Balenciaga pre-fall 2024: a Hollywood de Demna e a estratégia comercial do desfile em Los Angeles

Para apresentar a coleção de pre-fall 2024, a Balenciaga fechou uma rua de Los Angeles com vista privilegiada para o letreiro de Hollywood. Para além das memórias do diretor de criação, Demna, saiba o que significa o mais recente desfile da marca.


Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.
Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images



Na tarde de sábado (02.12), a Balenciaga fechou uma rua de Los Angeles para seu desfile de pre-fall 2024. A via era a Windsor Boulevard, conhecida por seus (ex)residentes de renome, como a família Getty e Chandler, e principalmente pela vista privilegiada para o letreiro centenário de Hollywood.

Com o asfalto como passarela, convidados sentados próximos à calçada e um cartão postal como cenário, a coleção é uma interpretação de Demna, o atual diretor de criação da marca, sobre os estilos da cidade. É um exercício comum ao estilista. Em estações anteriores, ele já se debruçou sobre o que vestem políticos, turistas, executivos e clubbers. 

A diferença, agora, está na notoriedade do objeto de estudo (os looks de celebridades são dissecados incessantemente) e a provação – a falta ou impedimento dela.

Por que Los Angeles?

Em entrevistas, Demna, o atual diretor de criação da marca, afirmou que a cidade californiana foi essencial à sua formação cultural. Mas não é só isso. A influência da indústria do entretenimento hollywoodiana é irrefutável, inclusive no consumo e mercado de moda.

A primeira loja da Balenciaga em LA foi aberta em 2008, quando Nicolas Ghesquière (hoje na Louis Vuitton) ainda era o diretor de criação. No entanto, foi após a chegada do atual estilista que a praça ganhou mais atenção e peso no balanço das contas.

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Em 2016, a flagship ganhou um novo endereço. Três anos depois, o espaço já estava pequeno demais e rolou outra mudança, que também não foi suficiente. Em setembro, um segundo ponto foi inaugurado na mesma rua, a Rodeo Drive.

Parte do sucesso – uma boa parte – se deve ao trabalho com personalidades locais globalmente influentes. Exemplo melhor do que Kim Kardashian não há. Com o lançamento da linha de alta-costura, em 2021, o mercado do tapete vermelho pediu uma proximidade maior com Hollywood. No desfile do último fim de semana, a atriz Nicole Kidman foi anunciada como a nova embaixadora da casa. 

Ah, e os EUA são o mercado mais importante para o setor de luxo.

Como é a coleção de pre-fall 2024 da Balenciaga?

Nascido no início dos anos 1980, na Abecásia (hoje parte da Geórgia),  aqueles primeiros registros citados por Demna não são apenas cinematográficos. O que grudou na sua memória foram imagens de uma cultura pop e indústria do entretenimento cada vez mais dominante.

Na coleção, os looks são menos tapete vermelho e mais celebridades off-duty (de folga). Tipo as fotos de paparazzis com a pessoa saindo do café do momento com o latte ou chá da vez. Sabe os conjuntinhos de moletom ou plush à la Juicy Couture, bem anos 2000? Estão lá “demnizados”, com calcinhas aparecendo e botas tipo Ugg de cano e salto altos. O clique indiscreto da famosa de lingerie? Idem – a bota-meia, agora, é bota-meia-calça. 

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

A roupa de academia, com tênis agigantado, bolsa grande, tapete de yoga e garrafa d’água também marcam presença – LA e a indústria do wellness são o match perfeito. Rolou até uma parceria com a rede de mercado de produtos orgânicos Erewhon – as celebridades amam e pagam bem caro pelo o que compram lá. O suco preto (com pó de carvão ativado) oferecido aos convidados veio de lá. Assim como o design e a estampa das bolsas tipo sacola de papel (elas são de couro).

E aqui vale parêntesis: em meados de novembro, a Balenciaga lançou uma linha de esqui, snowboard e montanhismo. E está vendo horrores na China, nos EUA e na Coreia do Sul. Por que não investir em todo um segmento de activewear?

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Cardi B no desfile de pre-fall 2024 da Balenciaga. Foto: Getty Images

Para não dizer que o lado glamouroso da cidade foi ignorado, tem a parte final do desfile – com direito à rapper Cardi B em um casaco de pele falsa azul e aos vestidos de couro que imitam um lençol amarrado no corpo. 

No entanto, são os volumes, construções e silhuetas de blazers com ombros exagerados, longos colados ao corpo com uma espécie de capa e, em especial, os vestidos estruturados pretos e aquele último branco os detalhes mais facilmente associados a Cristóbal Balenciaga. E ao posicionamento anunciado até então.

Que posicionamento é esse?

Faz pouco mais de um ano que uma campanha polêmica quase cancelou a Balenciaga e custou os empregos do CEO e do diretor de criação, Cédric Charbit e Demna, respectivamente. Antes disso, dois desfiles – e uma bolsa de couro em formato de saco de lixo – foram interpretados como insensíveis por muita gente. 

Quando a marca retornou à semana de moda de Paris, em março de 2023, o discurso foi de que os excessos caça-cliques deram mais do que tinham que dar. “A moda se tornou uma espécie de entretenimento, mas muitas vezes essa parte ofusca sua essência”, escreveu o estilista.

A coleção de inverno 2023 foi marcada pela ausência dos elementos de streetwear e subversões característicos do designer. A alfaiataria ganhou destaque, a silhueta e os materiais de cada item se sobressaíram ante piadas, ironias ou memes.

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Foi igual na apresentação de alta-costura, em julho, e diferente no verão 2024, em outubro. Apesar da grandiosidade do último desfile em Paris, a proposta tinha mais a ver com os experimentos de construção sobre itens básicos do guarda-roupa do que com o discurso de que “para mim, não pode mais ser vista como um entretenimento”, nas palavras do diretor criativo.

Corta para dezembro, na capital da indústria da indústria do entretenimento, com roupas, cenário, convidados e narrativas que ninguém sabe diferenciar de crítica ou homenagem aos produtos feitos lá e distribuídos em passa ao redor do planeta. Moral da história? Não acredite em qualquer história. Ou procure outras versões dela.

A Balenciaga mudou de ideia?

É capaz. Quem nunca dançou conforme a música? Talvez essa ideia nunca tenha existido, foi puro gerenciamento de crise. Ou a ideia atual é uma versão modificada da anterior – ou vice-versa. Para não dar uma de Chacrinha e confundir em vez de explicar, o fato é que a pressão por resultados em cima do Cédric Charbit, o CEO, e do Demna está altíssima.

As vendas do grupo Kering, do qual a Balenciaga faz parte, encolheram 19% no terceiro trimestre de 2023. O mercado anda sofrido faz um tempo, porém os resultados negativos surpreenderam geral: analistas, investidores e executivos. 

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

A crise das campanhas tem um pouco a ver com isso. O natal e fim de 2022 foram péssimos para etiqueta, cenário que se estendeu pelos primeiros meses do ano. A mudança de posicionamento, menos focado nos consumidores aspiracionais (aqueles que gastam pontualmente com os acessórios hit do momento, edições limitadas ou drops) e mais nos super-ricos, também. 

Funciona assim: desce o tom na imagem, abaixa o volume da comunicação, reduz a disponibilidade, aumenta a qualidade, eleva o design, torna ainda mais especial quem tem acesso e cobra-se mais pelo produto. Tem um monte de marcas apostando nessa estratégia, embora leve um tempo para surtir efeito. E tempo é um luxo em falta na Kering, mas nem tanto na Balenciaga. 

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Look da coleção pre-fall 2024 da Balenciaga desfilada em Los Angeles.

Balenciaga, pre-fall 2024. Foto: Getty Images

Graças à linha de alta-costura, a casa pôde atender melhor um nicho de mercado até então negligenciado em favor do boom de consumo de clientes mais jovens. Em entrevista recente, Cédric Charbit fala que a couture (Demna não gosta do “haute”) ainda não dá lucro, mas apresenta resultados promissores para os planos de elevação de posicionamento da etiqueta.

De tal modo, há um tiquinho de espaço extra para atuação em outras categorias de produtos e nichos de mercado – desde que não seja arriscado, ousado nem polêmico demais, tipo um novo tênis, uma versão tote da bolsa Le Cagole, um relançamento da City Bag para o ano que vem e a introdução de um perfume também em 2024.

Em outras palavras, tem para todo mundo (que pode pagar). E em tempos bicudo, qualquer sinal de mais nas contas do fim do mês é muito bem-vindo.

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