8 marcas do Rio Grande do Sul para conhecer e apoiar
Entenda como a tragédia climática impactou a moda local e o que as pequenas marcas do Rio Grande do Sul estão fazendo para se reerguer.
A tragédia climática que assolou o Rio Grande do Sul nas últimas semanas continua causando estragos. “No estúdio onde moro com a minha mãe, a água chegou a mais de três metros, fomos resgatados no telhado”, relata Rafael Zahn, designer a frente da Wayward Caps, sobre a situação em Canoas.
O estúdio da Wayward Caps, após a enchente. Acervo pessoal
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De acordo com o último boletim divulgado pela Defesa Civil, as fortes chuvas e enchentes afetaram 469 municípios, deixando 63.918 pessoas desabrigadas, 581.638 desalojadas, 806 feridos e 163 mortes confirmadas. “Vimos cenários devastadores, tanto em Porto Alegre como nas outras cidades, afetando amigos, familiares e parceiros”, conta Vinícius Kniphoff, fundador da marca Okoko & Abel.
Apesar de nem todas as marcas do Rio Grande do Sul terem sido atingidas diretamente pelas águas, o impacto da tragédia climática na indústria de moda local é enorme. “Temos fornecedores e funcionários embaixo d’água até hoje (22.05)”, diz Cristiano Bronzatto, da Louloux Shoes, de Novo Hamburgo. “Somado a isso, a logística foi bastante afetada, assim como o fornecimento de matéria-prima”, continua ele.
Com rifas, lucros destinados aos afetados pela tragédia e outras ações solidárias, as pequenas marcas do Rio Grande do Sul estão encontrando maneiras de se manterem vivas neste momento difícil. No intuito de apoiá-las, iremos dedicar espaço as pequenas marcas do Rio Grande do Sul, começando por oito delas, a seguir:
Oito marcas do Rio Grande do Sul para conhecer e apoiar:
Wayward Caps
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A marca surgiu despretensiosamente em 2015, quando o então skatista Rafael Zahn começou a fazer seus próprios bonés. “Sempre colecionei, mas tinha dificuldade de achar tamanhos, na época eram todos muito pequenos, principalmente five panel (nome dado aos modelos compostos por 5 painéis costurados)”, conta ele.
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Como já tinha familiaridade com a costura, o gaúcho de Canoas comprou uma máquina doméstica e passou a produzir suas próprias peças com retalhos de tecido. “Era bem precário, cortava as abas na mão e fui criando os bonés sem um plano de negócio ou a pretensão de lançar uma marca”.
Quando uma chuva de granizo atingiu sua casa, em 2015, ele repensou. “Precisei trocar o telhado, então coloquei 13 peças a venda no Instagram e esgotou em 12 horas”. Assim nasceu a Wayward, que hoje também oferece roupas, num processo 100% upcycling. “Gosto de usar materiais diferentes. Já fiz boné de guarda-chuva, de colchão inflável, cortina, uniformes e roupas antigas, sempre levantando a bandeira do reaproveitamento”, explica.
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Com as fortes chuvas, sua casa e estúdio ficaram alagados, desalojando a família, mas Rafael vem trabalhando na recuperação de danos. “Estou transportando mantimentos e resolvendo a situação da minha família porque a água ainda está bem alta”, relata o designer. “Perdi todos os meus rolos de tecido, meu estoque de inverno, as outras máquinas retas, overlock, tudo estava ali”.
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Ainda assim, Rafael tem oferecido pequenos reparos sem custo para quem recebeu doações de roupas e lançou uma rifa solidária pela Wayward, com o pequeno maquinário e tecidos que conseguiu resgatar de um prédio não atingido. “É uma medida emergencial para esse momento em que precisamos de gasolina para locomoção de barco, comida e água”, conta.
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A ideia não é pedir doações, mas retribuir de alguma forma. “Pretendo aumentar o valor da rifa e estou trabalhando para fazer esses envios assim que possível e futuramente dar um prêmio maior para quem está nos apoiando neste momento”.
Okoko & Abel
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Fundada em Porto Alegre por Vinícius Kniphoff e Ana Sabi, a marca surgiu em 2015, após a dupla ficar em primeiro lugar num concurso promovido pela Associação Brasileira do Calçado, com foco em inovação. “Foi aí que começamos a nos profissionalizar na área e a aprender junto com artesãos experientes, já em um formato laboratorial da Okoko”, conta Vinícius.
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Com formação em design gráfico, a marca desenvolve calçados e acessórios com foto na estamparia. “Nossos produtos têm sempre uma imagem bem gráfica, acreditamos que calçados e bolsas devam ser encarados como itens significativos de design e com poder de protagonismo”. Ao lado de pequenos ateliês, a dupla trabalha com drops pontuais. “Nosso intuito não é gerar produtos que fiquem parados em estoque ou sejam descartados por falta de interesse do público”. Por isso, é comum que as peças se esgotem assim que lançam.
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A Okoko também está sofrendo com o impacto da tragédia climática, já que Porto Alegre foi um dos pontos mais atingidos. “A cidade ficou praticamente ilhada, com apenas uma via terrestre de acesso aos nossos ateliês parceiros e sem aeroporto”, explica o designer. “Para ter uma ideia, o acesso a um dos nossos ateliês mais importantes, que fica normalmente a 45 minutos de distância da sede, se transformou em uma viagem de seis horas”.
Hoje a dupla está trabalhando para restaurar o negócio. “Com a água baixando, foi possível acessar nossos ateliês, mesmo que com dificuldade, assim começando a reorganizar os estoques”, diz Vinícius. Os envios estão sendo feitos via Sedex pelos Correios, com pequenos atrasos, já que os despachos foram redirecionados a Curitiba, no Paraná.
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“Apesar de tudo, no momento só agradecemos que nossos parceiros, familiares e amigos estejam seguros, e pela sorte de ter clientes compreensíveis e carinhosos em um momento tão complicado”, afirma. “Enquanto escrevemos para vocês, segue chovendo em Porto Alegre”.
Dois Maridos
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Fruto da união amorosa entre Bruno Kruger e Douglas Saft, a Dois Maridos é uma gravataria artesanal baseada em Campo Bom, região metropolitana de Porto Alegre. “Lançamos a marca inicialmente como um blog pessoal do casal, em 12 de junho de 2015, no dia dos namorados”, conta Douglas. “Em novembro do mesmo ano, iniciamos as vendas de gravatas borboletas”.
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Enquanto Bruno coordena a parte administrativa e de marketing, Douglas se concentra na criação. “Seguimos o conceito do slow fashion, confeccionando gravatas e acessórios agênero”, define o designer. “Todos os nossos produtos são confeccionados por nós, sob demanda, com muito amor no fazer, cuidado e atenção nos detalhes e acabamentos”. Desta maneira a marca consegue evitar o desperdício de matéria-prima e incentivar os clientes à um consumo mais consciente.
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O impacto das enchentes ainda está sendo percebido ao decorrer dos dias. “Não fomos atingidos diretamente pelas águas, nossa casa e o ateliê ficam em uma região mais alta da cidade”, explica Douglas. “De imediato o que nos afetou como empresa é o fornecimento e compra de matérias-primas e envio de nossos pedidos”.
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Com a maioria dos fornecedores fechados, eles estão repensando alguns produtos, atualizando peças com o que restou de material e realizando compra de materiais de fora do estado. “Desde o início dos acontecimentos estamos engajados com a nossa comunidade procurando ajudar da forma que podemos”, conta Bruno. “Tem muita gente precisando de ajuda e muito o que fazer, então estamos entendendo as necessidades e vendo de que forma conseguimos colaborar, como ajudar na limpeza das casas, doar roupas, pix e outros trabalhos voluntários”.
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Louloux Shoes
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Cansado da mesmice e da cultura de cópias na indústria calçadista, Cristiano Bronzatto pediu demissão da companhia de exportação onde trabalhava, em 2006, para lançar uma pequena marca de sapatos com design genuinamente brasileiro, em Novo Hamburgo. “Vim de uma família de lojistas de calçados, minha mãe atua até hoje, então o produto fez parte da minha vida desde sempre”, conta.
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Para Cristiano, a liberdade criativa está acima de tudo. “O conceito é meio que não ter conceito, não ter um estereótipo de cliente, e sim, sapatos agradáveis ao olhar”, afirma. “As peças são muito intuitivas, temos o improviso como combustível, trabalhamos exclusivamente com o excedente de produção da grande indústria, num modelo de produção sustentável.
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Atualmente a Louloux Shoes trabalha com produtos sob encomenda, lançando mini drops de novidades quase diariamente. Apesar da sua fábrica não ter sido afetada diretamente pelas enchentes, a cadeia produtiva sofreu um forte impacto. “Temos fornecedores e funcionários embaixo d’água até hoje (22.05), somado a isso a logística foi bastante afetada, o que é muito ruim para quem trabalha no formato digital, onde se espera um imediatismo”.
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Por isso, Cristiano está concentrando os esforços em manter seus clientes interessados e não interromper a produção ou cancelar pedidos de fornecedores. “Precisamos que eles tenham saúde financeira para seguirmos adiante juntos, então tentamos manter todos informados do tamanho da catástrofe que estamos vivendo, parafraseando Jorge Furtado, ‘ela não cabe na tela’”.
Aragäna Concept
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A marca surgiu em 2008 para realizar um sonho entre os amigos Martin Valls, Rita Escobar, Fernando Fittipaldi e Giovana de Bem. “Antes de sermos sócios, todos nós já tínhamos uma relação de amizade muito forte e a moda sempre esteve presente nas vidas de cada um de diferentes formas”, conta Rita. “Essa é a forma que encontramos para fazer algo que nos move e inspira”, continua ela.
Com sede em Porto Alegre, a Aragäna desenvolve roupas para mulheres e homens, bem como calçados e acessórios como mochilas, bonés, carteiras e pochetes. “Acreditamos em produtos atemporais de qualidade, que vão acompanhar os nossos clientes por muito tempo”, define Rita.
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Logo que as enchentes começaram a invadir o centro da cidade, no dia 3 de maio, o grupo correu para esvaziar seu escritório e estoque. “Depois desse dia, não conseguimos mais acessar o prédio por 14 dias, devido a inundação”, relata Rita. “Ainda estamos entendendo o tamanho do estrago, mas o importante é que toda a nossa equipe e nossas famílias estão seguras e bem”.
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Depois de uma semana ajudando em abrigos como voluntários e se envolvendo em doações, os sócios retomaram o foco no negócio. “Estamos com um desconto progressivo no ar para incentivar as vendas e conseguir minimamente retomar o fluxo de caixa”, explica ela, que também montou uma rede de apoio para incentivar outras marcas gaúchas. “Mesmo que alguma marca não esteja em um local atingido pela enchente, todas estão sofrendo para se restabelecer”.
Demgo
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A designer e historiadora Débora M. Goldenfum criou a marca de joias em 2018, com foco na sustentabilidade. “Utilizo metais reciclados de diferentes fontes, como utensílios, joias e fivelas antigas, sobras de produção e até mesmo metais contidos em placas de raio-x, que passam por um procedimento de desmanche e purificação para serem reaproveitados com qualidade”, explica ela.
Cada joia tem como base a prata 925 reciclada, podendo receber um banho de ouro 18k. “O metal pode ser derretido e transformado inúmeras vezes, o que me permite trabalhar com uma matéria-prima de reuso sem que ele perca a sua qualidade ou durabilidade”, diz Goldenfum.
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Entre as marcas do Rio Grande do Sul que sofreram um impacto indireto com as enchentes, a Demgo também está calculando os danos. “O estoque do e-commerce está todo em Porto Alegre e com o fechamento das entradas e saídas da cidade, ficamos impossibilitados tanto de receber os produtos dos nossos fornecedores quanto de enviar para lojas parceiras e clientes finais”, conta a designer.
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Como uma alternativa para manter a saúde financeira durante esse período, a Demgo criou simultaneamente uma campanha de comunicação para doações, indicando diariamente opções confiáveis de destino, e uma campanha de incentivo de compra na loja online através de cupom de desconto.
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A marca também participa da campanha Maior Rifa Solidária do Brasil, encabeçada por marcas amigas e o Roupartilhar, numa ação com mais de 100 designers da moda nacional envolvidos para arrecadar fundos para ajudar na reconstrução do nosso Estado. “Ainda estamos trabalhando no desenvolvimento de um projeto em conjunto com marcas, agências de influenciadores e influenciadores para criar um plano de divulgação contínuo para as marcas afetadas pelas enchentes”.
Another Label
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“A Another Label é pensada para mulheres com muita personalidade, autoconfiança e sensualidade, sem rótulos que limitam a individualidade de cada uma”, afirma a diretora criativa Julia Pereira sobre a marca fundada em Porto Alegre, em 2023. “O propósito da ANHL é levar moda conceitual para mulheres por meio de um design contemporâneo e recortes que destacam a beleza natural do corpo feminino”.
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A alfaiataria é o carro-chefe da marca, mas Julia trabalha com todo tipo de tecido. “Gosto de entender o caimento que cada material tem, como se cada fibra uma personalidade e ditasse como a peça vai se comunicar”, conta ela. Com a produção afetada pelas enchentes, a marca ainda está sem previsão para o lançamento da próxima coleção e reposição de estoque. “Além disso, os Correios continuam parados no Rio Grande do Sul e muitas entregas estão atrasadas”.
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Enquanto isso, Julia e o marido estão se concentrando nas questões solidárias. “Pausamos por um tempo nossa comunicação nas redes sociais como forma de respeito às pessoas que estavam sofrendo com as enchentes”, explica ela. “Estamos atuando desde o primeiro dia como voluntários, arrecadando doações, ajudando nossas costureiras e muitas outras famílias, além de estar na linha de frente da produção de marmitas e nos resgates”.
Plano Piloto
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Comandada por Sergio Amaros, a marca de Porto Alegre surgiu em 2019 mixando o streetwear com a alfaiataria em suas criações. “Acredito que minhas referências vêm muito das pessoas que estão ao meu redor, adoro olhar a rua e quem está nela”, conta o estilista.
Além de experimentações com materiais pouco prováveis, como estofado de sofá, a Plano Piloto desenvolve coleções inspiradas em práticas e atitudes cotidianas, sempre com pegada minimalista e alguma funcionalidade. “Gosto de trabalhar modelagens que exploram o espaço entre o corpo e a roupa, mas tenho me arriscado em produtos que estejam mais em contato com a pele ”.
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Sua nova coleção também aborda a tragédia climática no Rio Grande do Sul. “O lançamento seria no dia 06.05, mas a situação não permitiu, ficamos 100% do tempo envolvidos nisso e todo o resto ficou em segundo lugar”, conta ele. “Neste lançamento teremos uma ação solidária para ajudar fisicamente e financeiramente os atingidos pela enchente”.
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Desta maneira, 20% do valor de cada produto vendido será doado conforme a necessidade do momento. “O cliente receberá um email em até dois dias úteis com a prestação de contas para onde sua doação foi encaminhada”, explica Amaros. A coleção destaca as modelagens características da marca em vestidos, casacos grossos, calças, camisas e saias.
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