​Uniforme é a palavra da temporada

Colegiais, esportivos, de luta ou até os formados por peças essenciais, entenda por que fardamentos estão em alta e parecem ser a aposta de todo e qualquer diretor criativo.


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“Em todos esses meses, o que eu mais conversei com Miuccia foi sobre uniformes”, revelou Raf Simons, após apresentar a sua primeira coleção na Prada, durante uma conversa depois do desfile. Desde que se juntou, a dupla tem falado sobre eles repetidamente, no entanto, não no sentido literal. “Não é sobre uniformes de policiais, soldados ou bombeiros, mas sobre os que funcionam como base para a construção de um estilo, de uma identidade”, completou o belga. Raf e Miuccia não são os únicos obcecados por essa ideia. Nas últimas temporadas, uniforme parece ser a palavra da vez no discurso de qualquer diretor criativo.

Paul Andrew, por exemplo, faz parte desse time. O estilista inglês, que vinha em busca de novos direcionamentos para a Salvatore Ferragamo, estava mirando nos essenciais a fim de reposicionar a etiqueta na indústria contemporânea. A recente ascensão de Peter Do, formado na escola essencialista de Phoebe Philo, e a volta da conhecida parceria entre Jil Sander e Uniqlo também são sinais deste novo momento.

Porém, há ainda um outro lado nessa história. Aqueles que não estão falando sobre uniformes seguindo este conceito 一 já muito bem explicado por Raf Simons, aliás 一, estão ocupados falando sobre eles em seu sentido literal. Sim, fardas colegiais, esportistas e até de luta. E a temporada de Inverno 2021 não nos deixa mentir. Imergindo por alguns universos já visitados anteriormente pela moda, diferentes marcas estão propondo novos olhares para os fardamentos. Seja em qual sentido for.

Uniformes colegiais

Dior, inverno 2021.

Dior, inverno 2021.Divulgação

Em tempos de ensino remoto, uniformes escolares podem fazer parte de uma realidade não muito próxima 一 e talvez, seja justamente por isso que eles apareceram com tanta ênfase na última temporada de desfiles. Na vontade de resgatá-los do fundo do armário o mais rápido possível, estudantes de diferentes países parecem se apegar à estética colegial, mas não como a que muitos de nós, provavelmente, vivemos. Agora, carregada de referências saídas diretamente dos filmes e séries de ensino médio, o look passa a ser mais atraente, incluindo saias pregueadas, coletes de tricot, cardigãs felpudos, camisas com gravata e oxfords acompanhados por meias até o joelho.

Quem seguiu à risca esse conceito foi Maria Grazia Chiuri. À frente da direção criativa da Dior, a italiana decidiu revisitar o uniforme colegial com o olhar dos anos 1950, propondo novas silhuetas para as peças e se apoiando nos figurinos de algumas das mais clássicas obras da literatura. Pelas passarelas de outras etiquetas, o colete de tricô foi um elemento importante para a estética escolar se estabelecer. Sendo uma aposta da Valentino, Versace e Ganni, a peça já é observada pelas mídias sociais e, certamente, não irá embora tão cedo. Blair Waldorf estaria orgulhosa.

Uniformes esportivos

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Philosophy di Lorenzo Serafini, inverno 2021.Divulgação

Os uniformes colegiais ainda abrem espaço para uma outra seção, as peças esportivas usadas pelas ligas do ensino médio. Para alguns, a referência pode até ser específica demais, mas essa já é uma estética conhecida e, no inverno 2021, a Philosophy di Lorenzo Serafini pareceu determinada a resgatá-la da maneira mais atual possível. A inspiração não é à toa. O designer revelou que, durante a pandemia, tem pensado constantemente em todas as experiências perdidas pelos jovens neste momento. “Essa coleção é uma homenagem às memórias que eles não podem ter”, afirmou em comunicado.

O imaginário da marca se afasta de qualquer rigidez colegial e encontra o frescor atlético, colocando o dinamismo em primeiro lugar, palavra que, segundo o próprio Lorenzo, foi essencial para o desenvolvimento da coleção. Ou seja, as camisas e calças perdem o status engomado e passam a se desconstruir entre aplicações esportistas, celebrando os jovens que quebram regras. Na contramão, a Boss também revisita o atletismo juvenil, porém com peças de alfaiataria em tons neutros, dando-lhe uma elegância como poucas vezes vista em uniformes.

Para além de atléticas, a moda também anda flertando com o futebol, e não é de hoje. Essa já é uma referência antiga para Thom Browne, que já lhe rendeu colaborações com grandes times por aí, apareceu na Miu Miu e é ainda uma aposta recente da Balenciaga. Entre esses e outros movimentos, o que se observa é que as camisas do esporte passaram a ter um status semelhante ao das camisetas de banda. Para muitos, pouco importa para qual time você torce, o legal é colecionar os uniformes mais raros e diferentes, fazendo deles um item de moda.

E se você acessou o TikTok recentemente, sabe bem que os uniformes esportivos não param por aí. Mesmo que muitos não saibam nem como segurar uma raquete da maneira correta, a nova obsessão dos integrantes da Geração Z é pelo tênis. Aliás, ainda no início da pandemia, essa foi indicada como a alternativa mais segura de esporte a ser exercida. Segundo dados do Physical Activity Council, a aprovação dos especialistas de saúde proporcionou ao tênis um aumento de 22% na prática da atividade, ao longo de 2020, na América do Norte. O número pode até ser expressivo, mas na internet, a indicação não foi recebida tão bem 一 e há razões para isso.

Sendo inicialmente praticado pela realeza da Inglaterra lá no século 19, o tênis segue, hoje, como um esporte para poucos e é claro que surgiriam memes ironizando a pouca acessibilidade da recomendação. No entanto, se, há tempos, essa é uma atividade elitizada, a juventude parece agora empenhada em democratizar, ao menos, os seus uniformes. Minissaia plissada, camisa polo e um moletom estrategicamente posicionado caindo pelas costas se tornou o novo look oficial do TikTok. Na plataforma, a hashtag #TennisSkirt já acumula mais de 60 milhões de visualizações, entre vídeos mostrando como costurar a sua própria versão da peça e exibindo as suas referências favoritas da estética.

Uniformes de luta

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Balenciaga, inverno 2021.Divulgação

De volta à temporada de inverno 2021, dois nomes falaram sobre uniformes de uma forma que, até então, não estava sendo observada. À frente da Vetements, Guram Gvasalia decidiu olhar para o estágio da morte. Para ele, antes da chegada ao céu, cada um precisa passar pelo inferno e, foi pensando nisso, que o designer desenvolveu peças capazes de enfrentar esse ciclo. Adicionando elementos de uniformes projetados para a luta física, como camadas protetivas e toucas ninjas, Guram idealizou o que ele entende como a força das trevas e a transformou em uma coleção.

Já o seu irmão, Demna Gvasalia, atualmente na direção criativa da Balenciaga, foi ainda mais longe. Apresentando a sua coleção através de um videogame, o estilista criou um novo universo com os mais variados panoramas, indo da loja da marca até cavernas apocalípticas. Nesse mundo virtual, armaduras medievais ganham a cena, acompanhadas até por jaquetas espaciais semelhantes aos antigos fardamentos da NASA. Sobreviver em meio a uma pandemia não é uma tarefa fácil e os irmãos Gvasalia parecem prontos para qualquer cenário.

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