Quem e o que marcaram a SPFW N58

Principais desfiles, melhores coleções, estreias, retornos e alguns tropeços da SPFW N58.


Modelos no camarim do desfile da Normando na SPFW N58.
Normando. Foto: Agência Fotosite



A SPFW completa 30 anos em 2025, com algumas mudanças já esperadas. Algumas delas, no entanto, puderam ser percebidas na edição terminada na última segunda-feira (21/10).

Pode-se dizer que a semana de moda paulista nasceu da pergunta: “Onde eu compro?”. Ela partiu da empresária Cristiana Arcangeli, então no comando da Phytoervas, para Paulo Borges, hoje fundador e diretor criativo do evento. Era 1992, e a marca de produtos para cabelos havia acabado de patrocinar a final do concurso de modelos Look of the Year, da agência Elite. A produção foi assinada por Paulo, que decidiu usar apenas roupas de estilistas nacionais. Sua resposta foi de que não havia onde comprar. “São criadores novos que não conseguem crescer, pois falta espaço”, disse.

Ali, ele percebeu o início de um interesse coletivo. “Mas a gente precisava construir uma cultura de moda. Era necessário trazer conhecimento sobre o assunto.” A primeira edição do que hoje conhecemos como SPFW aconteceu no primeiro semestre de 1995.

Look João Pimenta, desfilado na SPFW N58.

João Pimenta. Foto: Agência Fotosite

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Paulo costuma dizer que a empreitada só vingou porque todo mundo quis. “Só deu certo porque todo mundo queria fazer: os estilistas, as agências de modelo, os maquiadores, os jornalistas, os compradores. Todo mundo se engajou e aprendeu junto”, afirmou, em entrevista ao Volume 16 da ELLE impressa.

Em outras palavras, havia um desejo generalizado de transformação. Ao longo de três décadas, ocorreram movimentos semelhantes – da organização de um calendário de lançamentos antecipado à sua substituição por outro mais imediato, da formação de grandes empresas de moda à proliferação de negócios independentes, com produção decididamente reduzida.

Embora não tão coletivas (é complicado falar em coletividade com os horários praticados, muitas vezes desrespeitados em mais de duas horas), vontades e movimentações similares se manifestaram na SPFW N58. Depois de um período de inércia, teimosia e estagnação, algumas marcas demonstraram maior comprometimento comercial com as apresentações.

Os destaques da SPFW N58

Recursos de styling desnecessários, daqueles que mais confundem do que ajudam, foram deixados de lado em prol de uma imagem mais coesa e objetiva. O samba de uma nota só desgastado das narrativas pré-fabricadas foi, em certa medida, colocado a serviço do produto ou adaptado às experiências e demandas individuais de cada estilista. Passaram por essa equação: Artemisi, Ateliê Mão de Mãe, Catarina Mina, Dendezeiro, Foz, Walério Araújo e Weider Silveiro.

A semana contou ainda com retornos notórios, como os das marcas À La Garçonne (com uma das melhores alfaiatarias da estação), Herchcovitch;Alexandre e Salinas. A marca de beachwear não pisava nas passarelas há seis anos. Desde 2011, sob o guarda-chuva da InBrands, iniciou um processo de reposicionamento em 2023 e se valeu do potencial comunicador da plataforma de desfiles para mostrar suas novas aspirações glamourosas.

Weider Silveiro SPFW N58

Weider Silveiro. Foto: Agência Fotosite

A volta da etiqueta homônima de Alexandre Herchcovitch ocorreu por motivos semelhantes. Suas duas apresentações anteriores foram na Casa de Criadores. Em entrevista à diretora de redação da ELLE, Susana Barbosa, o estilista explicou que a decisão não foi motivada pelo nome ou reputação do evento, mas sim por sua visão sobre a melhor maneira de apresentar uma coleção.

Alexandre teve pouco mais de 45 dias para preparar o desfile de abertura da SPFW N58. Seu anterior, em agosto, foi marcado por roupas bastante sofisticadas. São peças que custam caro, demoram para ser feitas e tendem a ser difíceis de vender devido ao preço e ao público. A solução foi aplicar o mesmo raciocínio a opções mais casuais: jeans recortados, blazers levemente acinturados e calças boca de sino, tudo sob um ponto de vista particular do estilo dos anos 1970.

SPFW N58: Herchcovitch;Alexandre, verão/outono 2025

Herchcovitch;Alexandre. Foto: Agência Fotosite

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Ajustes comerciais desse tipo também foram observados nas coleções de Lucas Leão e João Pimenta. Lucas ficou conhecido por suas experimentações tecnológicas, muitas delas inviáveis para o varejo – algumas sequer existiam fisicamente, eram 100% digitais. Desde a estação passada, o fluminense está focado no aprimoramento de uma alfaiataria com cortes geométricos e proporções amplas. Qualidades agora mais bem trabalhadas e desejáveis.

João Pimenta divide suas atividades entre criação de moda e figurino. Neste ano, no entanto, ele decidiu dar um tempo no teatro para se “dedicar mais aos meus clientes, à pesquisa têxtil e ao desenvolvimento de produtos”, diz. O resultado é sua coleção mais comercial e tecnicamente madura. Na contramão da apresentação anterior, carregada de volumes e sobreposições de camadas, a imagem agora é leve, com formas mais controladas, precisas e um tanto de pele à mostra.

A grande estreia

Entre as estreias, menção honrosa para a chegada da Normando. A dupla de criadores formada pelo fotógrafo Emidio Contente e pelo estilista Marco Normando já tinha um desfile independente programado quando veio o convite para integrar o line-up da semana de moda. Em entrevista ao Volume 17 da ELLE impressa, o designer comentou ser fã confesso das passarelas. Para ele, não há formato mais eficaz.

Na abertura, a introdução da ópera O Guarani, de Antônio Carlos Gomes, foi uma das coisas mais chiques já vistas/ouvidas nos últimos anos do evento. É uma representação precisa da inteligência e do conhecimento envolvidos nos processos da marca. Desde 2020, o duo fala de Brasil, não por estratégia, mas pela simples impossibilidade de fazer diferente.

Looks do desfile da Normando na SPFW N58

Normando. Foto: Agência Fotosite

Nada na coleção é gratuito, nem o jeans e a camiseta. O denim não é denim, é um tecido feito de fibras de juta, algodão e malva. A estampa Academia do Peixe Frito faz alusão à associação e ao movimento literário criado por intelectuais paraenses nos anos 1920 – eles adoravam se vestir como dândis, daí a inspiração para a alfaiataria. O look marinheiro faz referência ao porto de Belém (cidade natal de Marco e Emidio) e à confluência cultural que surge desse lugar.

Ninguém precisa saber de tudo isso para apreciar ou desejar aquelas roupas – elas independem de narrativas e se sustentam por si só. E agora contam com uma frente mais ampla de ofertas. Se a alfaiataria salta aos olhos, a porção casual chama ainda mais atenção. São a parte menos conhecida, mais inovadora e que evidenciam o potencial de crescimento do negócio.

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