinista. Teve uma loja em Berkley, Califórnia, onde criava e vendia sua própria linha, chamada Identikit. Sua primeira incursão no cinema foi em Henry & June (1990). A partir de então, fez mais de 20 filmes, com diretores como Terrence Malick (com quem trabalhou várias vezes), David Fincher e Denis Villeneuve.
O figurino: Jacqueline se uniu a Julie O’Keefe, membro da nação Osage, que atuou como consultora cultural dos figurinos do filme. A história narra uma série de assassinatos de membros do povo nativo estadunidense Osage durante os anos 1920. A ideia foi combinar as raízes históricas das roupas tradicionalmente usadas pelos Osage com toques de modernidade e de moda da época, especialmente à medida que os personagens vão enriquecendo. A tecelagem manual típica dos Osage, o trabalho com fitas e os chapéus feitos de pele de lontra, assim como o colorido folclórico dos mantos, usados por cima de várias camadas de roupa, são típicos dessa cultura e estão presentes no longa-metragem.
Preste atenção: Nos casacos que são a indumentária de casamento das mulheres Osage, uma vestimenta exclusiva dessa nação, cuja descoberta impressionou e encantou a figurinista.
Outras indicações: São dez, entre elas a de melhor atriz (Lily Gladstone), melhor ator coadjuvante (Robert De Niro), melhor diretor (Martin Scorsese), trilha sonora e direção de arte.

Napoleão

Figurinista: Janty Yates.
Quem é ela na fila de Hollywood? A britânica é assídua colaboradora do diretor Ridley Scott. Contando com Napoleão, foram 15 longa-metragens realizados juntos. O primeiro, Gladiador (2000), rendeu a Janty um Oscar de melhor figurino – seu único, até agora. Além de Napoleão e Gladiador, fez outros filmes históricos do diretor, como Cruzada (2005) e Robin Hood (2010), ambos ambientados no século 12. Eclética, também criou figurinos de ficções científicas, como Alien: Covenant (2017) e Perdido em Marte (2015), também de Scott. Em 2021, vasculhou os arquivos da Gucci para criar o figurino de House of Gucci.
O figurino: David Crossman, especialista em figurinos militares, trabalhou ao lado de Janty para criar mais de 4 mil uniformes. A preocupação de David era de as cenas lembrarem às de quadros do período napoleônico que fizeram parte da pesquisa da dupla. Janty e David visitaram inúmeros museus, como o Victoria and Albert e o British Museum, em Londres, e lugares históricos, casos do Château de Fontainebleau, um refúgio real ao sul de Paris, o Musée de L’Emperi, que contém um grande acervo de uniformes militares franceses, e o Château de Malmaison, para onde Joséphine, a mulher de Napoleão, se retirou e morreu, em 1814. A figurinista conta que os 30 vestidos feitos para Joséphine tiveram toda a parte visível bordada à mão, para imprimir verossimilhança.
Preste atenção: Na cena da coroação de Napoleão e Joséphine Bonaparte. “Copiamos, literalmente, peça por peça, as roupas do quadro A coroação de Napoleão, pintado em 1807 por Jacques-Louis David”, disse Janty ao Los Angeles Times. Destaque também para os mantos de Joséphine e de Napoleão, que, segundo a figurinista, trazem exatamente o mesmo bordado que aparece na pintura.
Outras indicações: Efeitos especiais e direção de arte.

Oppenheimer

Figurinista: Ellen Mirojnick.
Quem é ela na fila de Hollywood? A estadunidense nunca havia sido indicada a um Oscar em seus mais de 40 anos dedicados ao cinema. E olha que ela coleciona figurinos de filmes icônicos em seu currículo. Para os nascidos até os anos 1980, basta dizer que Sharon Stone foi vestida por ela em Instinto selvagem (1992) na cena da famosa cruzada de pernas, em que ela não usa nada além de um vestido branco curto de gola alta. São também dela os figurinos de Atração fatal (1987) e Velocidade máxima (1994), outros blockbusters dos anos 1980 e 90. Na lista dos mais recentes estão Let them all talk (2020), de Steven Soderbergh, com quem trabalha frequentemente, e a série de época Bridgerton (2020), um megassucesso da Netflix.
O figurino: Em Oppenheimer, o foco são os ternos (calça, paletó e colete) e costumes (calça e paletó) dos personagens masculinos, especialmente o de Oppenheimer, que, na vida real, era conhecido por se vestir com elegância. Como Ellen contou ao Hollywood Reporter, o diretor Christopher Nolan não queria que o figurino fosse estilizado, por isso as diferenças entre as quatro décadas visitadas pelo filme (dos anos 1920 aos 1960) são sutis. “A ideia é se mover entre os períodos sem fazer referência a uma data específica, mas com a sensação de estar numa época distinta”, disse a figurinista.
Preste atenção: Ninguém, além do personagem de Oppenheimer, usa chapéu no filme. Esse foi um pedido feito a Ellen por Nolan.
Outras indicações: Campeão de nomeações este ano, Oppenheimer tem 13, entre elas melhor ator (Cillian Murphy), melhor ator coadjuvante (Robert Downey Jr.), melhor atriz coadjuvante (Emily Blunt), melhor direção (Nolan), melhor roteiro adaptado, melhor maquiagem e cabelo, trilha sonora e direção de arte.