Jean Patou: a história do estilista que levou o esporte à alta-costura

Se hoje elementos esportivos são essenciais na moda, é por causa de Jean Patou, estilista francês que, no começo do século 20, deu início a esse cruzamento de estilo.


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Jean Patou. Foto: Getty Images



Seu nome não é tão conhecido como o de alguns dos seus colegas da profissão, como Paul Poiret e Coco Chanel. No entanto, as criações do estilista e costureiro Jean Patou foram igualmente revolucionárias e também seguem influentes até hoje.

Início de carreira

Pai da roupa esportiva com toque de sofisticação e para além das práticas, Patou nasceu na França, no dia 19 de agosto de 1880. Sua família tocava um negócio focado em peles e curtimento de couro, na Normandia. E foi acompanhando o pai no dia a dia de trabalho que começou a se interessar por moda. Eis que, aos 30 anos, se mudou para Paris para ser aprendiz de costureiro.

O estilista Jean Patou escolhendo modelos.

O estilista Jean Patou selecionando suas modelos. Foto: Getty Images

Na cidade, além do conhecimento técnico, acumulou contatos de de clientes que demonstravam certa afeição por suas habilidades. Assim, dois anos depois da sua mudança para a capital francesa, abriu seu primeiro ateliê, o Maison Parry. Já nessa época, seu interesse por roupas usadas em variadas modalidades esportivas começou a influenciar suas criações de forma generalizada. E deu certo, esses artigos se tornaram o carro-chefe da casa.

Entretanto, com o início da Primeira Guerra Mundial, Patou teve de encerrar as atividades da maison. Seu retorno à moda só aconteceu um ano após o fim dos conflitos, mais precisamente em 1919, e com seu próprio nome à frente do negócio.

 

A maison Jean Patou e a moda esportiva

Jean Patou foi um dos responsáveis por transformar a maneira como as mulheres francesas dos anos 1920 se vestiam. Ao lado de Paul Poiret e Coco Chanel, engrossou o coro pelo fim do uso do espartilho, encurtou saias e apostou em um visual livre de excessos, sem muitas decoração e pautado por linhas retas.

Porém, sua principal contribuição foi o cruzamento entre a moda que se usava nas ruas e em eventos sociais com os trajes esportivos, em especial do tênis. Nos anos à frente da sua marca homônima, ele foi um dos pioneiros na criação do vestido-camisa (ou chemise), ajudou a popularizar o cardigã e trajes de banho mais confortáveis, sempre com suas iniciais monogramadas. 

Ilustrações de roupas de tênis criadas por Jean Patou

lustração de roupas de tênis da Maison Jean Patou. Foto: Getty Images

Ilustração de looks resort da Maison Jean Patou.

Ilustração de looks resort da Maison Jean Patou. Foto: Getty Images

Ilustração de traje da e banho da Maison Jean Patou.

IlustrIlustração de traje da e banho da Maison Jean Patou. Foto: Getty Images

Com ousadia e originalidade, ele desafiou as convenções da época ao incorporar formas e o conforto e praticidade do que se usava para praticar diversos esportes. Os materiais também tiveram papel essencial nessa história, em especial o jersey de seda. O tecido leve e flexível permitia maior mobilidade, se adequava às atividades físicas e não desapontava nas situações de mais pompa.

O flerte com elementos, até então, exclusivo do guarda-roupa masculino, é outra influência importante na identidade da Maison Patou. Entre as principais novidades introduzidas por ele está a gola polo dos uniformes de tênis, golfe e do polo. O detalhe passou a aparecer em vestidos, blusas e outras propostas do estilista.

A tenista Suzanne Lenglen com uniforme criado por Jean Patou

A tenista Suzanne Lenglen com uniforme criado por Jean Patou. Foto: Getty Images

A tenista Suzanne Lenglen com look da Maison Jean Patou.

A tenista Suzanne Lenglen com look da Maison Jean Patou. Foto: Getty Images

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Não à toa, o costureiro é apontado como um dos responsáveis pela popularização do estilo la garçonne. É aquele visual de cabelo curtinho, roupas leves e soltas e, para as mais ousadas, calças e blazers. 

Naquela época, a atividade esportiva e competição feminina ganhava mais popularidade e aceitação. E lá estava Patou com as melhores versões das vestimentas para as pioneiras atléticas. Uma delas foi Suzanne Lenglen, a primeira tenista alçada ao status de celebridade. O look desenhado para ela era composto de saia plissada na altura dos joelhos e regata de seda – um hit que influenciou mulheres dentro e fora das quadras.

 

O homem mais bonito da Europa

Jean Patou era dado à boêmia, porém nunca sem elegância. Sempre com roupas e aparência impecáveis, ganhou a alcunha de “homem mais bonito da Europa” pela imprensa de moda.

O estilista Jean Patou.

Jean Patou. Foto: Getty Images

Modelo em desfile da Maison Patou, em 1939.

Modelo em desfile da Maison Jean Patou, em 1939. Foto: Getty Images

Seu estilo se estendia à decoração das lojas. Nelas, promovia coquetéis para impulsionar a vendas de roupas, perfumes e cosméticos, como o óleo Chaldea, meio que um protetor solar antes deste ter sido inventado. E tinha também o bar de fragrâncias, dedicado à criação de perfumes sob medida e, claro, bons drinks. Já os desfiles, eram quase sempre noturnos, seguindo madrugada à dentro.

Charlie Chaplin (o terceiro à direita) e o estilista Jean Patou (o primeiro à direita, de costas).

Charlie Chaplin (o terceiro à direita) e o estilista Jean Patou (o primeiro à direita, de costas). Foto: Getty Images

O estilista Jean Patou no seu barco.

Jean Patou pilotando seu barco em lago na Alemanha. Foto: Getty Images

Viajante apaixonado, abriu lojas em Biarritz, Deauville, Cannes e Monte-Carlo, sempre junto a cassinos. Nelas, vendia roupas de resort bordadas com o logo da casa. É que ele não vendia apenas produtos de moda, mas um estilo de vida. Corrida de carros, cavalos, passeios de lancha e romances de verão faziam parte do seu cotidiano de bon vivant.

 
Perfumes

Em 1929, com crise desencadeada pela queda das bolsas de valores nos EUA, Jean Patou percebeu que precisava expandir seu portfólio de produtos. A solução? Perfumes. Foi graças a eles que sua maison atravessou a década de 1930. E nessa história, a protagonista é a fragrância Joy. 

O perfume Joy de Jean Patou.

O perfume Joy de Jean Patou. Foto: Reprodução

Com notas de rosas e jasmim e frasco desenhado sob influência do movimento art déco, o Joy se tornou um best seller e já foi considerado o perfume mais caro do mundo. Ainda assim, se tornou a porta de entrada para consumidores desesperados pelo lifestyle de Patou e suas clientes, porém sem meios para bancar uma peça de alta-costura. Outros perfumes da Maison Patou são o Amour Amour e Cocktail.

 

Patou sem Jean

Em 1936, Jean Patou morreu vítima de um derrame aos 48 anos, em seu apartamento na Avenida George V. Após o falecimento, sua família tentou manter a marca de pé com a contratação de profissionais renomados. Um deles foi Marc Bohan, então com apenas 18 anos. Ele comandou a alta-costura da Maison Patou entre 1954 e 1958, antes de migrar para a Dior. Depois dele, veio Karl Lagerfeld, que logo recebeu louros pelos vestidos longos esvoaçantes que apresentou. 

Karl Lagerfeld e modelo com suas criações para a Maison Jean Patou.

Karl Lagerfeld e modelo com suas criações para a Maison Jean Patou. Foto: Getty Images

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Em 1963, Lagerfeld deixou o posto e foi substituído pelo estilista Michel Goma. E em 1972, o então diretor de criação ganhou um assistente cheio de talento: Jean Paul Gaultier. Sua estadia lá, no entanto, foi curta. Em 1974, o enfant terrible deixou a marca para trabalhar com Pierre Cardin.

O estilista Christian Lacroix e modelo com criações suas para a Maison Jean Patou

O estilista Christian Lacroix e modelo com criações suas para a Maison Jean Patou Foto: Getty Images

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O último designer de renome na Jean Patou do século 20 foi Christian Lacroix, dando um último respiro de ousadia e explosão de cores, texturas, formas inesperadas e estampas. Em 1987, Lacroix encerrou seu contrato para lançar sua própria maison, financiada pelo grupo LVMH.

Look da marca Patou, coleção verão 2024

Patou, verão 2024. Foto: Getty Images

Guillaume Henry, diretor de criação da Patou, ao fim do desfile de verão 2024 da marca.

O atual diretor criativo da Patou, Guillaume Henry. Foto: Getty Images

Depois disso, a casa interrompeu suas atividades de alta-costura e prêt-à-porter, mantendo apenas a linha de perfumes. Até de 20181, quando a LVMH comprou a marca Patou (agora sem o Jean). Para comandar a nova fase, a empresa escolheu o estilista Guillaume Henry (ex-Nina Ricci e Carven).

Sua estreia foi a coleção de verão 2020, apresentada no showroom da grife, em setembro de 2019. Sua principal proposta é trazer o olhar de elegância da alta-costura para roupas do dia a dia com um toque extra de sofisticação e glamour.

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